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Observação equipada

o binóculo | o telescópio | características dos sistemas ópticos | star hoppingseta | tipos de telescópio | montagens e alinhamentoseta_dir | limpeza componentes ópticos | observação: expectativas | brilho superficialseta | observação: dicas | dicas por categoria de objecto | astrofotografia | disfunções ópticas | magnitudes (referência) | tabelas úteis | a astronomia amadora (nota final)


We had the sky up there,
all speckled with stars,
and we used to lay on our backs and look up at them
and discuss about whether they was made or only just happened...

(Mark Twain, The Adventures of Huckleberry Finn)

Rares sont les belles nuits calmes et l’Astronomie est une école de patience.
(Pierre Bourge & Jean Lacroix, À l'affut des étoiles (neuvième édition), Dunot, 1984, p.33)


A orientação relativa dos mapas, astronómicos vs. geográficos (Rey, H. A., The Stars - A New Way to See Them, Houghton Mifflin Company, 1997 (1952))


- Lista de Observação: a nossa lista, organizada alfabeticamente segundo a abreviatura das constelações, inclui comentários (.PDF, ~270KB). Procura elencar objectos diversificados e interessantes, observáveis por binóculos ou telescópios modestos, com um ou outro "desafio" mais difícil. Utilizar c/ um atlas de suporte ou com as nossas Cartas de busca, exportadas pelo programa GUIDE). Esta página inclui outras listagens, informações adicionais, breve apresentação dos catálogos mais comuns e bibliografia.

Há todo um Universo à nossa disposição, da vizinhança no Sistema Solar à observação do chamado céu profundo (enxames, nebulosas, galáxias) que nos permite o acesso a maravilhas longínquas. Até ao limiar do século XX, o enfoque na observação dos planetas era evidente. Entretanto, a exploração dos mundos mais próximos e a dilatação "cosmológica" do Universo conhecido alargará gradualmente os horizontes, que doravante assumem escalas antes "inimagináveis".

 O básico...

O olho humano
Componentes e funcionamento básico do olho humano. A córnea funciona como uma janela: tem forma de disco, é transparente, e deixa entrar a luz no olho. A íris, um anel colorido, envolve a pupila e funciona da mesma forma que uma abertura: controla a quantidade de luz que entra no olho. O cristalino
(lens crystallina) é uma lente, recolhe a luz que penetra na pupila, garantindo que na retina é formada uma imagem nítida. A retina actua como um catalisador: utiliza as células sensoriais para converter a luz recebida, que é posteriormente processada pelo cérebro. O interior do olho (entre o cristalino e a retina) é ocupado pelo corpo vítreo, transparente e constituído por 98% de água e 2% de hialuronato de sódio e fibras de colagénio. A fóvea (não representada na ilustração) é uma pequena área (<2mm) no centro da retina que assume tarefas essenciais pois está repleta de células sensoriais.(Ilustração de Hannah Bailey [labels editados]; in Tacher, M., Sky Gazing, Storey Publishing, 2020)


Existe a Luz! Não sabemos muito bem o que é mas conseguimos explicar a maior parte dos fenómenos que lhe estão associados. O que vemos como luz são partículas muito energéticas, sem massa: os fotões. Sabemos que a luz é "desviada" ou refractada quando atravessa um material transparente (como o vidro ou as lentes dos nossos equipamentos ópticos). A água tem um efeito quase semelhante enquanto no ar a refracção é muitíssimo menor. Os comprimentos de onda na faixa de radiação visível estão compreendidos entre 370 nm (nanómetros), violeta, e 750 nm, vermelho (Cecie Starr. Biology: Concepts and Applications [S.l.]: Thomson Brooks/Cole, 2005).

Prisma    Luz - comprimento onda
Entre o vermelho e o violeta: na célebre experiência, diferentes comprimentos de onda são desviados de maneira diferente quando atravessam um prisma de vidro (Ronan, C, (consult. ed.), Amateur Astronomy: a compreensive and practical survey, Mallard Press, 1989); à direita, comprimentos de onda da radiação luminosa (
Newcomb, S., Astronomy for Everybody, McLure, Philips & Co., 1904)


A Atmosfera é determinante pois condiciona e filtra o que podemos ver. Há,para o observador assíduo, dois conceitos fundamentais com esta intimamente relacionados: o chamado "seeing" (estabilidade/ medida da turbulência) e a transparência
(limpidez, o quão brilhantes se observam as estrelas).


Astronomia e Meteorologia: por vezes é impossível separar uma ciência da outra. A Atmosfera é constituída por diversas camadas, da Troposfera (camada mais baixa) à Exosfera (no limiar do Espaço, não identificada na ilustração), passando pela Estratosfera, Mesosfera e Termosfera (ilustração adaptada de Ahrens, C. D., Meteorology Today (9th Edition), Cengage Learning, 2008)

 

A Cor do Céu Diurno

O ar é transparente. Devido ao menor comprimento de onda, a luz azul (tal como a púrpura) é mais facilmente espalhada, em todas as direcções, pelas moléculas que constituem a nossa atmosfera (especialmente as de Nitrogénio, N2, formadas por 2 átomos). Estas moléculas quase não têm efeito na luz vermelha, que praticamente as atravessa. Por isso, em quase todas as áreas do céu somente podemos ver a luz azul assim disseminada. Na composição atmosférica (por volume, ar seco), os principais componente são: 78,08% Nitrogénio (N2), 20,95% Oxigénio (O2).

Durante o dia o céu é azul devido à chamada dispersão de Rayleigh: como a partícula onde a luz "embate" tem uma dimensão compatível com o seu comprimento de onda, parte da energia da luz é absorvida, fazendo as suas cargas vibrar e emitir de novo a radiação. Ora a componente azul da luz solar tem menores comprimentos de onda e, portanto, estes são os únicos compatíveis que absorvem essa luz e a rebatem, espalhando o azul na atmosfera. Já ao entardecer, como o Sol passa a iluminar a Terra com um ângulo mais oblíquo, a luz tem de atravessar a atmosfera por uma distância maior. Isso faz com que a fração de azul seja diluída de tal modo que já não conseguimos vê-la, abrindo espaço para vermos apenas os tons mais vermelhos que, por terem um comprimento de onda maior, se dispersam menos. A dispersão de Mie (ou de Lorenz-Mie-Debye) é independente do comprimento de onda, e é por isso que o céu claro aparece azul pálido ou branco em áreas urbanas muito poluídas. Durante a noite o fenómeno é ao contrário, mas equivalente, agora provocado pela luz artificial de baixo para cima e o resultado é o esplendor luminoso que será tanto maior quanto mais poluída for a cidade ou quanto mais nevoeiro ou humidade tiver o local iluminado.


A nossa atmosfera dissemina e reflecte prioritariamente a luz azul. Esquematização da difusão do azul a partir da luz branca recebida do Sol (Ronan, Colin A. (c. ed.), The Skywatcher's Handbook - Night and Day: What to look for in the Heavens Above, Corgi Books, 1985)

"Efeito óptico", Ratdolt 1485
"As estrelas [i.e. os corpos celestes] parecem maiores quando próximas do horizonte, devido a um efeito óptico". À direita, uma tentativa de explicação desta "ilusão" por comparação com observação de moeda (Sacrobosco, Sphaera Mundi, Veneza, edição de Erhard Ratdolt, 1485)


A refracção da luz é evidente quando esta percorre obliquamente a atmosfera (a velocidade da luz é um tudo nada mais lenta na atmosfera, somente 0.999 mas suficiente para causar este fenómeno). Devido à refracção (que desvia a luz), mais acentuada quando o Sol está próximo do horizonte, podemos na realidade ver o astro por alguns minutos antes do nascimento e após o ocaso. A duração da luz do dia é maior por esta razão. Quanto mais próximo do horizonte, maior a refracção. Portanto, enquando este efeito "eleva" o disco solar, a região mais baixa sofre o efeito de modo mais acentuado (é mais elevada do que a superior), determinando a aparência achatada que observamos.


Ilustração de James G. Irving in Zim, H. S. & Baker, R. H., Stars: A Guide to the Constellations, Sun, Moon, Planets and other features of the Heavens (A Golden Nature Guide), Simon and Schuster, 1951

Refracção - pôr-do-sol
Ao pôr-do-sol vemos, na realidade, uma sucessão de "imagens" criadas pela refracção atmosférica. Na ilustração vemos a imagem ovalada do Sol quando este, em corpo, já está sob a linha de horizonte, círculo a traço interrompido (Whitney's Star Finder, Alfred A. Knopf, 1989, p.53)


Dennis Rawlins (American Journal of Physics, Feb. 1979) referiu, como curiosidade, que é possível observar o pôr-do-sol mais do que uma vez no mesmo final de tarde. O "truque" é ficar deitado observando um horizonte desimpedido (e.g., na direcção do mar) e, quando o último ponto de luz do astro desaparece, elevarmo-nos e (preferencialmente) escalar uma pequena duna ou estrutura e observar novamente o ocaso. Uma altura de dois metros já permite observar o "segundo" ocaso mais de 10 segundos após o anterior.


OBSERVAÇÃO DO CÉU NOCTURNO

A observação nocturna está condicionada pelas variáveis atmosféricas. O astrónomo amador é sempre um "aprendiz de meteorologista", informado, atento às condições, antecipando-as na medida do possível.

Seeing e resolução
"Seeing" e Resolução (tomando como exemplo uma estrela dupla): a turbulência atmosférica determina mau "seeing" (à esquerda, a estrela dupla parece uma mancha única e difusa); em condições estáveis e tranquilas
(à direita), podemos resolver claramente ambas as componentes (The Edmund Sky Guide, Edmund Scientific Co., 2001 (1977)


- "Seeing" - estabilidade vs. turbulência. As diferenças na temperatura e na pressão geram movimentos verticais ou horizontais na atmosfera. A turbulência afecta a nitidez e definição da imagem, tendo menor influência no brilho e no contraste. Uma escala simples mas bastante subjectiva foi introduzida por E. M. Antoniadi (1870-1944). O "seeing" está relacionado com a rapidez das alterações de pressão. A atmosfera estável, menos turbulenta, com alterações vagarosas, proporciona melhor "seeing". Em más circunstâncias, a luz de uma estrela é "espalhada" (o chamado "disco de confusão" aumenta na proporção da turbulência). Esta é a causa da célebre "cintilação". Somente em situações extremas assistimos à cintilação dos planetas (pois os diâmetros angulares são maiores). Por seu lado, a transparência é ameaçada pelos agentes que, ao nível molecular ou das partículas, "espalham" a luz: gases, poeiras, fumos, humidade, etc. Tudo o que reduza o contraste, obrigando um objecto a ser mais brilhante para poder ser detectado é, no fundo, ruído.

- Transparência - qualidade óbvia, a quantidade de estrelas que podemos observar. No zénite (ZLM - zenital limiting magnitude) é maior do que nas regiões com pouca elevação, próximas do horizonte. É, em qualquer circunstância, importante estimar o limite de magnitude visível a olho nu (a estrela mais ténue: fts, "faintest star", em Inglês). O ideal é fazer uma estimativa para a região nas imediações do objecto a observar, permitindo previamente a nossa adaptação ocular à obscuridade (a utilização da visão indirecta ou desviada aceita-se desde que as estrelas em causa permaneçam visíveis continuamente, não intermitentemente, utilizando esse expediente). Outro método é o da contagem de estrelas numa área delimitada.

Em termos gerais, estas condições são mutuamente exclusivas: as noites transparentes e cintilantes, com brilho, são geralmente acompanhadas de mau "seeing"; as noites estáveis, nas quais a observação planetária é propícia, são habitualmente acompanhadas de alguma névoa (pois esse mesmo ar tranquilo, que proporciona o bom "seeing", também encoraja a formação de névoa a partir do calor que o solo irradia na atmosfera e a condensação do vapor de água, formando orvalho quando em contacto com superfícies frias).


Aproveitando a útil exposição de Rick Schaffer (Your Guide to the Sky (3rd Edition), Lowell House, 1999), antecipamos algumas dicas consensuais para a prática observacional (adiante mais desenvolvidas; trad. nossa):

- Observar mais tarde, permitindo a dissipação do calor absorvido durante o dia. A transparência melhora com o arrefecimento da noite pois o ar frio não acumula tanta humidade.
- Após a passagem de uma frente fria, a noite será transparente (mas com pior seeing, devido à turbulência criada pelo ar frio). Todavia, a última noite antes da passagem de uma frente fria costuma ser calma.
- A presença de alguma poluição (smog) significa ar "estagnado" (sem turbulência) mas, por isso mesmo, uma oportunidade para observação de detalhes planetários.
- Quanto mais elevado o alvo a observar, menos afectado estará pela atmosfera.
- Acautelar a fase lunar. A luz reflectida pela Lua "varre" as estrelas e os objectos mais ténues.
- Distanciar-se de fontes térmicas (emanação de calor e
consequente turbulência).
- Evitar observar nos vales. Aí geram-se camadas de ar com diferentes temperaturas que causam perturbações. Com o arrefecimento da temperatura, o ar frio tende a descer e acumular nestes sítios. É a chamada "camada de inversão" que justamente inverte a situação diurna, criando uma zona mais amena sobre a camada fria concentrada na depressão orográfica. Uma zona elevada com encostas arborizadas é mais vantajosa para observação.
- A iluminação artificial deve, obviamente, ser evitada.


O mais importante para o astrónomo amador é conhecer bem o céu à vista desarmada, utilizando o nosso magnífico campo de visão (cerca de 100 graus). Os olhos são o "instrumento" mais importante. Assim, conheceremos o "desenho" das constelações e asterismos observados em diferentes quadrantes ao longo dos meses, interiorizado através de assíduas observações num processo gradual de padronização. A memorização dá-se através do reconhecimento geométrico de triângulos, trapézios, paralelogramos e outras relações entre as estrelas mais conspícuas. E assim nos relacionamos com um céu reconfortante, repleto de "percursos" familiares.


Percurso diurno dos corpos celestes (adaptado de original em Muirden, J., Astronomy With a Small Telescope, Prentice-Hall, Inc., 1986)


É fundamental compreender o funcionamento da esfera celeste (uma ficção conveniente): saber situar os pontos cardeais no local de observação, perceber os arcos diurnos descritos pelos astros de Leste para Oeste, sempre paralelos ao Equador Celeste, conhecer sucintamente a morfologia da nossa galáxia e em que direcção se situam as constelações, etc. Os planetas e a Lua surgem sempre nas imediações da Eclíptica, a posição da Lua depende da sua fase (no plenilúnio nasce quando o Sol se põe; começa a crescer ao entardecer após sair da sua conjunção com o Sol na Lua Nova), etc.


Na direcção do plano da nossa Galáxia, a absorção das poeiras interestelares limita a nossa visibilidade a aproximadamente 10 000 aos-luz.  Olhando para fora deste plano, temos acesso a uma visão de milhões de anos-luz para o interior do Universo! Na Primavera, a órbita do nosso planeta coloca-nos, nas horas nocturnas, na direcção do "exterior", para fora da nossa Galáxia e nas vastas direcções das galáxias mais ou menos longínquas. Durante o Verão, a posição do nosso planeta na sua órbita em torno do Sol é de modo a que, nas mesmas horas nocturnas, ficamos voltados para o denso plano da Via Láctea (Cygnus, Aquila e Scutum) e também do seu próprio centro, na direcção das nuvens estelares de Sagittarius. No Outono, observamos de novo através de uma fina camada da Via Láctea as vastas direcções do espaço interestelar. No Inverno voltamos à contemplação da Via Láctea através do "Braço de Orion", arqueado obliquamente ao longo do céu através de Auriga, Gemini e Monoceros, com uma profusão de enxames e nebulosas. A maioria dos enxames abertos formam-se nos braços espiralados da Via Láctea. Podemos observá-los em maior quantidade quando olhamos "para fora", através dos braços da galáxia. Os enxames globulares tendem a situar-se na direcção do centro galáctico e podem, por isso, observar-se em maior número quando a órbita da Terra nos coloca nessa mesma direcção.


Posições relativas das constelações na estrutura da Galáxia, quando por nós observadas. Explica muito do que podemos ver, nomeadamente em termos da densidade e predominância do tipo de objectos observáveis. O núcleo da Galáxia situa-se na direcção de Sagittarius (Howard, N., The Telescope Handbook and Star Atlas, Thomas Y. Crowell, 1967, p.120)

"Espessura" da Via Láctea vs.
Fotografia obtida na direcção do plano da Via Láctea comparada com fotografia obtida na perpendicular a esse plano (Zim, Herbert, The Universe, William Morrow and Company, 1961, p.31)


Nas imagens seguintes, mapas relacionando algumas das constelações mais conspícuas de Inverno (e.g., Orionte) e de Verão (com o famoso "Triângulo" Vega-Altair-Deneb); fonte: Máximo Ferreira e Guilherme de Almeida: Introdução à Astronomia e às Observações Astronómicas (2ª Edição), Plátano Edições Técnicas, 1995, pp.154-5. Para sabermos quais as constelações observáveis é útil conhecer o Tempo Sideral (i.e., "das estrelas"), marcado pela passagem das linhas horárias de Ascensão Recta (A.R.) pelo Meridiano. O Tempo Sideral (T.S.), em determinado momento, equivale à A.R. de qualquer estrela que esteja no Meridiano do observador. Num determinado lugar e num determinado momento, equivale ao ângulo horário do equinócio vernal (o chamado Ponto Aries) nesse momento. Podemos utilizar uma tabela (.PDF, 630KB, proveniente do clássico Burnham's Celestial Handbook, vol.1) para saber quando transita qualquer objecto cuja Ascensão Recta conheçamos. Pode ser utilizada com um atlas de suporte. Conhecer o T.S. diz-nos que mapa utilizar e permite, caso utilizemos uma montagem equatorial com círculos graduados, encontrar objectos através das suas coordenadas equatoriais (A.R. e Declinação).

Padrões constelações


Big Dipper - Edmund Sky Guide
Uma "chave" para o céu nocturno (na direcção do pólo celestial boreal). Algumas referências conspícuas localizadas a partir do principal asterismo da Ursa Maior, no célebre The Edmund Sky Guide, Sam Brown, Terence Dickinson (Edmund Scientific Co., 2001 (1977))



Dia Sideral e Dia Solar

Um Dia Sideral (i.e. "estelar": intervalo entre duas culminações sucessivas de uma estrela no mesmo meridiano ou o tempo que determinada estrela demora a voltar ao meridiano do lugar) perfaz 23h 56m 04s.Traduz, rigorosamente, a rotação do nosso planeta sobre o seu próprio eixo. É menor do que o Dia Solar dos relógios comuns, que também tem em conta o percurso do planeta em torno do Sol e não somente a sua rotação axial (o Sol parece demorar mais 4 minutos do que as estrelas "fixas" para completar uma revolução). Ver o seguinte esquema, com as direcções paralelas para determinada estrela e os 4 minutos adicionais necessários para "calibrar" a posição relativamente ao Sol (Muirden, J., The Amateur's Astronomer Handbook, Harper & Row, Publishers, 1983). A reter: os objectos distantes como as estrelas ou os planetas não voltam à mesma posição no céu após um dia solar mas sim após um dia sideral.

- Um relógio sideral "ganha" cerca de 10 segundo por hora (3 minutos e 56 segundos por dia) em relação a um relógio comum. Em 6 meses 12 horas. O Dia Sideral é mais "importante" para o observador astronómico. Assim, as montagens astronómicas motorizadas (que suportam a utilização de muitos telescópios) estão preparadas para que o seu eixo polar (o que aponta para o pólo celeste) faça uma rotação em 23 horas e 56 minutos, período que demora uma rotação (aparente) da Esfera Celeste (Dia Sideral). Os 4 minutos de diferença para o Dia Solar Aparente (de 24 horas) respondem à translação do nosso planeta e determinam o gradual movimento cíclico através do qual as estrelas parecem chegar ao Meridiano 4 minutos mais cedo todos os dias. Por isso vamos observando diferentes estrelas à mesma hora, ao longo do ano.

Percurso do Sol em Leo
Uma maneira fácil de conhecer directamente o tempo sideral (que pode ser traduzido em 'tempo local' através de um gráfico) recorrendo à linha entre as estrelas Phecda (γ UMa) e Caph (β Cas), que passa praticamente pela Estrela Polar (no centro do esquema); Mills, H. Robert, Practical Astronomy: A User-friendly Handbook for Skywatchers, Albion Publishing, 1994, Fig. 1.13.1.


Um outro aspecto a ter em conta envolve o movimento aparente do Sol (que não é uniforme devido à excentricidade e variação na velocidade orbital do nosso planeta), bem como a inclinação da Eclíptica relaticamente ao Equador Celeste. Por vezes o Sol é mais "rápido" (cruzando o Meridiano mais cedo), outras "lento" e cruza-o mais tarde. Este "erro" é a chamada Equação do Tempo.

Relógio sideral (H. R. Mills)
Uma maneira fácil de conhecer directamente o tempo sideral (que pode ser traduzido em 'tempo local' através de um gráfico) recorrendo à linha entre as estrelas Phecda (UMa) e Caph (Cas), que passa praticamente pela Estrela Polar (centro); Mills, H. Robert, Practical Astronomy: A User-friendly Handbook for Skywatchers, Albion Publishing, 1994, Fig. 1.13.1.



Equipamento

A utilização de um binóculo ou de um telescópio magnifica obviamente a nossa capacidade de observação em muitas circunstâncias. Trata-se de instrumentos que produzem a imagem de um objecto distante graças às propriedade físicas dos raios luminosos ( luz que chega até nós pode ser refractada por um vidro ou reflectida pela superfície polida de um espelho). É o fenómeno de difração da luz que, "dobrando-a" ou "desviando-a" ligeiramente quando encontra uma obstáculo (como um equipamento óptico), nos permite utilizar estas tecnologias. A observação equipada começa somente no séc. XVII, com as primeiras observações de Galileu e alguns contemporâneos.


Comparação de magnificações tipicamente proporcionadas por um buscador ou por um binóculo (x7) e, por outro lado, por um telescópio (x35). O último proporciona uma imagem magnificada e invertida, permitindo detectar mais estrelas (e mais ténues), em função da sua abertura, i.e., diâmetro da objectiva ou do espelho primário, consoante o tipo de equipamento (Dunlop, S., Practical Astronomy, Firefly Books, 2004)


Convergência dos raios luminosos através de uma lente. Ilustra-se o eixo óptico, foco ("Foyer"), plano focal e a distância focal (Roy, Jean-René, L'Astronomie et son Histoire, Presses de L'Université du Québec; MASSON, 1982)


Binóculo

- Alvos Binoculares "Obrigatórios" (a nossa lista, versão abreviada da lista "geral" acima disponibilizada; .PDF, 878KB)

- The Astronomical League Binocular Deep Sky List (DSBC) (uma lista muito bem estruturada, algumas dezenas de alvos; .PDF, 43KB)

- The Chatfield Binocular Challenge List (pertinente e adequada selecção para começar a observar, .PDF, 160KB)

- Binocular Stargazing Catalog (objectos para observação binocular, catálogo compilado por Tom Price-Nicholson, S&T; .PDF, 480KB)

Os binóculos serão sempre, pela facilidade de utilização e amplitude do campo de visão, um auxiliar útil, qualquer que seja o telescópio à disposição. Demais, há coisas que simplesmente se observam melhor com binóculos. Mas a observação binocular não é apenas uma porta de entrada ou uma ajuda indispensável para outros tipos de observação equipada. Significa, acima de tudo, portabilidade, facilidade de utilização e conforto. Permite uma interessante percepção "imersiva", sugerida pela utilização de ambos os olhos (sabendo que os objectos astronómicos estão demasiado longe para o efeito estéreo). Há, portanto, uma falsa estereopsia (visão estéreo) e embora não possamos ver os objectos longíquos em 3D, assim "parece" acontecer. A vantagem binocular decorrente da utilização dos dois olhos (um melhor rácio sinal/ruído) está avaliada em cerca de 1.4x. Significa que na observação de um objecto ténue, um binóculo vai tão longe quanto uma óptica simples com 1.4x a sua  abertura (Tonkin, S., Discover the Night Sky through Binoculars, BinocularSky Publishing, 2018). O relaxamento consequente contribui, na opinião de muitos observadores, para uma melhor percepção e detalhe comparativamente ao que se consegue na observação "ciclópica", monocular.

A imagem direita (não invertida) e o campo de visão (Field of View) amplo contribuem para uma acessível localização dos "alvos". Estes podem ser enxames estelares, nebulosas e galáxias (dependendo da magnitude e brilho superficial). Também muitas estrelas variáveis ou binárias, regiões densas da Via Láctea, o relevo lunar, um vislumbre das fases de Vénus, os quatro principais satélites de Júpiter, eventuais cometas brilhantes, satélites artificiais, etc.

Devem estar sempre apoiados, por exemplo num tripé estável ou num monopé, para minimizar vibração. Esta última solução é muito eficiente, podendo ser utilizada uma humilde escova limpa-vidros telescópica (pois é segura e extensível). Atenção: a utilização da fita/corda de segurança do binóculo é sempre aconselhada para acautelar quedas acidentais que inutilizariam o delicado equipamento.

A qualidade óptica, densidade e revestimento (idealmente objectivas separadas por camada de ar, tubos c/ nitrogénio e selados para impermeabilização, lentes "multi-coated", prismas BaritleichKron, i.e., "BaK4" segundo a empresa Schott AG e não outras "interpretações") são obviamente importantes. É necessário cautela com as especificações, atendendo à complexidade, diversidade ou mesmo "inexistência" de padronização. O equipamento deve ser de marca prestigiada e, se possível, testado antes da aquisição (sendo que hoje há muito material badge-engineered: os mesmos equipamentos vendidos sob diferentes marcas). A qualidade do revestimento das objectivas pode ser verificada apontando uma luz intensa. Quando a luz é reflectida e não permite ver o interior do binóculo, o tratamento foi escasso ou inexistente (significa má qualidade). Reflexo esverdeado e a impressão de que o vidro desaparece denotam qualidade.

Por seu lado, a notação referencial indicada da Abertura e Ampliação é inequívoca. Assim, se o equipamento indicar 10x50 significa que amplia 10x e a sua abertura (diâmetro da objectiva, determinante da quantidade de luz captada) é de 50 mm.

Quanto menor a magnificação, maior será o campo de visão e a luminosidade da imagem. Há, contudo, um limite! A divisão da magnificação pelo diâmetro das objectivas dá-nos o tamanho do pequeno círculo de luz que emerge das oculares ("pupila de saída", v. infra). Se este superar o tamanho da pupila do olho humano (5-7mm), a luz em excesso será desperdiçada.

Há duas categorias de binóculos "prismáticos", em função do mecanismo de reflexão de luz interna: Porro e Tecto (Roof, utilizando prisma tipo Schmidt-Pechan). Os tradicionais binóculos “Porro” (designação radica no nome do inventor italiano Ignazio Porro) têm a vantagem de um design que proporciona um bom desempenho óptico e uma maior distância entre as objectivas. Os binóculos Roof são mais compactos e apresentam as objectivas e oculares alinhadas ao longo de um eixo de luz. Quaisquer binóculos com as objetivas maiores do que 60mm são do tipo Porro, porque a distância interpupilar não pode exceder a dos olhos humanos.

Focagem: acautelar a distância interpupilar e focar separadamente, com um olho aberto de cada vez. Começar com o esquerdo no focalizador central ou geral, em cima. Depois passar para o olho direito e focar rodando a ocular direita (que habitualmente possui "diopter").


Equipamento 15x70 fixado num tripé fotográfico


Sugestão de monopé de suporte em madeira com plataforma revestida com material macio para pousar equipamento, a opção mais simples e uma das mais funcionais (Nourse, Alan E., The Backyard Astronomer, Franklin Watts, Inc., 1973

Binoculos - tipologia
O caminho percorrido pela luz nos tipos Tecto e Porro, respectivamente (E. Leitz, Inc.; in Paul, Dr. Henry E., and Stone, Greg (rev.), Binoculars and All Purpose Telescopes, AMPHOTO, 1980 (1964)

Testagem (rápida) da qualidade de um binóculo

- Antes de mais, verificar a nitidez da imagem e o paralelismo: qualquer evidência de visão duplicada determina a inutilidade do equipamento.
- Verificar se existe cor falsa, aberrante, nas extremidades dos objectos observados ou efeito de vinheta (brilho reduzido na orla do campo de visão).
- Focar um objecto e movê-lo para uma das extremidades do campo de visão. Se for necessário refocá-lo, estamos perante um problema de curvatura do campo.
- Verificar a linearidade do campo focando um alvo padronizado (por exemplo uma parede de tijolos), verificando também se a magnificação se mantém uniforme ao longo do padrão.
- Verificar, segurando o binóculo a pequena distância e olhando para as oculares, se a pupila de saída é circular (como deverá acontecer) ou se está a ser parcialmente vedada pelos prismas, nesse caso surgindo quase "quadrada".


Com o binóculo um pouco afastado, verificar o par de imagens provenientes das oculares. O desequilíbrio representado nesta ilustração é inaceitável (Dunlop, S., and Tirion, W., Night Sky (How to Identify), Barnes & Noble Books, 2004)

N.B.: a pátina anti-reflectora é absolutamente fundamental devido à existência de tantas superfícies no complicado percurso interno da luz.


Anotações acerca do desempenho binocular (magnitudes alcançáveis)

No que diz respeito à luz captada não se pode, de modo simplista, comparar binóculos com telescópios. O total da luz captada é proporcional à(s) área(s) da(s) objectiva(s). Por um lado, os binóculos não encaminham a luz de ambos os "tubos" para o mesmo olho (não se pode somar). por outro lado um telescópio nunca é (ou não é somente) utilizado com amplificações 'fixas' de 7x, 10x ou 15x. A amplificação do telescópio permite ver outras coisas. Numa comparação simples, um telescópio de 100mm de abertura capta o quádruplo da luz do que um binóculo 10x50 (ou o dobro de ambas as objectivas binoculares combinadas), v. infra a explicação das qualidades ópticas dos equipamentos.

Em todo o caso, numa estimativa das magnitudes alcançáveis em céus com um limite de magnitude de 5.5 (olho nu), com boa visão, podemos considerar os seguintes valores binoculares aproximados (magnitudes limite para objectos estelares, os objectos  do céu profundo envolvem variáveis mais complexas):

7x50 - 9.6
8x42 - 9.6
10x42 - 9.8
10x50 - 10.3
12x50 - 10.5
10x70 - 10.5
15x70 - 10.8
20x80 - 11.2
25x100 - 11.8

 

Telescópio 


- Comprando o primeiro telescópio (guia completo; fonte: CCVAlg; .PDF, 740KB, arquivado do original)

- Buyers Guide ( Deepsky Corp.; em Inglês, .PDF, 125KB)

- Hobby Killers (o que escolher e o que evitar na aquisição (em Inglês), artigo de Jerry Oltion, S&T, Dec.2019; em Inglês, .PDF, 3.69MB)

- Factores a equacionar na escolha de um telescópio (adapt./trad. de um guia de T. Dickinson, incluído no excelente NightWatch, edição de 1998; .PDF, 635KB)


Embuste
"525x POWER”. Publicidade a ampliações absurdas (relativamente à abertura) denuncia o embuste.


Um telescópio revela-nos um Universo maior e muito mais luminoso. Consiste num tubo óptico apoiado num suporte mecânico (a
montagem). Tem como principal característica a capacidade de recolher a luz que permite mostrar detalhes inacessíveis ao poder de resolução do olho humano (considerado habitualmente no limite dos 4 minutos de arco, ainda menos segundo outras fontes). O telescópio é habitualmente descrito como um colector de luz. Mas não menos fundamental é que essa luz possa ser focada com precisão num único plano.

A utilização exige uma adaptação. Na vida quotidiana, o olho humano é acima de tudo utilizado como instrumento de "varredura". Possui um campo amplo e consegue captar imensa informação a cada momento, que a nossa percepção interpreta. Todavia, não é originalmente vocacionado para se concentrar totalmente num pequeno disco planetário ou numa mancha nebulosa durante um intervalo extenso. A observação astronómica exige, por isso, o treino do sistema olho-cérebro nestas tarefas "incomuns".

O telescópio, na sua forma mais simples, consiste em duas lentes convexas, uma de grande e outra de pequena distância focal. A primeira gera, no chamado plano focal, uma imagem do objecto que estiver à sua frente. A segunda (a ocular) amplia a imagem formada pela primeira. Os tipos básicos de telescópio são o refractor, cuja objectiva é uma lente ou sistema de lentes e o reflector, baseado num espelho primário.

N.B.: Algumas curiosas gravuras medievais mostram astrónomos ou astrólogos a observar o céu através de tubos. O próprio Aristóteles se terá referido às vantagens desse método, aumentando o contraste evitando a luz envolvente. Os tubos em questão obviamente não possuiam lentes. O século XVI dará ênfase à teoria da perspectiva,observação per perspicilla, a ciência da observação directa, a reflexão e a refracção. E os vidros de perspectiva serão utilizados por astrónomos, artistas, militares, etc.


Telescópio reflector com montagem dobsoniana (v. tipologia infra); filtros, algumas oculares, lentes Barlow e produtos de limpeza óptica (f. do A.)

 
Características dos sistemas ópticos

O espectro visível é a "estreita janela", a porção do espectro eletromagnético que é visível para o olho humano.


O espectro electromagnético (clicar na imagem para ampliar; Wikipedia Commons)

Arco-Íris
O arco-íris é um espectro formado pela luz que atravessa gotículas de água que funcionam como prismas. A luz do Sol é refractada. Quando observamos um arco, o seu centro situa-se sempre em oposição ao Sol. Num arco simples, as cores vão do vermelho exterior ao violeta na extremidade interior (
Ilustração de James G. Irving in Zim, H. S. & Baker, R. H., Op. cit., 1951). Era considerado no passado, como se pode ler por exemplo, em Discours sur l'histoire universelle (1681) de Jacques de Bossuet (1627-1704), “um dos principais ornamentos do trono de Deus”. Segundo o Padre António Vieira. “O rústico, porque é ignorante, vê muita variedade de cores no que ele chama Arco da Velha; mas o filósofo, porque é sábio e conhece que até a luz engana (quando se dobra) vê que ali não há cores, senão enganos corados e ilusões da vista”. (Sermão do da Segunda Dominga da Quaresma, pregado na Capela Real de Lisboa, 1651)


A Luz e a formação da Imagem

A Luz viaja de modo ondulatório e não linear. Por isso, num sistema óptico, a luz emanada de uma estrela nunca pode ser focada como um ponto, antes sendo espalhada por difracção (i.e., desviada) e gerando um pequeno disco artificial, brilhante e difuso, rodeado por ténues anéis de difracção (i.e., uma luminosidade máxima central, rodeada por esses anéis concêntricos), Numa estrela brilhante observada com elevada amplificação, esse efeito central torna-se evidente. Chama-se disco espúrio ou Disco de Airy (em honra de Sir George Airy, 1801-1892). Em causa está à natureza ondulatória da luz quando esta atravessa uma abertura circular e difracta, produzindo um padrão de interferência aternando regiões escuras e iluminadas. As ondas interferem mutuamente, cancelando-se ou reforçando-se em pontos definidos, formando assim intervalos escuros e anéis brilhantes concêntricos  (que justamente descrevem as interferências verificadas): o chamado "padrão de difração". O diâmetro deste padrão está relacionado com o comprimento de onda da fonte luminosa (λ) e com a dimensão da abertura do equipamento. O disco é, por definição, o menor no qual a focagem é possível. Num telescópio refractor, perto de 84% da luz recebida concentra-se no disco, a restante formando os ténues anéis circundantes. Em telescópios com obstrução central (e.g., suporte da diagonal ou espelho plano dos reflectores) verifica-se que há mais luz desviada para os anéis periféricos (vide Ridpath, I., (Ed.), Norton's 2000: Star Atlas and Reference Handbook, Longman Scientific & Technical, 1989, p-167).

Disco de Airy
Simulação do padrão de difracção. A imagem desfocada de uma estrela revela o disco de Airy e anéis de interferência. Num sistema óptico de qualidade são circulares. A ilustração exagera o brilho dos anéis por uma questão de clareza (
fonte: astronomics.com)


Cada "ponto" da imagem de um qualquer objecto observado nunca é na realidade um ponto, antes um disco (que aumenta na proporção directa da amplificação utilizada). Quanto maior a abertura do telescópio, menor será esse disco.
Analisar este registo (tamanho e distribuição) é importante pois determina o detalhe que será evidente com a utilização do equipamento óptico em causa. Fenómeno determinante para aferir a resolução de um equipamento. Entretanto estudado por Lord Rayleigh e, separadamente, por William Dawes, que se preocuparam com a determinação do limite para a resolução (que só pode ser ultrapassado aumentando a abertura do equipamento). Em teoria, o  poder resolvente, chamado Limite de Dawes, calcula-se  dividindo 4,5 pelo diâmetro (em polegadas) da abertura do telescópio (em segundos de arco calcula-se pela fórmula R = 115/D, onde D é a Abertura).

Abertura e resolução
Efeito do aumento sucessivo da luz admitida num sistema óptico. Mais luz significa menor imagem espúria e melhor resolução, por exemplo de estrelas duplas (crédito: Mount Wilson Observatory; in: Skilling, W, T, & Richardson, R. S., Astronomy (Revised Edition), Henry Holt and Company, Inc., 1951)


O resultado será a distância entre os dois objectos mais próximos que se conseguem distinguir (dependendo na prática das condições atmosféricas e da qualidade e alinhamento da óptica). A olho nu conseguimos, em boas condições de observação, distinguir duas estrelas separadas cerca de 180" (o equivalente a 3 minutos de arco). NB: 1º (grau) equivale a 60' (minutos) ou 3600" (segundos), sendo 1/90 da distância angular entre o horizonte e o zénite.

Limites de Rayleigh e Dawes
Acima: uma estrela dupla "separada" segundo os limites de Rayleigh (A) e Dawes (B). Para Rayleigh, o limite de resolução no processo de separação acontece quando o primeiro "intervalo" escuro do disco espúrio se situa no centro da imagem. Para Dawes basta a presença de imagem alongada que permita perceber as duas estrelas (Porcellino, M. R., Through the Telescope: a Guide for the Amateur Astronomer, TAB Books, 1989)


Variáveis fundamentais

Um telescópio possui três características fundamentais: a luz que consegue captar, a capacidade separadora e a magnificação (i.e,, ampliação angular). O primeira é de longe a mais importante. A magnificação é a menos importante. A turbulência atmosférica (que determina o chamado "seeing") limita, habitualmente, a utilização da magnificação para algo entre 1/10 e 1/2 do máximo teórico (2x por milímetro de abertura). A Abertura determina a quantidade de luz que o equipamente recebe, o detalhe que consegue resolver e as ampliações mínima e máxima que suporta. A resolução depende em exclusivo da abertura.

A luz recebida é propocional ao quadrado da área da Abertura. Explicitemos a sua importância: se for utilizada a mesma ampliação, um objecto terá o mesmo tamanho se observado em dois telescópios (e.g., um de 50mm e outro de 100mm). A diferença está na capacidade de recolha de luz. O instrumento de 100mm recolhe quatro vezes mais luz (ver parágrafo seguinte). Por isso, o objecto surgirá outras tantas vezes mais luminoso, e isso faz toda a diferença quando falamos dos objectos do céu profundo relativamente ténues. As imagens devem ser brilhantes antes de submetidas à magnificação da ocular. Como excepções, somente os luminares e alguns planetas intrinsecamente brilhantes. Nesses casos a abertura ainda é importante mas é menos decisiva.


A atmosfera é determinante. A coluna de ar em frente do telescópio faz parte do sistema óptico (Steven R. Coe). Explicação do "seeing", estabilidade/ grau de interferência da turbulência atmosférica (Mayall, R. N., Mayall, M. & Wickoff, J., The Sky Observer's Guide, Golden Press, 1985 (1959); ilustração de John Polgreen)


- A ABERTURA (D) determina a quantidade de luz que o telescópio recebe, geralmente traduzida em milímetros. É o tamanho efectivo do espelho ou da lente, a porção que transmite luz para a ocular. Quanto maior a área, maior a quantidade de luz captada e maior o poder separador (capacidade de isolar e tornar visíveis detalhes no olho humano 'ideal' é de 1 minuto de arco). É a qualidade mais importante. A capacidade de captação de luz é directamente proporcional à área da abertura (diâmetro da objectiva nos refractores, do espelho nos reflectores). Para comparar o potencial com o do olho humano (adaptado à obscuridade), divide-se o diâmetro do tubo por 7mm (convencionalmente considerado o máximo diâmetro pupilar) e eleva-se ao quadrado. Como exemplo, uma abertura de 100mm incrementa 204x a captação de luz do olho humano. Apesar de devolverem o mesmo diâmetro aparente, a mesma ampliação permite visualizar mais detalhes num instrumento com abertura maior (em relação a um equipamento menor). Quando acima se referiu que um telescópio de abertura 100mm capta quatro vezes mais luz do que um de 50mm, respaldámo-nos no mesmo procedimento (100/50=2; o quadrado de 2 é 4, o equipameto de 100mm recolhe 4 vezes mais luz).

Em condições propícias, a magnitude limite (teórica) das estrelas observáveis é traduzida pela seguinte fórmula: m = 1.8 + 5 log D (onde D é o diâmetro da objectiva em milímetros)

ATENÇÃO: há refractores de baixa qualidade nos quais o diâmetro do vidro não coincide com o da área efectiva "desimpedida" para entrada da luz, i.e., têm um stop. Para evitar este e outros dissabores ainda piores, adquirir sempre equipamentos/acessórios de marcas reputadas.


Luz captada por um espelho, por uma lente binocular e pelo olho humano. A diferença está nas áreas. (R. N. Mayall et al., Op. cit., 1985, p.15)


- O PODER SEPARADOR (P), em segundos de arco, calcula-se através da fórmula: P = 120 / D

- A distância que a luz precisa percorrer entre a abertura e o ponto de focagem é a DISTÂNCIA FOCAL (f), fornecida nas especificações do equipamento. (A tradição nos primeiros séculos da observação equipada era descrever um telescópio prioritariamente pela sua distância focal e não pela sua abertura). É a distância (actual ou virtual) entre o centro óptico do espelho primário (reflector) ou objectiva (refractor) e o sítio  onde os raios de luz convergem formando uma imagem focada. Esta distância determina a amplitude do campo de visão e o tamanho da imagem primária (a imagem "primordial" que vai seguidamente ser ampliada pela ocular). De facto, é possível facilmente conhecer o seu tamanho linear no plano focal (onde essa imagem invertida se forma) através da fórmula 0.01745 a f (0.017450 é uma constante, o nº de radianos num grau; a é o tamanho angular do objecto em graus; f é obviamente a distância focal; NB: na prática, considera-se o objecto astronómico no "infinito"). [Exemplificação do cálculo do tamanho da imagem primária: a dimensão angular da Lua é de 0.5 graus. Num equipamento com distância focal 600mm, o tamanho da sua imagem primária será: 0.01745 x 0.5 x 600 = 5.23mm]

distância focal - exemplo
Experiência com duas lentes comuns com o mesmo diâmetro mas diferentes distâncias focais. Se esta distância for maior, a imagem é mais ampla mas menos brilhante (
Scagell, R., Stargazing with a Telescope (3rd edition), Firefly Books, 2009)


- A RAZÃO FOCAL (f/D), que pode ser considerada a "abertura relativa", é o quociente da distância focal da objectiva pelo seu diâmetro (distância focal do equipamento dividida pela Abertura). Análoga ao "f-stop" da Fotografia, é indicada como “f/n”. Na prática, o rácio abertura/distância focal dá-nos a "velocidade" da óptica do telescópio (os adjectivos "rápido" ou "lento" que aqui encontramos são obviamente emprestados da Fotografia). Quanto mais baixo o valor de "n", menor a magnificação, mais amplo o campo de visão, mais luminosa a imagem com determinada ocular ou câmara (imagens mais brilhantes com um "tempo de exposição" menor). Aparelhos "rápidos", f/4 ou f/5, estão indicados para observação com campo visual vasto e pouco magnificado ou fotografia do céu profundo. Inversamente, com rácios "lentos", entre f/11 e f/15, o telescópio precisa de mais tempo para obter uma imagem brilhante, situação vocacionada para observação magnificada da Lua, planetas, estrelas binárias ou fotografia com zoom poderoso. Valores intermédios (de f/6 a f/10) constituem um compromisso. Resumindo: um f/n baixo privilegia a luminosidade, um f/n alto privilegia a resolução e o contraste. Os "f" mais baixos (telescópios chamados "rápidos") significam magnificação baixa e campo de visão amplo. O inverso nos chamados "lentos", com "f" mais elevados (e.g., f/10 - magnificação elevada, campo de visão pequeno). Uma razão focal elevada produz sempre uma maior ampliação com determinada ocular específica.

A maior parte dos reflectores são f/5, 6 ou 8, i.e. a distância focal é 5, 6 ou 8 vezes o diâmetro do espelho. Os refractores possuem habitualmente f/n mais elevado, e.g., f/12.


- Quanto à MAGNIFICAÇÃO ou AMPLIFICAÇÃO (w) da combinação equipamento/ocular, utiliza-se a seguinte fórmula
: w = f / f' (f é a distância focal da objectiva; f' é a distância focal da ocular). A magnficação é o aumento do tamanho aparente da imagem quando comparado com o tamanho aparente do objecto, medida em termos do diâmeto relativo.


O campo de visão diminui com a ampliação (Muirden, J., Astronomy With a Small Telescope, Prentice-Hall, Inc., 1986)


Ampliar é fácil, basta utilizar uma ocular com distância focal muito pequena. Mas será útil? Não. Tudo depende da abertura. Sem luz suficiente, a imagem terá péssima qualidade, sem nitidez. Se utilizarmos um telescópio com ampliações cada vez maiores, verificamos que o campo visual é cada vez mais reduzido, as imagens perdem nitidez, contraste e luminosidade. Há um limite prático para a ampliação suportada por um telescópio, seja qual for a sua qualidade óptica. Este limite, num equipamento com qualidade e em condições atmosféricas favoráveis é de cerca de 2,4 vezes por cada milímetro de abertura (e.g. D=60mm; 2,4 x 60 = 144x).



Tabela com utilização sugerida para as amplificações de um telescópio. Legenda: D=Abertura, A=Amplificação. Adaptado do Quadro 5.8 do excelente manual Telescópios de Guilherme de Almeida (Plátano Edições Técnicas, 2004)

 
Como se infere, a magnificação ou ampliação não é, em rigor, uma característica do telescópio mas sim da ocular com este utilizada. O tubo óptico capta a luz e, em função das suas características, vai produzir uma imagem primária com determinado tamanho. Isto não pode ser modificado. A ocular vai, seguidamente, magnificar essa imagem como se de um microscópio se tratasse. A ocular é basicamente constituída por duas lentes (“field lens” e “eye lens”). Na prática podem ter seis ou mais componentes. O diâmetro do barrilete determina a medida do interface da ocular (encaixes normalizados que é necessário acautelar, e.g. 1.25’’ (=31,75mm) ou 2'' (=50,8mm)). O chamado field stop é um diafragma circular, geralmente, um anel aplicado depois da lente de campo que delimita a imagem aparente. Tem a função de contrariar aberrações ópticas, que nas extremidades do campo se tornam evidentes. O diâmetro do field-stop é importante para determinar exactamente qual a distância focal.

Tipos de lente    Lentes
Morfologia das lentes (Alarsa, F., et al., Fundamentos de Astronomia, Papirus, 1982). À direita: as lentes convexas e espessas no seu centro são convergentes e magnificam; as finas, côncavas e divergentes diminuem o tamanho da imagem (Skilling, W, T, & Richardson, R. S., Astronomy (Revised Edition), Henry Holt and Company, Inc., 1951)


No que respeita às oculares, as tipologias mais utilizadas são as Kellner, Huygens, Ortoscópica e, principalmente, Plossl (v. publicidade relevante da Tele Vue Optics, 1981).

Uma ocular funciona possibilitando que o olho se aproxime da imagem formada pela lente ou espelho principal. Esta proximidade permite que a vejamos maior. Quanto mais pequena a distância focal da ocular, maior a magnificação proporcionada. Os equipamentos com razões focais (f/n) menores são menos tolerantes às eventuais imperfeições das oculares, devido ao menor tamanho da imagem primária que o sistema óptico consegue formar.

Distâncias focais - oculares
Oculares com crescentes distâncias focais. Quanto menor a distância focal da ocular (ilustração no topo), mais próximo o olho se deve colocar da imagem, maior o ângulo em presença e, consequentemente, a magnificação obtida (Skilling, W. T., & Richardson, Op. cit., 1951)


As oculares possuem distâncias focais (distância entre a ocular e o ponto onde convergem os raios luminosos) habitualmente compreendidas entre 4 e 32 milímetros. A razão (divisão) entre as distâncias focais do tubo e da ocular (habitualmente em milímetros) determina a ampliação final (e.g., um telescópio de 600mm com uma ocular de 20mm determina uma ampliação de 30x; mas se a distância focal da ocular for de 10mm, a ampliação será de 60x). A magnificação de uma lente é, deste modo, inversamente proporcional à sua distância focal.

(N.B.: Para calcular a ocular de maior distância focal (equivalendo à menor ampliação) que é possível utilizar, multiplica-se a razão focal do telescópio por 7mm (diâmetro mais comum da pupila adaptada à obscuridade). Como exemplo, um telescópio f/6 suporta, no limite, uma ocular com distância focal de 42mm.)


Morfologia de ocular genérica, com explicação do campo de visão aparente (fonte: Pátio da Astronomia); à direita, outro esquema ilustrativo do posicionamento do plano focal de uma ocular; Roy, Jean-René, Op. cit., 1982)


Uma importante característica de uma ocular é o diâmetro da pupila de saída que proporciona. Determina-se dividindo a distância focal da ocular pelo rácio focal (f) do telescópio. Por exemplo, uma ocular de 10mm colocada num equipamento f/5 terá uma pupila de saída de 2mm (10/5 = 2). Diferentes tipos de observação podem beneficiar com a utilização de diferentes pupilas de saída (v. quadro seguinte). Outro método é dividir a abertura pela ampliação. Magnificações (ampliações) menores garantem maior diâmetro de pupila de saída. O ideal é conhecer o diâmetro da nossa própria pupila, de modo a não "desperdiçar" luz com pupilas de saída de maior diâmetro.

Observação do céu profundo: um f/n pequeno permite alcançar a pupila de saída conveniente (~7mm) com oculares com comprimento focal mediano (o mesmo resultado num f/11 exigiria uma ocular de grande comprimento focal, i.e. com muito vidro e mais dispendiosa). A combinação de uma abertura generosa com rácios focais moderados (f/4 ou f/5) permite um contraste adequado entre o objecto extenso e o fundo.

Tamanho da pupila de saída (mm) Tipos de Objecto a observar
5 - 7 Galáxias, Nebulosas
3 - 4 Observação geral, Enxames, Neb. Planetárias
2 Lua e Planetas, Estrelas Duplas
1 Máx. para Lua e Planetas, Duplas muito próximas
0,5 Duplas mais "apertadas" nas melhores noites
(fonte: Jeffrey L. Hunt, Cosmic Connections, Inc.)


Convém evitar a tentação de "coleccionar" oculares. Habitualmente utiliza-se somente 2 ou 3 unidades. Destas, quase sempre a que proporciona menor ampliação e campo mais amplo. 3 oculares bem escolhidas e uma barlow (ver infra) são suficientes.

Há uma enorme variedade de preços. As oculares básicas hoje utilizadas são constituídas por três elementos (e.g., as Kellner). Numa evolução em termos de qualidade e preço temos as Ortoscópicas e as Plossl, constituídas por quatro elementos. No topo encontram-se oculares de campo amplo constituídas por 5 a 8 elementos (e.g., as tradicionais Erfle de 5 elementos) ou as mais recentes e complexas Wide Field e Ultra Wide Angle. A amplitude do campo de visão é uma qualidade muito valorizada: ao contrário das antigas Erfle, os modelos mais recentes garantem imagens mais nítidas e excelente correcção na periferia da generosa "janela" que proporcionam. As do tipo Lanthanum (do nome de um raro elemento usado para alterar o índice refractivo) são valorizadas pelo generoso "alívio de olho" que proporcionam. Estas vantagens têm um preço e um peso! As oculares referidas são caras e bastante pesadas.

Actualmente, o tipo de ocular com qualidade e preço razoável mais comum é a Plossl, versátil e adaptável aos diversos tipos de observação, proporcionando imagens nítidas. Os mencionados desenhos inovadores de campo mais amplo (as séries Panoptic, Nagler e Ethos da Televue) são obviamente excelentes.

As oculares comuns possuem um campo aparente de cerca de 50 graus (Atenção: o Campo Aparente não é o observado através do telescópio, ver infra a distinção entre Aparente e Real) As chamadas wide-field possuem campo aparente em torno dos 65 graus. As super e ultra em torno dos 80 graus, ou até mais. Permitem, por exemplo, observar um enxame globular com uma amplificação superior à que seria exequível com uma ocular comum, sendo que a magnificação escurece o fundo e permite ver mais estrelas. Acima de tudo proporcionam maior conforto visual e espectacularidade.

Em qualquer circunstância, optar por boas marcas (e.g., Vixen, Meade, Orion, Pentax, Tele Vue) e, se possível, pelas melhores séries. (As oculares básicas, antigas, são muitas vezes publicitadas como “modified” ou “super achromat”. Se possível devem ser preteridas por desenhos mais recentes)


Uma ocular wide-field e uma ocular comum (com a mesma distância focal) proporcionam a mesma ampliação mas a primeira disponibiliza um campo visual mais amplo (ilustração da observação da Grande Nebulosa do Orionte; fonte: Advanced Skywatching: The Backyard Astronomer's Guide to Starhopping and Exploring the Universe (The Nature Company Guides), 1997)

Utiliza-se frequentemente uma lente côncava negativa (i.e., na qual as coisas aparecem mais pequenas) que, na prática "aumenta" virtualmente a distância focal do telescópio. Colocada em série, antes da ocular, a lente "Barlow" (designação que utiliza o nome do seu inventor, Peter Barlow, 1776-1862) vai, na prática, multiplicar (2x, 3x, etc.) a ampliação proporcionada pela ocular. Também ajuda a evitar o desconforto da utilização de lentes com distância focal muito pequena. A outra vantagem é económica pois duplica as opções de ampliação, em conjunto com as unidade disponíveis. Por outro lado, a utilização de uma "barlow" torna a focagem mais complexa e pode deteriorar a qualidade da imagem. (O inverso é o redutor focal, acessório que ao reduzir a distância focal da objectiva, diminui a ampliação e, consequentemente, alarga o campo visual. O factor modificador é aqui inferior à unidade, geralmente 0.63x)


Ocular isolada (em cima) e com utilização de lente Barlow (em baixo). Esta última tem como efeito o aumento da distância focal (R. N. Mayall et al., Op. cit., 1985, p.138)

 
- Chama-se Pupila de saída à imagem da objectiva (i.e. objectiva, espelho ou sistema misto) produzida pela ocular. É a luz que emerge da ocular. Uma secção cruzada desta luz, no ponto mais estrito, é conhecida (nos telescópios) como "disco de Ramsden". O chamado "EYE RELIEF" (traduzido como Alívio de Olho ou Relevo Ocular) define-se como o afastamento da pupila de saída (distância entre a última superfície de uma ocular e o chamado "eyepoint" onde a pupila de saída se forma). É a distância entre a superfície exterior da ocular e o sítio onde a nossa pupila deve estar para ver a imagem produzida pelo equipamento. Calcula-se facilmente, como vimos, dividindo a abertura do telescópio pela magnificação. De maneira geral, quanto menor for a distância focal da ocular (e maior o aumento conseguido) menor tende a ser a distância necessária entre a lente da ocular e o olho do observador para aceder confortavelmente ao campo visual completo. Ou seja, o observador precisa aproximar-se mais da ocular durante a observação. Como exemplo, utilizar uma ocular de 25mm é muito mais confortável do que utilizar uma ocular de 5mm num mesmo telescópio. Se quando a pessoa sofre de miopia basta a focagem do telescópio, no astigmatismo é necessário observar com óculos, logo um maior “eye relief” é mandatório.

Pupila de saída
Pupila de saída (Introdução à Astronomia e às Observações Astronómicas, Op. cit., 1995, p.222) e o "Disco de Ramsden", área fundamental da pupila de saída onde o olho deve ser colocado para conseguir a melhor observação (Howard, N., Op. cit., 1967, p.11)

 
- Conhecer o CAMPO VISUAL OBSERVÁVEL (em graus angulares) é essencial no tradicional star hopping, "saltando de estrela em estrela". Outro método útil (utilizando montagens equatoriais) é o deslocamento em A.R. ou Declinação a partir de estrela(s) cujas coordenadas conhecemos.

O Campo Visual pode ser obtido através da fórmula: O / A (O: Campo da Ocular ou "Aparente"; A: Ampliação). (O Campo da Ocular seria o tamanho da circunferência da imagem observada pelo nosso olho se espreitássemos pela ocular fora do telescópio, por exemplo na direcção de uma parede) As oculares possuem um campo que pode ir de 30 a 110 graus. O valor, fornecido pelos fabricantes, nem sempre está disponível ou grafado na peça (nessas circunstâncias, o valor de 50º permite uma aproximação razoável, havendo métodos alternativos). O Campo Visual Real ou Observável depende em concreto da utilização da ocular num telescópio, obedecendo à fórmula disponibilizada. (NB: o método consiste numa aproximação que assume que a ocular possui uma superfície plana, quando é efectivamente esférica).

Outro método para conhecer aproximadamente o diâmetro do campo de visão é escolher uma estrela próxima do Equador Celeste (a menos de 10º deste grande círculo) e cronometrar a deriva, o tempo que demora a atravessar o nosso campo de visão (em segundos). Seguidamente, multiplicar por 15 para obter a medida angular em segundos de arco. O tempo da "travessia" em segundos dividido por 240 dará o resultado em graus.


Oculares: tipologia e dimensão aproximada do campo aparente intrínseco (não o campo real que depende da utilização concreta), em graus (Coe, Steven R., Deep-Sky Observing: The Astronomical Tourist, Springer-Verlag London, 2000, p.39; cor invert.)


O focalizador, onde se aloja a ocular e se faz a focagem, é outro componente essencial. Acima, esquema do tipo "pinhão e cremalheira" (rack & pinion). Uma evolução mais precisa é o chamado tipo Crayford, que prescinde da cremalheira. À direita, um focalizador helicoidal (que enrosca e desenrosca), bastante simples.
 

O mais importante...

A qualidade da imagem (não a ampliação) é o mais importante. O propósito de um telescópio é, acima de tudo, recolher ou captar luz. Reside aí a importância da Abertura.

O notável divulgador Thomas William Webb (1807–85), aconselhava, no seu célebre tratado inicialmente publicado em 1859: "Do not over-press magnifying power. Schroter [notável astrónomo do séc. XVIII] long ago warned observers against this natural practice, which is likely to lead beginners into mistakes. A certain proportion of light to size in the image is essential to distinctness; and though by using a deeper eye-piece we can readily enlarge the size, we cannot increase the light so long as the aperture is unchange." (Webb, T. W., Celestial Objects for Common Telescopes, Cambridge Library Collection, Cambridge University Press, 2010, p.12). Acrescentou: "For the moon and planets, the power should be high enough (if the weather will bear it) to take off the glare, low enough to preserve sufficient brightness and sharpness." (ibid, p.13).

Magnificação
A magnificação excessiva não devolve novos detalhes e deteriora a qualidade da imagem (Linda Shore, David Prosper & Vivian White -
Astronomical Society of the Pacific, The Total Skywatcher's Manual..., Weldon Owen, 2015)


A magnificação a utilizar depende do equipamento, das condições atmosféricas e de visibilidade, bem como das características do objecto a observar. É necessário encontrar um compromisso em função destas variáveis. Ampliada, a imagem observada é menos luminosa, pois a obtenção de uma imagem maior foi conseguida com a mesma quantidade de luz, dado que a abertura (D) do aparelho é a mesma. Em circunstâncias normais, ampliações acima de 200x significam, invariavelmente, imagens difusas.
Alguns objectos toleram facilmente (e.g., Saturno, M57), outros não (e.g., M33, M101, quase todas as nebulosas). Por regra, uma ampliação generosa é adequada à observação da Lua, dos planetas e das estrelas duplas mas desvantajosa na observação de objectos do céu profundo aparentemente grandes e pouco brilhantes.

Equipamentos com características diferentes adequam-se a diferentes tipos de observação. Em causa a dinâmica entre campo de visão, amplificação e razão focal, Como refere Michael K. Gainer (Real Astronomy with Small Telescopes, Springer-Verlag Limited, 2007), a melhor combinação de campo de visão e amplificação depende do objecto observado. Enquanto enxames abertos, amplos e brilhantes (e.g., o duplo enxame em Perseus) são mais interessantes quando observados com campo mais vasto e baixa amplificação num equipamento f/5, os enxames globulares e as nebulosas planetárias beneficiam de amplificações acima de 100x e rácios superiores (e.g., f/11). O contraste entre um objecto e o fundo do céu envolvente é substancialmente menor num f/5 do que num f/11 utilizando a mesma amplificação. Todavia, um equipamento com menor razão focal é mais adequado para visualizar regiões da Via Láctea e enxames extensos, bem como para os fotografar.


Star Hopping

É o método de "navegação" tradicional, "saltando de estrela em estrela". Trata-se de seguir um caminho e encontrar um objecto a partir de estrelas de referência, relações geométricas e "mini-constelações" (padrões). conhecendo a escala. Podemos assim encontrar objectos adjacentes ou próximos a partir de outros que estejam no campo visual. Como Wolfgang Steinicke e Richard Jakiel resumem, esta localização 'analógica' dos alvos abre a porta para um "personal sky" no qual o nosso cérebro vai, com a rotina, memorizando percursos, amiudadamente dispensando a utilização de qualquer mapa (Galaxies and How to Observe Them, Springer-Verlag London Limited, 2007). No que respeita à orientação e ângulos de posição, urge conhecer as direcções cardeais fundamentais do nosso campo de visão na ocular. Pode praticar-se o "método de deriva" (sabendo que numa observação não automatizada os objectos se movem sempre para Oeste). Os tamanhos e distâncias podem estimar-se a partir da dimensão do campo visual ou da separação de duas estrelas visíveis (que pode ser medida ou confirmada posteriormente num atlas). Os referidos autores recomendam (com exemplos) uma abordagem faseada com recurso a mapas com escalas diferentes: grande escala (e.g., Sky Atlas 2000.0) para o buscador, média escala (e.g., Uranometria) para a ocular com menor amplificação e, por fim, carta de busca impressa (e.g., GUIDE) ou fotografia DSS (e.g., RealSky) para a abordagem final com ocular mais poderosa. Finalmente, no que respeita a estimativa das magnitudes observadas (métodos comparativos), salienta-se a dificuldade e incorrecção da comparação entre fontes luminosas punctiformes (e.g., estrelas) e extensas (e.g., galáxias).


Conhecer o campo de visão, nomeadamente o do buscador,  é fundamental para conseguir "saltar" entre as estrelas e encontrar os alvos, bem como para estimar a dimensão dos aobjectos observados. Neste caso o alvo é o interessante enxame aberto M35, em Gemini (Newton, J., & Teece, P., Op. cit., 1995)

 
Telescópios - tipologia

Há duas categorias básicas. O telescópio de Galileu ou Refractor (a chamada 'luneta', que traduz o nosso conceito intuitivo de telescópio) utiliza, justamente, a capacidade de refracção da luz (O termo "refracção" refere-se ao modo como a luz é desviada quando passa de um mediumtransparente como o ar para um com densidade diferente, como o vidro da objectiva). O sistema óptico faz convergir os raios luminosos captados pela área da objectiva numa pequena lente (ou conjunto de lentes) a que chamamos ocular. A sensibilidade ou capacidade de captação de luz depende da área da objectiva, a ampliação é determinada pela ocular. Não há interrupções no caminho da luz, a imagem tende a ser mais estável pois não há turbulência ou correntes de ar internas. A observação torna-se difícil a partir dos 60º acima do horizonte, sem recurso a prisma zenital (que reflecte a 90º, sendo colocado entre a ocular e o tubo da ocular). A aberração da cor é um perigo potencial nesta categoria (o lugar da focagem da luz recebida não coincide, é diversa em função das cores do espectro). Um refractor acromático (significa literalmente "sem cor") procura corrigir este problema, fazendo a "recombinação" das cores separadas. Os melhores (e mais caros) refractores actuais possuem objectivas extraordinariamente bem corrigidas, incorporando camada de fluoreto de magnésio (redutora da reflexão) ou, mais comummente, uma combinação de três elementos (sistemas apocromáticos, abrev. APO), combinando distâncias focais relativamente pequenas e notável óptica, sem dúvida proporcionando as melhores e mais nítidas imagens planetárias (na comparação da abertura). Numa categoria alternativa, o desenho do Reflector recorre à utilização de espelhos (ver esquema 'b'). As oculares continuam a ser refractoras, obviamente. Os ângulos de reflexão da luz não estão sujeitos ao desvio cromático. A manutenção exigida (alinhamento frequente) e a possibilidade de ocorrência de aberração de coma (distorção das fontes punctiformes que estejam fora do eixo óptico, provocando um efeito de gota, semelhante a uma comacometária) constituem desvantagens. Temos ainda o problema da obstrução central pelo espelho secundário e os picos de difracção provocados pela sua "aranha" (estrutura de suporte). A mais-valia é o relativamente modesto custo da abertura, sabendo como esta é importantíssima na observação, mormente a dos chamados objectos do céu profundo. É banal encontrar amadores equipados com autênticos "light buckets", com espelhos acima de 10" (~25cm) de diâmetro.

Telescópios - tipologia
Funcionamento esquemático dos telescópios: (a) refractor (b) reflector
newtoniano (c) catadióptrico


O espelho parabólico produz os melhores resultados ao alcance de um reflector (Traister, R. J., & Harris, E., Astronomy and Telescopes: A Begginer´s Handbook, TAB Books, Inc., 1983)




Refractores

- No telescópio refractor, a objectiva capta e focaliza a luz para formar uma imagem. Essa imagem é vista com uma segunda lente, a ocular, que faz com que a imagem pareça maior. Lentes grandes são dispendiosas e tendem a causar distorções de imagem. As objectivas apocromáticas e semi-apocromáticas são constituídas por, pelo menos, três lentes conjugadas, o que aperfeiçoa a qualidade óptica. Nos refractores, a imagem é geralmente mais estável e sofre poucos defeitos de deformação relativamente aos reflectores. A necessidade de manutenção é mínima. A desvantagem é a potencial aberração cromática e o custo, para a mesma abertura. Um refractor de qualidade deverá possuir, pelo menos, uma lente acromática (etim.,"sem cor") de duas camadas (doublet) e idealmente tripla. Num refractor, as lentes não devem estar demasiado "apertadas", mantendo margem para dilatações térmicas sem causar pressão e distorções.

Reflectores

- Os reflectores são imunes à aberração cromática, a luz não atravessa vidro como nos refractores, Aqui, incide num espelho (idealmente) parabolóide localizado no fundo do tubo, que a envia à ocular, passando por um segundo pequeno espelho habitualmente plano. A luz não atravessa vidro pelo que o material do espelho principal não precisa ser perfeito. Exige-se, todavia, enorme precisão na curvatura e polimento da sua superfície. Apesar da possibilidade de difracção por obstrução, redução na quantidade de luz captada (devido ao espelho diagonal, plano) e ao facto de a metalização do espelho primário não reflectir a totalidade da luz (aborvendo 5-10%), permitem compensar com generosas aberturas, sendo os mais utilizados. (A "obstrução" é o quociente do diâmetro do suporte do espelho plano pelo diametro do espelho principal). As aberrações ópticas frequentemente encontradas nos reflectores são a esférica e o efeito de coma (ver infra), devido à eventual falta de qualidade na fabricação do espelho primário. Caso se tenha acesso à certificação da qualidade do espelho (precisão da superfície), deve preferir um que possua um valor Lambda (expressão do desvios em termos de comprimentos de onda relativamente a uma reflexão perfeita) acima de 10.


Tipos mais difundidos:

- o Newtoniano, inventado por Isaac Newton em 1668 (vide A. Rupert Hall and A. D. C. Simpson, An Account of the Royal Society's Newton Telescope, Notes R. Soc. Lond. 50(1). I-II (1996) consiste num tubo aberto com a ocular na parte superior. Utiliza um espelho primário e um espelho plano (diagonal) que desvia os raios luminosos (que iriam convergir no foco primário) para o chamado "foco newtoniano", gerando a "imagem primária" disponível para a ocular ampliar. O chamado telescópio "dobsoniano" (esquema), com desenho simples e portátil, utilizando montagem altazimutal muito estável e reduzida à sua mais simples expressão (popularizada pelo astrónomo amador John Lowry Dobson nos anos 60), é uma variante do newtoniano;

- o Catadióptrico é uma espécie de "híbrido". Um tubo fechado com uma obstrução central na parte superior e a ocular na inferior. Utilizam uma lente correctora à frente do espelho primário côncavo. São compactos mas podem ter distâncias focais apreciáveis, devido ao percurso da luz nos sucessivos reflexos que o seu design proporciona (v. esquema). Todavia, existe o mito de que produzem uma imagem menos luminosa para a mesma abertura, devido às obstruções. Aqui se incluem os Schmidt-Cassegrain, Schmidt-Newtoniano, Maksutov-Cassegrain e os Maksutov-Newton. Os Maksutov têm, por norma, distâncias focais muito longas (e.g., f/15), determinando campo de visão relativamente exíguo (comparado com os f/6.3 ou f/10 dos Schmidt-Cassegrain ou os f/4 ou f/6 comuns nos reflectores), sendo portanto dirigidos à observação lunar ou planetária de grande ampliação.

Uma variante habitualmente desaconselhada é o design conhecido como "Bird-Jones". Utiliza espelho esférico (em vez de parabólico). As aberrações esféricas são (supostamente) corrigidas usando uma lente corretora de subabertura que é montada na frente do espelho plano ou dentro do tubo.

 
Telescópios - Comparação

(Tabela incluída na edição de 1998 de NightWatch - A Practical Guide to Viewing the Universe, de Terence Dickinson, Firefly Books; trad. nossa)

Tipo Variantes Abertura - dimensões habitualmente utilizadas * Especificações/Desempenho Utilização Privilegiada
Refractor Acromático 2.4" a 4" Robustos e fiáveis, geralmente isentos de manutenção. Tradicionalmente adoptados como “primeiro telescópio” pelos amadores. Bastante portáteis quando a abertura é menor do que 3". Necessário acautelar montagem, por vezes inadequada, e os tripés de fraca qualidade nos modelos mais baratos. Excelente para a observação da Lua, planetas, enxames de estrelas, estrelas duplas e scanning (de modo geral). Desvantajoso na observação de nebulosas, enxames ténues e galáxias, devido à abertura limitada. Uma boa aquisição para a observação urbana ou suburbana na qual os objectos mais ténues já são, de qualquer modo, inacessíveis.
Refractor Apocromático 3" a 7" Indiscutivelmente o melhor sistema óptico disponível, isento de aberrações e obstrucções devido ao desenho das suas lentes (Apocromático - iisento de aberrações cromáticas). Imagens soberbas. Equip. fácil de transportar se abertura inferior a 4”. Preço muito elevado. Performance incomparável na observação lunar e planetária, com qualquer abertura disponível. Imagens ultra-nítidas e boa penetração no céu profundo. Preferido pelos astrofotógrafos, é somente limitado pela abertura (na comparação com os reflectores newtonianos).
Reflector Newtoniano c/ Montagem Equatorial 4" a 12" Se bem concebido, permite excelente valor e desempenho, especialmente na abertura e 6". Exige mais manutenção (e.g., colimação frequente) do que outros tipos. Torna-se “desajeitado” e não é facilmente transportável com aberturas superiores a 8”. Bom desempenho em todos os tipos de observação, particularmente quando longe de céus poluídos pela iluminação artificial.
Reflector Newtoniano c/ montagem tipo Dobson superior a 4" Montagem leve e simplificada num formato relativamente compacto. Preço comparativamente acessível (facilitando a aquisição de maiores aberturas).  Muito versátil, transportável nos modelos com aberturas mais modestas. A abertura de 6" é um bom compromisso, recomendada. Os maiores modelos (aberturas superiores a 10") estão vocacionados para a observação do céu profundo (nebulosas, enxames e galáxias). Os modelos menores têm geralmente um desempenho satisfatório em qualquer tipo de observação. A montagem simplificada significa que a utilização do equipamento é exclusivamente e obrigatoriamente manual.
Cadadióptrico Schmidt-Cassegrain 5" a 16" Geralmente disponibiliza um bom desempenho óptico. O tubo compacto resulta em estabilidade mecânica e facilidade de utilização. É modestamente mais caro do que os newtonianos com montagem equatorial. Equipamento muito competente e completo, um chamado “all-around”. Vasta gama de acessórios para todo o tipo de utilizações.
Cadadióptrico Maksutov-Cassegrain 3.5" a 7" Conhecidos pelo excelente desempenho e desenho compacto, todavia nunca dominaram o panorama amador. Adequa-se a qualquer tipo de observação amadora excepto a que visualiza um campo alargado (wide field) com baixa ampliação. Os modelos mais pequenos são extremamente compactos e portáteis, adequados para quem exige mobilidade.

* Medidas de abertura são muitas vezes traduzidas em polegadas. 1" = 2.54cm

 


Alguns tipos de telescópio: refractor, reflector newtoniano (montagem equatorial), reflector newtoniano (montagem dobsoniana) e Schmidt-Cassegrain


- Factores a equacionar na escolha de um telescópio (igualmente adaptado do excelente guia de Terence Dickinson; .PDF, 635KB)

 
Tipos de observação e razão focal. Que especificações utilizar?

O observador planetário vai olhar para imagens brilhantes e confinadas, independentemente do diâmetro dos alvos. O observador de estrelas duplas ou variáveis observará imagens punctiformes, concentradas. Mas a observação do chamado "céu profundo" (enxames, nebulosas e galáxias) é diferente. Os objectos são geralmente ténues, aglomerados estelares, gases e poeiras espalhadas por áreas por vezes extensas e heterogéneas. O seu brilho pode ser centenas ou até milhares de vezes mais ténue do que o dos planetas (o brilho de uma imagem é a quantidade de energia luminosa concentrada numa unidade de supefície da imagem). A solução para a observação destes objectos passa por conseguir a imagem mais clara e brilhante que é possível. Isto significa enveredar pela utilização de razões focais pequenas ou "curtas" (equipamentos f/4 ou f/5). A abertura é o parâmetro seguinte a merecer atenção. Os telescópios reflectores são escolha óbvia pela facilidade técnica em agilizar generosas aberturas.

Já no caso dos planetas existe vantagem na utilização de valores elevados ou "longos" (f/12 a f/15), determinando campos de visão pequenos e escuros propiciadores de elevado contraste na observação dos detalhes de superfície e atmosféricos. Os refractores têm a vantagem de um caminho luminoso tão desobstruído quanto possível (directo, sem qualquer espelho diagonal) e a desvantagem da modesta abertura (cujo aumento se torna dispendioso e até tecnicamente inexequível a partir de determinada dimensão). Uma maneira criativa de, em teoria, optimizar e aguçar a nitidez da imagem de um reflector (e.g., para observação lunar e planetária) pode passar por utilizar uma máscara de abertura que vai reduzir a abertura mas aumentar a razão focal (f/D) do equipamento (abertura mais pequena para o mesmo comprimento de tubo) e o contraste que este consegue devolver. Também remove eventuais efeitos ópticos da "aranha" (suportes) do espelho plano. Mas o expediente é controverso e poucos observadores consideram vantajoso ou desejável reduzir a abertura. Pode, supostamente, ser viável quando o "seeing" é desfavorável (e somente nessas condições). (Os refractores também podem ser alterados c/ máscaras de abertura, neste caso concêntricas)


Máscara de abertura para um reflector, c/ cerca de 1/3 da abertura. Descentrada, coloca-se na abertura do tubo (Porcellino, M. R., Op. cit., 1989)

 
Teste da Qualidade Óptica de um Telescópio

A. Localizar uma estrela brilhante, não demasiado elevada (entre 45 e 60 graus). Utilizando a ocular de menor ampliação, enquadrar essa estrela no centro do campo de visão. Trocar por uma ocular mediana e focar. A imagem deve ser nítida, pequena e muito brilhante, sem franjas coloridadas ou emanação de luminosidade radial.

B. Desfocar delicadamente e apenas ligeiramente, fazendo entrar a ocular alguns milímetros a partir da posição ideal de focagem. Surge então um disco pequeno que deverá ter limites relativamente definidos e brilho homogéneo. De seguida, voltar ao ponto de focagem e fazer sair a ocular no sentido inverso, a mesma distância, O disco que aparece deve ser similar ao anterior. Repare-se que, num refractor, os limbos destes discos de "desfocagem" denotam alguma coloração (avermelhada ou púrpura no primeiro, esverdeada no segundo). Cancelam-se mutuamente quando a imagem volta à focagem, somente ficando um ténue halo de cor azul-violeta. (Se queremos saber como é que se vê uma imagem estelar perfeita, utilizamos dois pedaços de cartão e fazemos um pequeno orifício de alfinete em cada um deles. Seguramos um com o braço estendido e espreitamos pelo outro junto do nosso olho, na direcção de uma lâmpada. Veremos então os chamados "discos de Airy" e ténues anéis concêntricos. É o que se observa num telescópio de primeira classe).

C. Verificar a presença de astigmatismo observando cuidadosamente a forma dos supracitados discos expandidos. Devem ser perfeitamente circulares e nunca elípticos.

Segundo M. R. Porcellino (Through the Telescope: a Guide for the Amateur Astronomer, TAB Books, 1989), o teste óptico pode ser feito com a Estrela Polar (porque esta não se "mexe"). Quando deslocamos a ocular para "dentro" ou para "fora" do ponto de focagem, a imagem ligeiramente expandida deve ser semelhante em ambas as situações. A imagem resultante da desfocagem "para dentro" deve estar rodeada de anéis de difracção; "para fora" deverá surgir um ponto negro centrado (devido à sombra do espelho plano). Atente-se que os chamados "anéis de difracção" são visíveis nos refractores (existe uma complexa escala gizada por Pickering (1858-1938) para avaliar a qualidade óptica ponderando este efeito). Nos reflectores testa-se a nitidez punctiforme da estrela observada.

A verificação da qualidade e, em particular, da presença de aberração cromática nos refractores, pode ser facilmente conseguida observando a Lua (nomeadamente o limbo brilhante) ou Vénus. Um halo azul-violeta ténue é aceitável, verde ou de qualquer outra cor não é. O procedimento deve ser feito com mais do que uma ocular para despistar disfunções de uma peça particular (vide Ridpath, I., (ed.), Norton's 2000.0: Star Atlas and Reference Handbook, Longman Scientific & Technical, 1989, p.71).


Colimação de um Reflector

Um dos problemas mais comuns nos telescópios reflectores é que, eventualmente, os espelhos ficam desalinhados. Colimação é o nome dado ao processo de alinhamento. Para que o telescópio forneça boas imagens, os espelhos devem estar muito bem alinhados. Um teste simples será apontar o telescópio a uma estrela brilhante e desfocar propositadamente. Os anéis da imagem desfocada devem ser perfeitamente circulares, ou o equipamento não estará colimado. Algumas ferramentas podem facilitar a manutenção: tampa de colimação, ocular do tipo "Cheshire", laser de colimação. O manual do equipamento inclui, habitualmente, instruções acerca dos procedimentos a adoptar, quais os parafusos de alinhamento e respectivos interfaces.

Na ilustração precedente: diagnóstico (a partir do que se observa através da abertura de focalização do equipamento). Vê-se o espelho plano ou diagonal (centrado nas imagens 1 e 2) com a respectiva base (à sua esquerda, cinzento intermédio) e reflexo dos 4 suportes ("aranha"), o reflexo dos três suportes periféricos do espelho primário (a negro, distanciados 120º entre si) e o pequeno círculo (castanho ténue na ilustração) que marca o seu centro: 1. Espelhos perfeitamente alinhados; 2. Espelho primário desalinhado; 3. Ambos os espelhos desalinhados (fonte: andysshotglass.com)

 
A Montagem

A montagem/suporte é, como é habitual dizer-se, "metade do equipamento". Determina a estabilidade e precisão dos movimentos. Deve ser firme, estável e permitir movimentos suaves, bem como facilidade de posicionamento óptico em qualquer ponto da esfera celeste. Se actualmente se verifica que as ópticas mais acessíveis produzidas no Extremo-Oriente têm uma qualidade que não compromete, não se pode dizer o mesmo dos suportes e montagens equatoriais, demasiado frágeis e instáveis. Em termos de versatilidade e poupança, a escolha mais avisada (para um reflector) será a de uma montagem altazimutal, dobsoniana, garantia de solidez e utilização fácil e intuitiva.

Há dois tipos de montagem: a Altazimutal, permitindo movimentação cima-baixo e esquerda-direita, caracterizada por uma utilização fácil e óbvia. Não está todavia em consonância como o movimento aparente da esfera celeste (não é, em rigor, "astronómica", pois os seus movimentos não estão coordenados com os arcos diurnos dos corpos celestes). A Equatorial segue o movimento diurno aparente adequadamente, permitindo, através de escalas graduadas nos eixos, localizar objectos através das suas coordenadas celestes (Ascensão Recta e Declinação). Círculos de ajuste graduados permitiem a utilização directa dessas coordenadas. Possibilitam, portanto, localizar um objecto utilizando a diferença (em A.R e Declinação), a partir de uma estrela de referência centrada na ocular (o chamado "método diferencial"). Também é possível utilizar o Tempo Sideral ou o Ângulo Horário (para Este ou Oeste) do objecto a centrar na objectiva.
 

Montagem Altazimutal Montagem Equatorial

Numa montagem altazimutal, o eixo principal permite movimentação no sentido do azimute, que é o ângulo horizontal, partindo do Norte no sentido do Leste, Sul, Oeste e chegando novamente ao Norte. Para fazer este movimento este eixo é montado na vertical, perfeitamente a prumo, e a origem deve estar posicionada rigorosamente no Norte Verdadeiro, enquanto o eixo secundário permite movimentos no sentido da altura, verticalmente entre o horizonte e o zénite.




Crédito: GEA/UFSC

 

Há dois tipos básicos: a chamada "alemã" (com contrapeso) e a tipo garfo, bifurcada. Essencialmente, as montagens equatoriais são constituídas por um sistema de dois eixos (o de Ascensão Recta ou "Polar" e o de Declinação), perpendiculares, sendo um deles colocado rigorosamente em paralelo com o eixo da Terra (tendo, consequentemente, como referência a latitude do observatório) e o segundo executando movimentos paralelos ao Equador Celeste (mimetizando assim o movimento da Esfera Celeste aparente). Se rodarmos este eixo no sentido contrário ao do movimento de rotação da Terra, com uma velocidade de 1 rotação por dia (aproximadamente 15º por hora), é possível manter um determinado astro imóvel no campo de visão de um telescópio.


Rudimentos de uma montagem equatorial ou paraláctica (fonte: Portal do Astrónomo). Na prática, as montagens equatoriais mais comuns são as de tipo Garfo e a Alemã (GEM - German Equatorial Mount)

Eixos e movimentos de uma Montagem Equatorial

Montagem Equatorial
Ilustração do funcionamento básico da montagem equatorial (Gigli, A., Observemos o Universo, Editorial Caminho, 1981)


Montagem equatorial com os eixos (polar e de declinação) e respectivos discos graduados analógicos (Newton, J., & Teece, P., The Guide to Amateur Astronomy (Second Edition), Cambridge University Press, 1995). Por vezes, os círculos incluem uma Escala de Vernier (v. infra) para ajustamento fino entre duas graduações


A montagem equatorial possui, como vimos, dois eixos ortogonais. Um desses eixos é chamado de eixo de Ascensão Recta ou Polar, sendo posicionado de forma paralela ao eixo de rotação da Terra, traduzindo a latitude do local de observação O outro é o eixo de Declinação (onde se prende o contrapeso do equipamento), colocado perpendicularmente ao Eixo Polar. A partir do momento em que o sistema está alinhado para as nossas circunstâncias específicas (latitude geográfica e orientação cardeal) basta girar os botões rotativos para rastrear o objecto visado.

A montagem permite 4 movimentos (azimute, latitude, ascensão recta e declinação). Nas imagens seguintes temos:

1 - controlo de Azimute (ângulo horizontal: N, E, S. O)
2 - controlo do eixo de Latitude (movimento em altura do Horizonte ao Zénite)
3 - eixo da Ascensão Recta (medida em horas, minutos e segundos), representado a vemelho
4 - eixo da Declinação (do Equador Celeste ao Pólo Norte Celeste, no nosso Hemisfério), representado a verde

N.B.: Na primeira imagem vemos dois parafusos de ajustamento, um para o Azimute, outro para a Latitude. Na segunda imagem vemos os dois  "travões" (um para cada eixo) e os botões rotativos 'flexíveis' para controlo fino de cada um dos eixos (movimentos de Ascensão Recta e de Declinação).

    Eixos e movimentos montagem equatorial   
Crédito: Jean Victor, V., Guide de l'Astronome Débutant (2e édition), Éditions Eyrolles, 2009

Alinhamento Polar

Nas montagens equatoriais, o alinhamento polar é fundamental para sincronizar o telescópio com o movimento diurno da Esfera Celeste e deve ser muito preciso no caso da prática da astrofotografia. As boas montagens integram um tubo de alinhamento polar, com marcações que auxiliam um alinhamento eficaz do eixo polar.  (O procedimento é logicamente dirigido ao pólo do hemisfério geográfico onde é efectuado) No nosso hemisfério, a chamada "Estrela Polar" está próxima mas não coincidente (também descreve pequeno círculo no intervalo de um dia sideral).

Há diversos tipos de retículo, com diferentes abordagens. Alguns dos mais utilizados (exemplo típico na fig. 1) imitam um mostrador de relógio (exigindo-se, à priori, as configurações Data/Hora/Zona Horária (Timezone)  - acautelando eventual diferencial na longitude do observatório relativamente ao centro deta última "Zona"). Outros possuem uma simples escala graduada que assinala a distância da estrela ao Pólo em minutos de arco. Um modelo muito comum define a posição de Polaris em relação a constelações adjacentes (mimetizando o céu real e desenhando estrelas da Ursa Menor e Cassiopeia, ver fig. 3), sem a necessidade da preocupação com data, hora ou até nivelamento da montagem. O posicionamento relativo define a rotação do retículo e encontra a posição do Pólo. É uma abordagem "geométrica": centra-se Polaris, observam-se (no céu) as estrelas em redor e ajusta-se em função do ângulo relativo de Polaris com essas referências próximas (e.g., Kochab, na Ursa Menor).

Hoje em dia o posicionamento é facilitado consultando uma app acessível num telemóvel  (c/ GPS) e colocando então Polaris no ângulo indicado. E estão disponíveis câmaras específicas (e.g., a PoleMaster da QHCCD) para localização electrónica do Pólo a partir da análise informática dos padrões estelares. Precisão total garantida!

1)    Alinhamento Polar   2)alinhamento polar   

1) Ferramenta tipo "relógio" para alinhamento de montagem equatorial (NB: Octans é obviamente referência para utilização no Hemisfério Austral). Para o nosso hemisfério, o círculo graduado no centro (0, 3, 6, 9) descreve os ângulos possíveis de Polaris com o Pólo verdadeiro (neste exemplo, estrela está próxima das 11 horas). Por fim, a pequena escala informativa com os anos (2020, 2024, etc.) diz-nos em que posição se deve colocar a estrela no pequeno intervalo dentro dos limites interno e externo do mencionado círculo graduado. Acautela-se assim um fino ajustamento determinado pela "epoch" específica, pois o eixo da Terra não é estático devido ao fenómeno da Precessão..2) Outro retículo. Neste caso, o círculo exterior destina-se ao Hemisfério Sul; o interior ao alinhamento nas nossas latitudes. O Pólo Celeste está no centro.

3) alinhamento polar  4) buscador polar

3) Retículo desenha estrelas mais conspícuas da envolvente próxima. 4) Um buscador polar clássico. Em cima vê-se o círculo graduado para ajustar Data/Hora; na face perpendicular (em redor do encaixe da ocular) vê-se o círculo destinado ao ajustamento preciso da Zona Horária (timezone) da nossa localização.

N.B.: Na ausência de um destes sistemas, resta recorrer a uma ocular de forte amplificação com mira (crossair).


Escala de Vernier

A Escala Vernier. Os círculos de posição analógicos são habitualmente marcados em intervalos de 1 ou 2 graus de Declinação e a cada 10 minutos de Ascensão Recta (A.R.; "R.A." em Inglês). Para alcançar maior precisão, utiliza-se a interpolação proporcionada pela escala vernier. Esta costuma grafar marcas de 0 a 10 ou similares. Habitualmente apresenta dez marcas para cada nove na escala principal (a do círculo graduado). Na leitura, observa-se qual a linha na escala vernier que coincide exactamente com uma qualquer linha na escala principal. Essa linha da escala indica a subdivisão exacta. A marca "0" (zero) na escala funciona como ponteiro. No exemplo ilustrado, a leitura da A.R. anda em torno das 7h35 (ver seta indicando o zero). Mas serão 35, 36 ou 37 minutos? A marca "6" da escala coincide exactamente com uma marca do círculo graduado (ver seta acima), logo a leitura correcta será 7h36m. (Scagell, R., Stargazing With a Telescope, Firefly Books, 2005, p.99; edit.).
O procedimento que subjaz é comparável aos métodos de Tycho Brahe (transversais) ou, principalmente, de Pedro Nunes (o nónio, um engenhoso sistema de medição angular).


Limpeza de componentes ópticos


A cuidadosa lavagem do espelho primário de um reflector (Steve Richards, BBC - Sky at Night Magazine - aceder ao tutorial)


- Prevenção é a "palavra-chave". A limpeza só deve ser efectuada em último recurso.

- É aconselhada a aquisição de um kit com todos os artigos necessários. São acessíveis em termos de preço. Ler instruções antes de administrar líquido de limpeza.

- Primeiro retirar o pó com uma pêra (soprador de ar) para remover as partículas pequeninas quase imperceptíveis ou, caso seja necessário, um pincel macio. É fundamentar evitar pressionar ou arrastar qualquer partícula que possa riscar definitivamente a superfície.

- Caso seja necessário remover gordura ou impressões digitais, utilizar álcool isopropílico, desengordurante neutro diluído em água ou ainda solução para limpeza de lentes de máquinas fotográficas (incluída nos kits).

- Utilizar uma flanela nova, algodão limpo ou papel específico (Optical Tissue) com fibras suaves para o efeito, com qualquer uma das opções acima, limpando a superfície delicadamente e sem pressão, em movimentos circulares.

- Evitar submeter o telescópio a alterações bruscas de temperatura para evitar condensação, condição que precisará ser corrigida imediatamente. Existem no mercado acessórios com resistências flexíveis (com potência de cerca de 5W) que podem adaptar-se em torno da parte frontal do tubo. Deixar equipamento destapado para secagem. Qualquer mancha deixada nas lentes só poderá ser limpa após secagem completa.

- As oculares não devem ser desmontadas porque possuem grande precisão e separadores internos. Externamente, os procedimentos de limpeza são semelhantes aos descritos. Por uma questão de escala e detalhe, utilizam-se cotonetes.

- O espelho de um reflector exige o mesmo nível de cuidado do que as lentes de vidro das objectivas dos refractores. Possui habitualmente uma finíssima pátina reflectora de alumínio, protegida por uma camada de dióxido de silício. Deve evitar-se a sujidade, a condensação e obviamente qualquer atrito. Pode formar-se uma fina camada de pó, o que não prejudica de modo notório a observação. É muito mais grave se ficar riscado no processo de limpeza. Todavia, se acumular muitas impurezas, matérias orgânicas, químicas, etc. precisa ser lavado. Ou seja, o melhor é prevenir, mantendo o tubo sempre tapado quando não está a ser utilizado. Quando inevitável, é desmontado e lavado com soluções adequadas (água tépida com umas gotas de detergente suave e água destilada). Isto deve acontecer muito raramente e com imenso cuidado. O perigo de queda é óbvio, devendo utilizar-se luvas de borracha na manipulação.

 

A Observação - expectativas

As astrofotografias (i.e. a falsa cor das emulsões e da maioria das imagens digitais) e o "optimismo" de alguns field guides e roteiros baralham os principiantes. Lendo descrições e contemplando as ubíquas fotografias, com brilhos magnificentes, cor, texturas e fabulosos arcos de nebulosidade, questionam: porque não vejo o mesmo na minha ocular? A resposta está, em boa medida, relacionada com a utilização de tecnologia capaz de acumular luz, algo inacessível ao olho humano. Todavia, a verdadeira "magia" reside em observar os fotões que chegam de tão longe com os nossos próprios olhos e não apenas, como referia Philip S. Harrington, "a sanitized photograph" (Star Watch, John Wiley & Sons, Inc., 2004). De resto, grande parte das fotografias publicadas recorre a codificação com cores falsas para destacar características "invisíveis" (densidade, temperatura, etc.), v. Kitchin, C., Telescopes and Technics... (2nd ed.), Springer, 2003, p.155.

É conveniente adequar as expectativas relativamente ao que podemos observar. Convém "esquecer" as fotografias profissionais (equipamento de excelência, acumulação de luz, i.e., longas exposições, cromatismo, edição, filtragem, stacking) e as que conhecemos do Hubble Space Telescope (que estando em órbita não possui uma "turbulenta" coluna de ar entre si e os objectos fotografados). Não vamos ver nada semelhante. Nem muitos dos objectos mapeados nos atlas impressos, dirigidos à vertente astrofotográfica.

Ted Aranda tem razão quando critica todo um acervo de literatura que não explicita devidamente a diferença entre a fotografia e a experiência visual concreta: "...a body of astronomical literature that does not sufficiently acknowledge the vast and largely unbridgeable difference between the photographic and the visual appearance of many types of deep-sky objects, thereby leading dedicated observers to have unrealistic – and all too often disappointed – expectations." (3,000 Deep-Sky Objects, An Annotated Catalogue, Springer Science+Business Media, LLC 2012, vii; vide também pp.27 et seq.).

O astrónomo alemão Simon Marius (latiniz. Simon Mayr; 1573-1625), pioneiro da utilização do telescópio, afirmava que até as estrelas distantes se observavam como "discos", uma noção errada que persistiu durante muito tempo, até uma teoria da difracção ser devidamente formulada. (Neil English, Chronicling the Golden Age of Astronomy: A History of Visual Observing from Harriot to Moore, Springer, 2018, p.32), Na realidade, os diâmetros aparentes das estrelas são demasiado pequenos (<0.04'') e nem o maior telescópio as consegue "ver" como globos (todavia, as Leis da Física determinam que, na realidade, as vejamos telescopicamente como pequenos discos: porque a luz viaja como onda e não em linha recta, a luz produzida por uma estrela nunca pode ser focada como um ponto aguçado, antes como uma mancha brilhante: o "disco espúrio" ou "disco de Airy"). Ou seja, com magnificação forte, as estrelas mostram um pequeno disco. Todavia, este é causado pela interacção da sua luz com a óptica do telescópio não sendo verdadeiro. Contudo, podem observar-se em maior quantidade, mais brilhantes e mais separadas, o que devolve resultados admiráveis na observação de estrelas duplas, múltiplas, variáveis, bem como de muitos enxames estelares. Por norma, os objectos do céu profundo são "coisas" longínquas, ténues e indefinidas (as genéricas nebulae de Herschel). Grosso modo são tudo menos vistosos e muitos dos diâmetros aparentes elencados baseiam-se numa ponderação fotográfica das dimensões. É preciso cautela pois a influência das astrofotografias estendeu-se, de modo "sub-reptício", aos field guides, aos relatórios de observação e até aos esboços desenhados.

Observados com pouca abertura ou em condições atmosféricas imperfeitas, os objectos veêm-se mais pequenos. As galáxias (quando se conseguem observar!) ficam confinadas ao seu núcleo. M31 (a célebre Galáxia de Andrómeda) mostra-nos somente o núcleo e M32 (galáxia satélite) surge mais ou menos afastada, o que não acontece nas fotografias de longa exposição que todos conhecemos, nas quais se sobrepõe ao gigantesco disco espiral de M31. Em bons céus, M31 expande-se quase até aos 5 graus (v. infra secção Atmosfera).


A esmagadora maioria das galáxias está tão longe e possui brilho superficial tão escasso que conseguirmos vê-las já é espantoso e admirável. O que dizer da avaliação da extensão ou dos detalhes estruturais? A "obsessão" dos guias e revistas com a sua “estrutura” radica decerto, igualmente, na mediatização e influência prevalecente da fotografia. Com telescópios de abertura mediana estes objectos são diáfanos ou leitosos, geralmente muito, muito ténues e com vaga e indetectável morfologia. "Braços em espiral" e outras características pouco conspícuas revelam-se praticamente inacessíveis. Eventualmente perceptível é a densidade acumulada na direcção do centro (núcleo). O brilho superficial pode variar nas diversas zonas do objecto. É comum, por exemplo, conseguir observar somente o núcleo mais concentrado de uma galáxia que sabemos (pelas fotografias, claro) ser muito mais ampla.

Paralelamente, a maioria das nebulosas catalogadas são inadequadas para observação visual (excepto quando observadas com equipamento de excelência e recurso a filtros), sendo objectos extremamente ténues e exclusivamente fotográficos (foi assim que muitas foram descobertas!). Segundo W. Steinicke, é sintomático que infelizmente se assista, desde finais do século XX, a uma inflação de "nomes" atribuídos - principalmente por amadores americanos - a partir, justamente, da observação das fotografias (Observing and Cataloguing Nebulae and Star Clusters, Cambridge University Press, 2010, p.4). Enfim, exercícios pueris de apofenia.

As chamadas "nebulosas planetárias", são objectos heterogéneos (podendo apresentar aparência estelar, esférica gasosa, irregular, etc.). Os detalhes pequenos e intrincados das fotografias estão, geralmente, ausentes na observação visual.

Quanto à percepção da cor, somente algumas nebulosas (de emissão ou planetárias), sendo ligeiramente esverdeadas, apresentam alguma (o olho humano não é sensível à cor com níveis de luminosidade tão reduzidos). Os objectos extensos (i.e. não visíveis como pontos) não passam, no seu melhor, de pálidos "borrões" cinzentos, evidentemente monocromáticos. No que diz respeito aos planetas, os diâmetros aparentes são relativamente modestos. Marte, por exemplo, é um planeta com metade do tamanho do nosso. Mesmo à distância mínima surge pouco maior do que o globo de Saturno. Quando as órbitas de Marte e da Terra se afastam, o "planeta vermelho" diminui para o tamanho aparente de Úrano e pouco mais é do que um ponto com tonalidade alaranjada no campo de visão do telescópio.

Verdadeiramente enriquecedor é estudar, aprender e procurar compreender o que estamos a observar. Nesta perspectiva, o empenho na observação supera as "desvantagens" da actividade, que J. B. Sidgwick elencava sucintamente, referindo as despesas e o desconforto: "...the expense and size of its equipment, and the discomforts and inconveniences of its pursuit." (Amateur Astronomer's Handbook (3rd ed.), Dover Publications, 1980).



À direita, Saturno (pormenor) fotografado pelo Hubble Space Telescope (NASA/ESA and E. Karkoschka, University of Arizona); confrontar com a observação infra (boas condições atmosféricas e máxima magnificação útil) num pequeno telescópio amador.

Equipamentos com pequena abertura mas boa óptica permitem, por exemplo, ver os satélites principais de Júpiter como pontos luminosos e, em circunstâncias favoráveis, um vislumbre de duas faixas paralelas mais escuras (acastanhadas) na atmosfera do gigante gasoso, visualizar um ou outro detalhe mais evidente na superfície de Marte (somente com condições excelentes e ampliação máxima), as fases de Vénus e, evidentemente, estudar a Lua em pormenor (Na observação da Lua, o terminador - linha de sombra, a linha do sol nascente na Lua - é sempre mais interessante pelos detalhes do relevo lunar).

Em baixo,
A Lua, Vénus, Marte (simulação nas melhores circunstâncias possíveis), Júpiter e Saturno observados com equipamento refractor de 90mm c/ distância focal de 900mm, ampliação 180x.



(fonte: Newbury Astronomical Society)

 


Amplificações telescópicas necessárias para obter uma imagem dos planetas que corresponda, em tamanho, à da Lua com a vista desarmada. Valores aplicam-se à elongação máxima dos planetas interiores (Mercúrio e Vénus) e à oposição dos planetas exteriores (Roth, Gunther, Helm, A. (trad.), The Amateur Astronomer and his Telescope, Faber and Faber, 1972)

 


NGC7293, "Helix Nebula". Fotografia do European Southern Observatory; à direita: esboço de observação do mesmo objecto (muito ténue, no centro) c/ binóculo de abertura mediana e, decerto, em circunstâncias muito favoráveis (autor: Philip Harrington)


Condições aquém do ideal...

A observação depende, como sabemos, de muitos factores. Segundo a estimativa de Robin Scagell (City Astronomy, Sky Publishing Corp., 1994), num contexto urbano (ou, diremos nós, na maioria das circunstâncias, e.g., qualquer contexto "fraquinho" dos subúrbios), poderemos observar:

- qualquer enxame aberto com uma magnitude integrada até 7, estando elevado acima dos 20º relativamente ao horizonte;
- qualquer enxame globular de 8ª magnitude ou mais brilhante, elevado acima dos 45º;
- nebulosas planetárias se forem pequenas e estiverem elevadas acima dos 45º, principalmente se se utilizar filtro; algumas exigem magnificação forte;
- as galáxias são sempre difíceis neste ambiente, excepto se elevadas acima dos 65º. As que estão de perfil são menos difíceis do que as que se observam voltadas para nós; os filtros habitualmente não são úteis;
- algumas nebulosas difusas são observáveis e um filtro específico pode auxiliar a observação;
- estrelas duplas mais acessíveis podem observar-se se estiverem elevadas acima dos 20º.


Objectos do Céu Profundo: Brilho Superficial vs. Magnitude

Na observação de nebulosas ou galáxias, o chamado Brilho Superficial é mais importante do que a magnitude. Os catálogos de objectos do céu profundo listam, habitualmente, uma "magnitude integrada" (como se a luminosidade do objecto se concentrasse num ponto). Todavia, nos objectos extensos (não punctiformes) este parâmetro não é linear e o contraste com o background, será sempre mais baixo. Como exemplo, uma nebulosa com magnitude 9 surge muito mais ténue do que uma estrela dessa mesma magnitude, pois a sua luz espalha-se por uma área maior. Em paralelo com o seu brilho, a extensão de um objecto do céu profundo é determinante na escolha do instrumento a utilizar na sua observação. Estratégias diversas respondem a diferentes desafios. Diferentes objectos/tipos de objecto respondem de modo diferente ao mesmo tipo de magnificação. Com determinada abertura e magnificação, uma galáxia pode "perder-se" em termos de contraste enquanto um exame aberto pode "explodir" visualmente em inúmeras estrelas luminosas e nítidas. Mesmo no caso de nebulosas planetárias, a dificuldade de observação é evidente se compararmos o seu brilho com o brilho "aguçado" de uma estrela de magnitude equivalente.

Este parâmetro procura rectificar Magnitude vs. Visibilidade. Todavia, conseguimos por vezes a olho nu integrar a luz de objectos extensos, como se fossem compactos. O cérebro interpreta-os então como ténues manchas de luz (e.g., M31 a galáxia de Andrómeda, avistada sem ajuda óptica em locais suficientemente escuros). Também ajuda que este tipo de objecto não seja homogéneo, muitas vezes assumindo maior concentração e brilho na direcção do seu núcleo. Na observação astronómica dos objectos extensos, o ideal é nunca esquecer este parâmetro. O valor da magnitude habitualmente disponibilizado é enganador pois, como vimos, pressupõe que a luz do objecto esteja concentrada num ponto, como nos objectos estelares. Por seu lado, o Brilho Superficial baseia-se da estimativa fotométrica da luminosidade emitida por unidade de área da sua superfície (e.g., por segundo ou por minuto de arco quadrado). O tamanho é a chave! A dispersão depende da área e morfologia do objecto e determina a sua visibilidade. Com modesto brilho superficial, a nebulosa ou galáxia não suporta magnificação, a sua visualização exige paciência, céu muito escuro sem poluição luminosa, provavelmente visão lateral ou indirecta (método que consiste em não olhar para o alvo, mantendo nele a nossa atenção, permitindo ganhar cerca de 2 magnitudes) ou filtro (OIII no caso das nebulosas de emissão, para o oxigénio duplamente ionizado). Aconselhamos o excelente The Observer's Sky Atlas (E. Karkoschka), exemplar na informação disponibilizada para cada objecto do céu profundo (ver atlas e cartas celestes).

Como o astrónomo Paul Markov salienta, "incrivelmente, a maior parte dos atlas e guias não inclui este dado". Contudo, a informação do brilho superficial não deve ser utilizada autonomamente mas articulada com a habitual informação da magnitude. O conceito é simples. Imagine-se uma lanterna apontada a uma parede muito próxima. Produz um círculo luminoso com determinado diâmetro e intensidade. Afasta-se a lanterna da parede. Agora o círculo é maior mas a intensidade da luz reduziu-se consideravelmente. Num telescópio, podemos fazer uma experiência reveladora: observamos uma estrela e desfocamos até que a imagem "explodida" ocupe uma área considerável do nosso campo de visão. Novamente verificamos como o brilho diminui consideravelmente, podendo tornar-se quase invisível. Um exemplo típico é o objecto M74, em Pisces. A sua magnitude é relativamente elevada (9.4), mas quando verificamos que a área é de 12'x12', chegamos ao valor de 14.2 para o seu brilho superficial! Por isso este exemplo do catálogo de Messier é considerado difícil. Em compensação, M57 (magnitude 9) é uma nebulosa planetária tão pequena que pode ser observada com facilidade (dimensão 1.3'x1.0'). Resumo: é fundamental possuir um catálogo com esta informação. Markov termina a sua explicação com humor: "Se alguém vos pedir para encontrar a galáxia UGC 9749 (na constelação Ursa Minor), com a razoável magnitude 10.9, o melhor é nem sequer instalar o telescópio. Este objecto "acessível" possui um brilho superficial equivalente a 17.8!" (v. texto, arquivado do oriig.; PDF 42KB).

Guilherme de Almeida e Pedro Ré explicam como a caracterização da "escuridão" do céu está relacionada com este conceito: "Se o brilho superficial for, por exemplo, "magnitude 12 por minuto quadrado, isso significa que, nessas condições, cada minuto quadrado do céu apresenta em média um brilho equivalente à magnitude 12. (...) Como é evidente, um objecto difuso só se pode detectar se o seu brilho superficial for superior ao brilho superficial do céu de fundo (menor magnitude por unidade de área aparente de céu)." (Observar o Céu Profundo (2ª Edição), Plátano Edições Técnicas, 2003, pp. 62-3). Como Ronald Stoyan refere, um objecto somente é visível se equivaler ou exceder determinado valor de contraste com a envolvente. Sob céus sujeitos a poluição luminosa ou neblina, o problema dos objectos com baixo brilho superficial não se resolve com o tamanho do telescópio, pois se com a mesma magnificação o equipamento maior devolve maior brilho do objecto, fá-lo na mesma proporção com o brilho de fundo do céu. Portanto, o local de observação e a qualidade da noite revela-se mais importante do que o telescópio. (Atlas of the Messier Objects: Highlights of the Deep Sky, Cambridge University Press, 2008, p.64)


M1, a Nebulosa do Caranguejo (remanescente de explosão de supernova), em Taurus. Desenho de Richard Orr a partir de observação com refractor de 155mm, objectiva Radian de 10mm (magnific. 109x)


Como exemplo observacional, elencamos alguns dos objectos "Messier" habitualmente considerados "desafiadores": M1, M33, M74, M83, M91, M98, M101, M107, M109 ou M110. Extremamente dependentes de boas condições e quase sempre invisíveis num ambiente "suburbano" (sendo que esta classificação não é totalmente 'objectiva'). Conclui-se que há imensas e flutuosas variáveis (contraste, transparência, latitude, altitude, abertura, magificação, magnitude integrada, brilho superficial do objecto, etc.). O veterano Tony Flanders recorda-nos que a transparência é variável mas tende a ser melhor de Outubro a Abril (Hemisfério Norte). A Poluição Luminosa é a maior ameaça. Em darksitefinder encontramos um "atlas" que procura classificar (utilizando código de cores) as diversas regiões (não considera condições climáticas, relevo ou iluminação localizada). Ver panorama deste flagelo (mapa abrange sudoeste europeu e parte do noroeste de África).

Mapa Poluição Luminosa
(fonte:
darksitefinder.com)


Observação - "dicas" genéricas/relacionadas com a observação com equipamentos "manuais", sem utilização de sistemas automáticos

[Da vasta bibliografia pertinente, destacamos a excelente colectânea Astronomy Hacks, de Robert & Barbara Thompson (O'Reilly, 2005) e o Deep Sky Observing: An Astronomical Tour (2nd edition) de Steven R. Coe (Springer International Publ., 2016]

Por "sistemas automáticos" entenda-se os GoTo motorizados. Também não nos referimos aos sistemas Push-to (sem motor mas com digital setting circles (DSC), que através das coordenadas guiam o observador na direcção adequada até chegar ao "zero"). Há quem argumente que utilizar um equipamento computorizado liberta mais tempo para efectivamente 'observar', em vez de 'procurar'. Por outro lado, a opção "analógica" cria uma relação plena com a envolvente, desafiando o observador, exigindo autonomia e criando familiaridade com o céu nocturno, sendo para muito amadores muito mais gratificante. O star-hopping é a abordagem puramente visual. É espantoso como o nosso cérebro memoriza, gradual e eficazmente, os percursos nas diversas e diferentes regiões do céu.

É sempre interessante aceder a recursos diversificados para adquirir referências teóricas, ler descrições, compreender como observar (técnicas) e o que se está a observar (e.g., características, relevância cosmológica, aspectos históricos e culturais). Alguns títulos (incluindo alguns "clássicos") na fotografia seguinte.

Títulos diversos

 
Generalidades / Coordenadas, Ângulos e Orientação

- É fundamental conhecer o céu à vista desarmada (constelações e asterismos de referência, "juntar os pontos", ter noção de escala, orientação, etc.). Possuir noções de astronomia esférica. O horizonte Sul deve (no nosso Hemisfério) ser privilegiado na observação, atendendo à dinâmica do movimento diurno da Esfera Celeste. É nesse movimento que evoluem a Lua, os planetas e o céu específico de cada época do ano.

Meridiano local
O meridiano local é um círculo imaginário que une os pontos norte e sul, passando pelo zénite do observador (Degani, Meir  H., Astronomy Made Simple (Revised Edition), Doubleday & Company, Inc., 1963)


- Precisamos conhecer o campo de visão (FOV) do buscador, das oculares (no nosso telescópio) e combinações com lentes Barlow (é conveniente fazer uma tabela para referência). Antes porém, devemos conseguir estimar as distâncias angulares a olho nu através de métodos expeditos.


Referências aproximadas para medição de distâncias angulares utilizando a mão, com braço estendido (C. E. Roth, The Sky Observers Handbook, Prentice Hall Press, 1986). Em baixo, as distâncias angulares no mais conhecido padrão da constelação Ursa Major (Scagell, R., e Frydman, D., Stargazing with Binoculars, Firefly Books, 2008)

 - Planear as sessões (condições atmosféricas, elenco dos objectos a observar, magnitudes, particularidades), sabendo antecipadamente o que estará observável, onde/quando e em que condições. A meteorologia pode ser implacável, é necessário estar preparado para algumas desilusões: Disappointment is so often the lot of the astronomer (Herbert H. Turner).

- Observar a orientação cardeal, determinando o meridiano do lugar (utilizar uma bússola, se necessário). Na sessão de observação, começar a observar de Oeste para Este, "contrariando" o movimento aparente da Esfera Celeste. Compreender as direcções fundamentais (na abóbada celeste, Norte significa SEMPRE a direcção da Estrela Polar). Seguir os grandes círculos convencionais da Esfera Celeste e orientar as cartas ou mapas em consonância.


Orientação (mostrando como pretexto o campo de visão de um equipamento binocular) nas direcções E, S, O e N, respectivamente. Local de latitude Norte intermédia. Na Esfera Celeste, o Norte é sempre na direcção (aproximada) da Estrela Polar. As setas maiores representam a direcção do movimento diurno dos astros em torno do pólo celeste (fonte: Kambic, B., Viewing the Constellations With Binoculars, Springer Science, 2010, pp 32-3)

Movimento aparente das estrelas nas quatro direcções cardeais para um observador no Hemisfério Norte (Davidson, N., Sky Phenomena: A Guide to Naked-eye Observation of the Stars, Lindisfarne Press, 1993)


- O mapeamento dos objectos na Esfera Celeste é agilizado, como sabemos, através de um sistema de Coordenadas Equatoriais (Ascensão Recta e Declinação). Localmente, podemos utilizar coordenadas "Horizontais", Altazimutais (relacionadas especificamente com o nosso Horizonte e Meridiano, i.e., Elevação e Azimute). Para evitar equivocos relativamente ao posicionamento de dois objectos no seu movimento diurno, encontramos na literatura em Inglês os termos dinâmicos "preceding" (p) / "following" (f) em substituição de Oeste e Leste, respectivamente. Outro expediente importante é o chamado "Ângulo de Posição", para indicar a posição de um eixo. Medido a partir do Norte (000), passando pelo Este (090) e assim sucessivamente. Muito utilizado, por exemplo, para traduzir a orientação de uma galáxia ou definir as posições relativas dos componentes de sistemas estelares duplos (v. imagem).

Ângulo de Posição 
Na primeira imagem, o Ângulo de Posição e a Separação entre componente principal e comes ("companheiro", pl. comites) de um sistema duplo. Comes é a designação tradicionall, sendo que hoje sabemos que muitas binárias são somente ópticas (Bone, N., Deep Sky Observer's Guide, Firefly Books, 2005); à direita: campo de visão invertido (telescópico); explicação das direcções do movimento de um astro e ângulo de posição, observador posicionado no Hemisfério Norte voltado para sul (Ridpath, I. (Ed.) Norton's 2000 Star Atlas and Reference Handbook, Longman Scientific & Technical, 1989)
 

Atmosfera

- A importantíssima camada cuja altitude limite é habitualmente situada entre os 60 e os 89 Km. Para o astrónomo amador há duas variáveis fundamentais: a transparência (claridade, ausência de nuvens ou nevoeiro), habitualmente chamada "contraste", pois é determinante na visibilidade dos objectos; a segunda é a estabilidade (o chamado "seeing"). É importante compreender que a atmosfera determina os limites do que podemos observar: não é homogénea nem constituída por ar imóvel, todo ele à mesma temperatura. Existe muitas vezes uma espécie de brilho de fundo ("skyglow") com causas artificiais (o terrível flagelo da poluição luminosa) e também, em muito menor escala, naturais (do próprio ar, brilho estelar não resolvido opticamente, etc.). A cintilação excessiva das estrelas também denota más condições para a observação. Devido à inerente inconstância, a qualidade da observação pode alterar-se num curto intervalo. As condições geralmente melhoram a partir das 2 ou 3 horas da madrugada (menor poluição e atmosfera mais calma). A altitude geográfica é vantajosa. As noites frias são amiudadamente propícias à observação pois as massas de ar frio e seco absorvem menos luz. Por outro lado, as noites com alguma nebulosidade ou nevoeiro fino são adequadas à observação dos planetas, permitindo visão nítida e firme. Observando o céu conseguimos distinguir as regiões propícias das que estão inundadas pela poluição luminosa ou nebulosidade, proporcionando menor contraste. A ponderação da transparência atmosférica é relativamente fácil e standardizada. A maior parte dos observadores definem-na através da magnitude da estrela mais ténue que conseguem observar à vista desarmada. Assim, atribuem valores desde 0 (zero), quando nada se consegue ver excepto as estrelas mais brilhantes (e.g., Sirius), até 6 (estrelas de sexta magnitude ao alcance).


Exemplificação da observação de um objecto difuso (M31) em condições decrescentes de contraste. Repare-se como a dimensão aparente detectável é afectada, ao ponto de somente se conseguir observar vagamente o núcleo da galáxia (Guilherme de Almeida e Pedro Ré, Observar o Céu Profundo (2ª Edição), Plátano Edições Técnicas, 2003); à direita, simulação do incremento da visibilidade, utilizando como exemplo as imediações de M31. Na sequência: cidade, subúrbio e localização rural (Ramotowski, B., Secrets of Stargazing: Skywatching Tips and Tricks, Sky Publishing, 2007)

 
- Nem sempre as noites limpas e claras são as melhores para a observação. A atmosfera pode manifestar turbulência. Diferenças de densidade entre correntes de ar quente e de ar frio refractam ou desviam a luz na sua travessia da atmosfera. As imagens que vemos parecem então estar em ebulição. É preferível um ambiente com alguma nebulosidade mas com as massas de ar mais estáveis. O melhor "seeing" acontece após a passagem de um sistema de baixas pressões, quando o barómetro está a subir. Ventos em altitude tendem a tornar o céu mais transparente, afastando o ar aquecido e enevoado comum nas áreas urbanas, todavia propiciando o aumento da turbulência e a consequente diminuição da definição óptica e da resolução.

- Não esquecer a previsão meteorológica na preparação de uma sessão de observação, em particular se envolver viagens/deslocações. Indícios: as nuvens esparsas do tipo cumulus, avistadas durante o dia, geralmente desaparecem pouco depois do ocaso do Sol. As estratiformes e cirriformes, associadas ao tempo chuvoso, tendem a permanecer.

António G. Mattoso e Álvaro d'Athayde descreviam, num manual escolar de 1942, diversos tipos de nuvens. Os Cúmulos, a que os marítimos chamam, segundo os autores, "algodões", que em regra aparecem de manhã e desvanecem-se durante a tarde. Os Cirros, nuvens mais altas, denominadas "rabos de gato", assemelham-se a lã cardada e pressagiam mau tempo. Os Estratos apresentam-se como faixas paralelas horizontais e, durante o Verão, formam-se do lado poente. Os Nimbos são nuvens cinzentas e espessas com bordas franjadas, produzindo sempre chuva. Os homens do mar chamavam-lhes "aguaceiros".

Tipos de nuvens
Cúmulos, estratos e cirros (Ciências Geográfico-Naturais: 1º, 2º e 3º anos dos liceus (5ª Edição), Livraria Sá da Costa , Lisboa, 1942, pp.107-9)

Actualmente, reconhecem-se três formas básicas: cirros, cúmulos e estratos. Os cirros são nuvens altas, brancas e finas, parecendo por vezes delicados véus; os cúmulos são geralmente massas globulares individuais e têm a aparência de domos ou torres; os estratos podem ser descritos como "lâminas" ou camadas que cobrem uma área muito grande ou todo o céu. Quanto à altura, as nuvens altas têm a base a cerca de 6000m de altitude, as médias entre 2000 e 6000m e as baixas abaixo do último valor. As nuvens altas são normalmente formadas por formas híbridas: cirros, cirro-estratos e cirro-cúmulos; as nuvens de altitude média têm a forma de alto-estratos e alto-cúmulos e as nuvens baixas podem ser estratos, estratocúmulos e nimbo-estratos. Há ainda nuvens de desenvolvimento vertical associadas à instabilidade do ar. (fonte: Infopédia [Porto Editora – classificação das nuvens na Infopédia [em linha]. Porto: Porto Editora. [consult. 2024-01-29]. Disponível em https://www.infopedia.pt/$classificacao-das-nuvens])


- Evitar observar objectos com pouca altura (pouco elevados relativamente ao Horizonte) pois a luz que chega até nós atravessa uma camada mais espessa da atmosfera, obliquamente. Chama-se extinção ("avermelhamento" e diminuição da luz do objecto) ao fenómeno que minimiza a magnitude do objecto em função da menor altura relativamente ao horizonte (maior espessura atmosférica). A melhor "faixa" (em altura) para observar situa-se entre os 45 graus e o zénite. De resto, a luz das estrelas e planetas é diminuída em uma ou duas medidas de magnitude quando o corpo se encontra entre 4 e 10 graus da linha de horizonte.

- Poluição: névoas, fumos, particulas de poeira... tudo isto reduz a transparência. A luz artificial estupidamente enviada para cima, onde não é necessária, ilumina as partículas em suspensão na atmosfera, causando uma espécie de "aurora" artificial. Em regiões mais fustigadas, gera-se aquilo a que Michael Porcellino chamou "segundo horizonte", um "horizonte" de luz que reduz a área do céu observável.

- As noites próximas do solstício de Verão têm pouco para oferecer (Hemisfério Norte, piorando com a latitude) no que diz respeito aos objectos ténues e difusos devido à duração do crepúsculo astronómico (tecnicamente, é o instante em que o centro geográfico do Sol está 18 graus abaixo do horizonte). O Sol está muitas horas pouco abaixo do Horizonte.

 
Equipamento básico e recursos

- Antes de mais, atenção às condições de armazenamento dos equipamentos! Os fungos espalham-se pelo ar através de esporos minúsculos e, em condições de humidade e temperatura propícias (humidade relativa entre 60% e 95%, em conjugação com temperaturas entre os 12ºC e os 38ºC), atacam os componentes ópticos que evidenciam um padrão reticulado e o característico odor a mofo. Por isso é importante acautelar as as circunstâncias do armazenamento dos equipamentos. Existindo produtos fungicidas, a situação pode eventualmente tornar-se irreversível (a corrosão das superfícies ópticas causa difusão da luz e consequente degradação da imagem). A solução reside na prevenção, controlando a humidade relativa do local onde se guarda o equipamento através de desumidificadores ou saquetas com agentes dessecantes (e.g., sílica-gel).

- É necessário dominar o funcionamento do equipamento. A aprendizagem básica deve ser feita com antecedência e de dia, utilizando objectos terrestres, para acautelar uma utilização competente na obscuridade. Ter em consideração que a montagem ou suporte é tão importante como a óptica. É necessário minimizar a vibração e garantir estabilidade na utilização do equipamento. Colocar um "lastro" no tripé pode ajudar.

- O desempenho de um telescópio depende, de modo crítico, da estabilidade da atmosfera e da qualidade dos seus componentes de formação de imagem. A situação ideal combina um equipamento com qualidade e manutenção, uma atmosfera propícia e um observador concentrado e relaxado, que previamente planificou a sessão (local, conforto, sequência previsível dos alvos, documentação de suporte, etc.).

- Para evitar recorrer constantemente à lanterna, convém organizar o equipamento com uma ordem precisa. Com a rotina, encontrar uma ocular ou outro acessório torna-se intuitivo.

- O buscador é essencial. Sem este equipamento (diversos tipos disponíveis) não se consegue encontrar nada. O campo de visão das oculares é habitualmente pequeno e o céu é enorme! Tradicionalmente um pequeno refractor com abertura de cerca de 20mm - 50mm e magnificação entre 5x e 8x. Mas há sistemas alternativos preferidos por muitos amadores (Telrad, red dot finder, i.e., do do tipo "ponto refletido", etc.). Estes não ampliam (zero magnification): projectam círculos ou um ponto de mira no céu.

- Ter em atenção a superfície onde se vai instalar o equipamento evitando irregularidades e declives ou proximidade de paredes ou pavimentos que estiveram expostos ao sol, propícios à criação das turbulentas correntes de convecção.

- Os sistemas ópticos utilizados, pelo seu funcionamento intrínseco, invertem de algum modo a imagem produzida. Exige habituação.


Exemplificação (com a letra "F") de imagem direita (A), invertida (B) e com lateralidade trocada (C) (Máximo Ferreira, e Guilherme de Almeida, Op. cit., 1995, p.212)

 
- Uma competência fundamental é a estimativa de dimensões e distâncias angulares. Com a prática, é possível ponderar dimensões aparentes ou distâncias entre objectos com alguma precisão. Passa por conhecer bem o nosso equipamento (telescópio/oculares) em termos de campo de visão. Como exemplos, a distância entre Mizar e Alcor é de 12'. Entre Epsilon-1 e Epsilon-2 Lyrae (a famosa Double-Double) é de 3.5'. O mesmo acontece com a estimativa das magnitudes, por comparação entre objectos (para uma abordagem sistemática, ver como exemplo esta carta AAVSO (American Association of Variable Star Observers) para a variável R CYG). Como sugerido, é importante conhecer o campo de visão efectivo do nosso telescópio com cada uma das diferentes oculares. Isto pode ser determinado fazendo alguns cálculos (vide supra, explicação das características ópticas) ou medindo o tempo que uma estrela (localizada nas imediações do Equador Celeste) demora a atravessar o nosso campo visual (mantendo o telescópio estático). O diâmetro (em minutos de arco) é igual ao tempo de "trânsito" da estrela (em minutos de tempo), multiplicado por 15. Antes porém, é fundamental conhecer o FOV do buscador.

- Na consulta de atlas e cartas, urge ter a noção da escala e assinalar o campo de visão (FOV, field of view) aproximado, em função do equipamento que utilizamos. Podemos utilizar a própria grelha do mapa, caso seja adequada, ou layers de acetato. Ver o curioso expediente da imagem seguinte (Alan MacRobert/Sky & Telescope). Devemos fazer corresponder o mapa com a direcção em que se observa, reconhecendo padrões e orientando-o em consonância com o céu.

- Os planetários informáticos têm a vantagem (relativamente aos atlas tradicionais) de exportar ou imprimir cartas com o nível de detalhe adequado às condições de observação (limites de magnitude, categorias de objectos a observar, etc.), correctamente orientadas (em função do local/data/hora), podendo incluir círculos Telrad ou representativos do campo de visão de oculares específicas a utilizar. Permitem ainda a visualização e impressão de cartas invertidas, vertical e/ou horizontalmente, em consonância com o sistema óptico utilizado.

 
Ergonomia

- Acautelar o conforto pessoal, em função da temperatura, humidade, etc. O frio e o perigo de hipotermia podem ser dissuasores. No Outono-Inverno, o amador mais persistente precisa de vestuário térmico e tudo o que possa tornar tolerável uma actividade tão sedentária. Utilizar várias "camadas" de roupa, luvas cortadas para permitir manipulação dos equipamentos, o obrigatório gorro (pois protege uma parte do corpo fundamental e pela qual se arrefece rapidamente), etc. Há que reconhecer que a observação astronómica exige alguma robustez física, resiliência e força de vontade.

- Permanecer sentado é mais confortável e garante melhor concentração. Utilizar um banco ou cadeira ajustável. É agonizante ficar a meio caminho entre a posição sentada e a erecta para conseguir aceder à ocular. (Há cadeiras ajustáveis que podem ser encomendadas).


Ilustração de soluções promotoras do conforto para observação com binóculos e, à direita, cadeira ajustável para utilizar c/ telescópio; fonte: Shore, L., The Total Skywatcher's Manual: 275+ Skills and Tricks..., Weldon Owen. 2015

- O olho não deve tocar a ocular mas deve centrar-se na luz que emerge da mesma. É necessário procurar o ângulo mais adequado, podendo utilizar-se a mão em "concha" para ajudar a apontar e eliminar a eventual luz intrusiva que exista nas imediações.

- Um bom observador não olha pelo telescópio prolongadamente e em sacrifício mas sim com brevidade e atenção, para não gerar fadiga ou perder sensibilidade. Utiliza ambos os olhos abertos para não contribuir para o desconforto da tensão muscular inerente a manter um deles fechado. A paciência é outra virtude: saber esperar que a atmosfera tranquilize e permita revelar aquele detalhe planetário ou um vislumbre de uma longínqua galáxia. Por isso se aconselha o máximo bem-estar postural e térmico.

- É importante estar calmo, tranquilo, com respiração controlada.

- Fazer intervalos regularmente, para repousar. Relaxar, desfocar e voltar a focar a imagem.

- Se exequível, a instalação de um observatório permanente é extremamente cómoda.

esquemas: observatórios amadores
Ilustração de diversos tipos de abrigo (tecto deslizante, cúpula e simples alpendre; Ronan, C., Amateur Astronomy: a compreensive and practical survey, Mallard Press, 1989). Os observatórios de amadores são habitualmente de quatro tipos: cúpula, tecto de correr, abrigo de correr e janelas em sótãos ou águas furtadas.


Agilização das sessões / técnicas e procedimentos

- Acautelar escolha do local de observação, evitando a poluição luminosa e a irradiação de calor dos edifícios. Todavia, acautelar antes de mais a segurança.

- Iniciar sessão com antecedência, adequando a predisposição (tranquilidade e paciência são importantes) e a adaptação ocular à obscuridade (o olho humano está equipado com um autêntico "diafragma" circular: a íris (a parte colorida), que se adapta às diversas condições de intensidade luminosa.).

- Instalar o equipamento com antecedência. Este deve ambienta-se à temperatura exterior para minimizar o diferencial térmico (mantendo todavia o tubo óptico tapado até ao início da observação).

- A Adaptação à Obscuridade é fundamental! A rodopsina (púrpura visual) é uma proteína transmembranar que se encontra nos bastonetes. Responsável pela visão monocromática no escuro, logo pela nossa adaptação em condições de pouca luz. É extremamente sensível à luz. absorvendo fortemente a luz verde azulada. Atenção: a adaptação acontece separadamente para cada olho. Isto significa que podemos manter fechado ou tapado o olho director (que habitualmente utilizamos na ocular) enquanto fazemos outras coisas com o segundo, em ambiente iluminado. Há quem utilize uma pala (sim, como a dos piratas!). Em ambientes com luz intrusiva podemos utilizar uma toalha de resguardo sobre a cabeça enquanto observamos. O importante é observar com qualidade, não a aparência mais ou menos excêntrica ou "ridícula"!

- Verificar que todo o equipamento está disponível , incluindo uma lanterna vermelha (útil nos ajustes do equipamento, troca de oculares, consulta de mapas, etc.) pois não prejudica a nossa adaptação à obscuridade.

- Verificar, com alvo acessível, se buscador (apontador, red dot finder, etc.) está alinhado com o tubo principal (fundamental para encontrar os alvos, pois a área do céu observável numa ocular é sempre restrita ou mesmo diminuta). Sem essa convergência seria um "pesadelo" encontrar qualquer objecto.

- Determinar aproximadamente o limite de magnitude observável a olho nu (NELM, acrónimo do Inglês Naked Eye Limiting Magntude). Utilizar mapas para este efeito, localizando as estrelas mais ténues ou fazendo uma contagem numa pequena região confinada. A determinação da magnitude limite pode fazer-se, com rigor, utilizando os procedimentos aconselhados pela International Meteor Organization. Neste método, contam-se as estrelas que são visíveis numa pequena área poligonal do céu, definida por estrelas fáceis de identificar. Trata-se
de pequenos "star fields" nos quais a contagem pode, com recurso a tabelas, encontrar o valor da magnitude limite observada. Aceder a listagem de "star fields" e tabela de conversão (IMO).

Star fields
Detalhe de carta disponibilizada pela IMO com alguns "campos" assinalados

 
- Star hop: é importante encontrar um ponto de partida inequívoco para "navegar" - uma estrela brilhante, um asterismo ou padrão peculiar (triângulo, trapézio, alinhamento, etc.).

- Evitar deixar objectivas, espelhos e oculares expostos desnecessariamente. A limpeza dos componentes ópticos não deve ser demasiado frequente e deve ser extremamente cuidadosa (a seco, ar soprado, pano macio e produtos específicos vocacionados para limpeza de lentes). O ideal é proteger, evitar a necessidade de limpeza destes componentes.

- Prevenir a condensação dos vidros. Conhecer (se possível) e ter em atenção o chamado "ponto de orvalho", que designa a temperatura na qual o vapor de água presente no ar ambiente passa ao estado líquido na forma de pequenas gotas (condensação de vapor de água numa superfície sólida que arrefeceu abaixo do ponto de condensação do ar em contacto). Temperaturas maiores implicam massas de vapor admissíveis maiores. Se a temperatura do ar baixar até que a quantidade máxima de vapor admissível iguale a quantidade de vapor de água efectivamente dissolvida na massa de ar em consideração, atinge-se a humidade relativa de 100%, a temperatura de orvalho. Os refractores costumam incluir um "pára-sol" que avança à frente da objectiva (defendendo de luzes intrusas) e também constitui um "pára-humidade".

- No final da sessão, o tubo deve ser tapado "no ar em que foi utilizado" (como escreveu T. W. Webb no seu clássico Celestial Objects for Common Telescopes).

- Em geral, para qualquer nível de experiência, é conveniente começar com oculares com campo mais amplo (maior comprimento focal e menor ampliação) e, a partir daí, experimentar outras oculares e lentes Barlow (cada substituição de ocular costuma exigir ajustamento na focagem do telescópio). Ao retirar uma ocular do focalizador, colocar tampa ou guardá-la num bolso até à próxima utilização (permite mantê-la num ambiente ameno, contrariando eventual condensação).

- O principiante deve começar pela Lua (se estiver observável) e utilizar ampliações modestas. Focar e gradualmente experimentar outras oculares e outros alvos.

- Organizar os alvos mais brilhantes para os mais ténues. Permite melhor adaptação à obsecuridade e, em princípio, um céu gradualmente mais escuro.

- Quando a focagem de uma estrela é bem conseguida e a vemos definida como um ponto, começamos subitamente a ver outras estrelas, mais ténues, que se situem nas imediações.

- Reforçamos a ideia de que uma observação descontraída pode passar por manter ambos os olhos abertos, evitando o esforço inerente à observação monocular.

- Como referido, a qualidade e estabilidade da imagem é mais importante do que a amplificação. Aumentada excessivamente, a imagem torna-se difusa, menos luminosa e perde detalhe. Outra consequência: o objecto atravessa o campo visual com demasiada celeridade. Somente como referência e não regra absoluta: amplificações modestas adequam-se à localização e observação de objectos amplos do céu profundo; as mais fortes à observação de sistemas binários, planetas ou detalhes do relevo lunar. Há objectos cujo estudo, pelo seu diversificado, rico e gradual detalhe, exigem diversas magnificações (e.g., M42).

- Na observação planetária, acautelar a importância da elevação da Eclíptica (pois o Zodíaco é a "via" percorrida pelos planetas, pelo Sol e pela Lua) para garantir as melhores circunstâncias. Sabendo que o Sol (e consequentemente a Eclíptica) está, no Hemisfério Norte, na máxima altura no Verão e na mínima altura no Inverno, decorre do movimento diário aparente do céu que o círculo da Eclíptica esteja na máxima altura ao entardecer na Primavera, ao meio-dia no Verão, ao amanhecer no Outono e à meia-noite no Inverno. Nesta perpectiva, o Verão não é a melhor época do ano para observar os planetas.

- Existem no mercado filtros (lunares, planetários, magnificadores do contraste das nebulosas, compensatórios da poluição luminosa, etc.) para optimizar a observação, sendo enroscados na base das oculares. Não melhoram a qualidade da imagem mas ajudam o observador a distinguir detalhes de outro modo difíceis. Utilizam-se para separar a luz em diversos comprimentos de onda, suprimindo luz em diversos deles, do azul ao vermelho, consoante o objectivo. Admitem selectivamente alguns comprimentos de onda (equivalendo a cores), reflectindo outros (melhorando a proporção entre sinal e ruído). São catalogados segundo o standard fotográfico Wratten da Eastman Kodak (ver listagem com info específica para cada modelo; J. L. Chen, em Inglês, .PDF, 463KB). Os LPR (“light-pollution reduction”) prometem, como designação indica, reduzir a poluição luminosa. O problema é que a luz das estrelas reside nos mesmos comprimentos de onda que a de muitas fontes luminosas artificiais. Portanto, estes filtros não são eficazes na observação de galáxias, enxames, etc. Talvez no caso de algumas nebulosas difusas e planetárias.
Em resumo, o brilho intrusivo que cobre as cidades e subúrbios é de tal modo "misturado" ou diversificado que torna os filtros contra a poluição basicamente inúteis. Os filtros vocacionados para nebulosas aumentam o contraste (não alterando o brilho observado). Um "nebula filter" típico permite uma passagem da ordem dos 25 nanómetros, que inclui as linhas verdes H-beta e O III. Isto permite optimizar  observação da maior parte das regiões H II (hidrogénio ionizado, i.e. as nebulosas difusas como M42) e as nebulosas planetárias. Por seu lado, um filtro azul (80A ou 82A) adequa-se a quase todos os objectos que o astrónomo principiante gosta de observar (Lua, Marte e as suas calotas polares, contrastes da atmosfera de Júpiter ou Saturno). (ver informação detalhada, em PT-BR, .PDF, 303KB, fonte: parsec.net.br).

Alguns filtros e suas utilizações na observação planetária (fonte: Scagell, R., Stargazing with a Telescope (3rd edition), Firefly Books, 2009)

Nº Wratten Cor Transmissão * Utilização
8 amarelo ténue 83 Manchas na maior parte dos planetas
12 amarelo intenso 74 O mesmo que o anterior e melhora visibilidade diurna de Mercúrio e Vénus
38A azul intenso 17 Manchas planetárias, detaque para a Grande Mancha Vermelha de Júpiter
80A azul ténue 30 Equivale ao 38A mas destina-se a equipamentos de menor abertura; extremamente versátil
56 verde ténue 53 Particularmente vocacionado para a observação de Marte

* % de luz cuja passagem é permitida pelo filtro


- Nos casos da observação da Lua e de Vénus, extremamente brilhantes, é quase sempre conveniente utilizar um filtro para atenuar a intensidade. Um filtro lunar (lunar filter) é bastante eficiente. Também se pode improvisar utilizando o anel periférico da tampa de protecção do telescópio para reduzir a quantidade de luz captada pelo tubo (se o design se proporcionar), na prática criando uma máscara de abertura.

 
- A visão lateral (também chamada desviada ou indirecta, procurando que a imagem dos objectos observados se forme nas regiões periféricas da retina, onde a sensibilidade é maior do que na mácula) pode, em muitas situações (e.g., cometas, nebulosas, enxames de estrelas), ajudar a detectar pormenores e objectos difusos ou ténues dificilmente observados directamente. Permite ganhar cerca de 2 magnitudes. Outra técnica consiste em abanar (suavemente) o equipamento: a nossa visão é extremamente sensível ao movimento e esta técnica pode ajudar a perceber a presença de objectos no limiar da visibilidade.

- Na observação de objectos do céu profundo (enxames abertos ou globulares, nebulosas, galáxias), evitar a turbulência atmosférica, a poluição luminosa e as noites com Lua. A observação do nosso satélite natural e dos planetas mais brilhantes tolera ambientes com maior poluição, podendo esta última paradoxalmente "filtrar" a imagem e até melhorar o contraste.

- Os céus escuros são os melhores para nebulosas e galáxias. Uma atmosfera estável é fundamental na observação da Lua e dos planetas.

- No céu profundo, como opção, podemos incrementar a ampliação necessária para conseguir escurecer um pouco o background, melhorando o contraste da imagem. Quando se troca a ocular para ampliar um objecto, é mais fácil fazer a focagem nas estrelas adjacentes do que no próprio "alvo" (porque as estrelas são punctiformes e não manchas mais ou menos difusas e texturadas).

- Nas noites frias, proteger a objectiva (refractor) ou a lente correctora (catadióptrico) de eventual condensação. Utilizar um quebra-luz ou protecção na dianteira (idealmente com tamanho equivalente e proporcional à abertura do equipamento) e, em caso de condensação, resolver colocando telescópio no interior de casa ou utilizar secador na intensidade mínima (não esfregar lente e não tapar o tubo nessas circunstâncias).

- Cuidado com o Sol! A sua observação é muito interessante mas exige óbvias precauções relacionadas com a filtragem (há toda uma gama de equipamentos e acessórios especializados). O ideal, em termos de segurança, é projectar a imagem do disco solar.

- O utilizador com óculos pode observar sem estes, ajustando a focagem do telescópio em consonância, a não ser que sofra de astigmatismo (esta disfunção significa que a córnea do olho possui uma curvatura diferente na direcção horizontal relativamente à vertical). A observação com óculos somente permite abranger todo o campo visual, no geral, utilizando oculares de distância focal relativamente ampla (>15mm). Existem oculares wide field (campo mais amplo) que garantem um bom Eye Relief trabalhando com pequenas distâncias focais. Deve estudar-se bem as características dos equipamentos a adquirir e utilizar, em função da qualidade e ergonomia.

- Observar com ambos os olhos aumenta o conforto e reduz a fadiga. Um upgrade opcional é um binoviewer (adaptador binocular). Claro que a utilização deste acessório pressupõe uma duplicação das oculares e exige maior amplitude do focalizador, devido ao maior caminho que a luz percorre. Pelos problemas que coloca na focagem, pode "complicar". Os melhores são construídos com prismas e, de facto, proporcionam uma experiência mais imersiva.

 
Registos

- É interessante manter um registo das observações efectuadas (acervo informativo e enriquecedor da experiência observacional sistemática), identificando local, data/hora (decrescente, de modo normalizado: ANO/MÊS/DIA/HORA; utilizar ainda "data dupla", e.g., "2020, Fevereiro 25/26" e a hora em UT, Tempo Universal ou de Greenwich*. Outro exemplo: "2022 Janeiro 1d 2h 34m 4.8s". Também é usual registar a hora através de quatro dígitos, e.g., 2310, i.e., 23H10m), identificação dos alvos observados na sessão (nº catálogo, designação comum), a transparência (quantidade de luz que a atmosfera deixa passar, reportando a magnitude estelar limite observável a olho nu no zénite) e a estabilidade (o chamado "seeing", que define quão perturbada pela atmosfera é a visão telescópica). Usar sistema coerente nos vários registos. Pode optar-se por uma informação qualitativa simples, utilizando (por exemplo) as variáveis: "excelente"/"muito bom"/"bom"/"sofrível"/"pobre". Não esquecer as especificações técnicas (equipamento, oculares, amplificações usadas, etc.) e outras anotações consideradas relevantes. Os observadores mais dedicados atribuem número de série às suas sessões, para ulterior indexação. Como diz um velho adágio: a qualidade de um observador pode ser avaliada pelos seus registos. De resto, os registos possuem enorme valor pedagógico, ensinando como funcionam as rotinas, quais os procedimentos e metodologia. Constituem um acervo que pode ser consultado e comparado com futuras observações.

* É também comum, alternativamente, usar a Data Juliana, na qual o período nocturno cabe sempre no mesmo dia. O sistema foi gizado por Escalígero (Joseph Justus Scaliger, 1540-1609). Este método conta os dias sequencialmente, começando numa data arbitrária no passado. A origem - que corresponde a 0.0 - é o meio-dia do 1º dia de Janeiro de 4713 a.C. (equivalendo a 24 de Novembro de 4714 a.C. no Calendário Gregoriano, que utilizamos actualmente). Os dias são contados de forma contínua, sem separação em semanas, meses ou anos. O dia tem início ao meio-dia e vai até o meio-dia seguinte. As horas são expressas em números decimais.

- Para classificação descritiva da qualidade da atmosfera, utiliza-se tradicionalmente como referência a
Escala Antoniadi (desenvolvida para a observação dos planetas mas suficientemente versátil) ou a delineada por W. H. Pickering, esta porventura demasiado complexa e quase inexequível. Para a poluição luminosa existe a mais recente Escala de Bortle.

N.B.: a transparência e o chamado seeing podem ser "antagonistas". As noites calmas (com bom seeing) são frequentemente húmidas e por isso menos transparentes. As noites ventosas, com o ar claro e transparente, oferecem amiudadamente boa magnitude limite em detrimento da tranquilidade (as estrelas aparecem mais brilhantes e luminosas mas decerto estarão propensas a "saltar" na ocular sob efeito da turbulência atmosférica). As primeiras proporcionam tipicamente boas condições para a observação dos planetas, as segundas são adequadas aos objectos extensos do céu profundo (deep sky) com menor brilho superficial.

- Complementando os apontamentos, os registos desenhados, esboços ou "impressões de ocular", habitualmente desenhados a lápis em modelos standardizados (exemplo disponibilizado pelo Saguaro Astronomy Club), são interessantes pois promovem a atenção aos detalhes observados. Como o autor Gregg Thompson escreveu: "The best way to learn to see is to draw what you see". A prioridade não é produzir uma representação artisticamente convincente mas sim precisa, com posições relativas e tamanho dos detalhes. Nos sketches de objectos do céu profundo é importante assinalar localização das estrelas de campo, na área do objecto. No final do processo, o esboço pode ser digitalmente invertido, a imagem negativa torna-se extremamente realista. Segundo Bernard C. Abrams, tentar dividir mentalmente o campo de visão em quadrantes promove um posicionamento mais detalhado (in Moore, P. (ed.), The Observational Amateur Astronomer, Springer, 1995, ch.16). Quanto ao Sistema Solar, a maior parte das organizações que coordenam observações amadoras utilizam tamanhos fixos para cada planeta particular (5 ou 6cm de diâmetro, habitualmente), apesar da variação observada ao longo das suas órbitas. É necessário ter em conta que os discos de Júpiter e Saturno são consideravelmente achatados nos pólos, pelo que não se pode simplesmente utilizar um compasso e desenhar uma circunferência. Deve utilizar-se um "template" específico. No caso de Saturno existe a "complicação" das diferentes posições dos anéis. Mercúrio, Vénus e Marte podem ser desenhados em modelos circulares mas mostram fases (mais óbvias nos "interiores" Mercúrio e Vénus, em Marte pode ainda assim ascender a 46 graus). No caso de Vénus não é possível antecipar a aparência da fase com todo o pormenor, pelo que o terminador deve ser desenhado através de observação directa. O efeito de fase é negligenciável nos gigantes gasosos. Materiais essenciais: papel com boa gramagem, lápis (e.g., 2B e 4B), esfuminho e uma borracha macia.

O grande problema é que, inadvertidamente, se tende a desenhar o que se conhece (ou supõe conhecer) e não o que se está a conseguir de facto 'ver'. É uma "armadilha". Detalhes como braços espiralados de galáxias, nebulosas definidas segundo os contornos fotográficos que lhes atribuiram todos aqueles nomes informais, por vezes ridículos. É muito importante manter uma mente "aberta", ainda mais difícil na nossa época assoberbada por espantosas fotografias. A fascinante história dos supostos "canais" de Marte e a prevalência de incontáveis traçados lineares entretanto desenhados por imensos astrónomos amadores nos esboços do planeta (fenómeno que se prolongou até ao descrédito trazido pela publicação das fotografias de proximidade das missões Mariner e Viking) deve constituir um sério aviso relativamente às idiossincrasias do desenhador.


A folha para esboços astronómicos inclui um círculo representativo do campo e visão (para desenhar) e espaço para informações básicas: Objecto (Identificação)/Data/Hora/Equipamento/"EP" (Eyepiece, Ocular)/Filtro/"Seeing"/"NELM" (Naked Eye Limiting Magnitude, a magnitude limite observável a olho nu)/Anotações complementares (crédito: Rony De Laet)

ALPO - formulário para observação de Marte
Detalhe de modelo da ALPO (Association of Lunar & Planetary Observers) para registo das observações de Marte, depois submetidas à Associação. Deve preencher-se informação basica: identificação do observador, data, hora, estimativa do "seeing" e da transparência, equipamento utilizado (nomeadamente eventuais filtros), etc. À direita, delimitação da cratera lunar Plato (Platão). É expediente "obrigatório" começar com os contornos principais do objecto a desenhar.

Marte. Estimativa da intensidade do contraste observado, numerando as zonas para posterior completamento (Richard Baum)

M42. A reentrância constitui a chamada "boca do peixe", com as estrelas do Trapezium no final (observ. c/ refractor f/5, 80 mm, 40x, desenho de Neil Bone)

 
Outros fenómenos observáveis

Fenómenos diversos, seguindo a montagem acima (ilustrações de Michael Roffe, in Henbest, N., The Spotter's Guide to the Night Sky, Usborne Publishing, 1992 (1979)):

- Rastos de vapor de aeronaves resultantes do facto de a atmosfera continuar, em altitudes elevadas, a receber luz do Sol por um curto intervalo. Os cristais de gelo reflectem a luz.

- Luz Zodiacal: cone de luz ao longo da Eclíptica, mais intenso no vértice situado aproximadamente entre 60 e 100 graus do astro-rei. Dificilmente observável (mais facilmente nas regiões tropicais, até à latitude 35º). A Luz Zodiacal e o Gegenschein ("brilho de oposição", retro-espalhamento luminoso no ou próximo do chamado ponto anti-solar, o ponto diametralmente oposto à posição do astro) são fenómenos luminosos relacionados com a presença de partículas encontradas no plano da Eclíptica, de origem cometária (segundo estudos recentes, talvez também com origem no planeta Marte). Observáveis antes do nascimento e após o ocaso do Sol (cerca de 2 horas) quando o Sol está cerca de 20º (em linha recta) abaixo do Horizonte. Exige locais privilegiados com horizonte limpo, sem nuvens ou qualquer tipo de poluição. Em Dezembro e Janeiro, a Luz Zodiacal torna-se invisível devido à "sobreposição" da Via Láctea, em Abril está muito pouco elevada. O ideal é tentar observar na Primavera e Outono.

- Aurora Boreal (ou Austral), fenómeno das latitudes elevadas, resulta por vezes num efeito de cortina origina-se devido à radiação solar (relacionando-se com os seus picos de actividade) nas partículas da atmosfera elevada. As Auroras têm como causa a energia libertada em descargas gasosas quando partículas electrificadas emitidas pelo Sol entram em contacto com as moléculas e átomos da atmosfera. Foi em 1741 que o conhecido físico sueco Anders Celsius verificou a coincidência entre um desvio anormal de uma agulha magnetizada e uma aurora boreal proeminente. A observação destes fenómenos maravilhosos está relacionada com a longitude e latitude magnéticas (em função de um eixo que passa pelos pólos magnéticos e pelo centro do nosso planeta). São observadas mais facilmente na faixa de latitude geomagnética dos 67 graus, com diminuição progressiva tanto na direcção do Pólo como na do Equador. As auroras são mais frequentes nos Equinócios. Em termos espectrais, predomina a linha de emissão verde do Oxigénio ionizado (557.7nm).

- Halo lunar (por vezes mais do que um) rodeando a o nosso satélite natural. Resultante da presença de cristais de gelo na alta atmosfera.

- Na última ilustração, um satélite artificial, habitualmente revelando uma luz contínua e estável  (as luzes não piscam pois os satélites não têm luzes de navegação, somente reflectem luz solar). Avançam pela abóbada até entrar na sombra do nosso planeta, deixando de estar visível a partir desse momento. Observam-se principalmente ao princípio da noite, quando o Sol ainda ilumina estes objectos com altitude mas tudo depende justamente da altitude da órbita e da superfície reflectora do objecto.. A previsão das passagens é facilmente antecipada consultando sites (e.g., heavens-above.com), apps ou bons programas de astronomia c/ elementos orbitais (TLE - Two Line Elements) actualizados.

Visibilidade satélites artificiais
Visibilidade dos satélites artificiais (Menzel, D., A Field Guide to the Stars and Planets, Houghton Mifflin Company, 1964)


Observação (dicas mais específicas, por objecto ou tipo de objecto)

SISTEMA SOLAR

- A observação planetária detalhada exige telescópio e ampliações generosas devido à escassa dimensão angular dos objectos. No caso particular de Vénus (e.g., observar as fases), utilizar opcionalmente um filtro (lunar ou colorido) para mitigar o brilho ou "glare" excessivo do seu disco (elevado albedo, luz reflectida). Marte deve ser observado, preferencialmente, próximo da Oposição, quando a Terra está interposta entre o Sol e o planeta. Júpiter e Saturno também reclamam ampliações acima de 100x para visualização de alguns detalhes. No trânsito dos satélites jovianos, o satélite torna-se invisível mas a sua sombra, escura e nítida, é observada a percorrer o disco do enorme planeta. A observação destes corpos é muito dinâmica, estando dependente em grande medida dos caprichos da nossa atmosfera. Os detalhes mais pormenorizados são vistos de modo transiente, surgem de repente, tornam-se inacessíveis por um período e voltam a aparecer. Na rotação, os vários acidentes da geologia ou atmosfera dos planetas são "arrastados" e obviamente transitam no meridiano. Particularmente para Marte e Júpiter, podemos utilizar o timing dos trânsitos meridianos para acompanhar a rotação das regiões mais conspícuas.


Sequência da aparição dos planetas

Superiores:
Visibilidade vesperina: Oposição - Quadratura Oriental - Conjunção.
Visibilidade matutina: Conjunção - Quadratura Ocidental - Oposição.
Inferiores (Mercúrio e Vénus):
Visibilidade vesperina: Conjunção superior - Elongação Leste - Conjunção inferior.
Visibilidade matutina: Conjunção inferior - Elongação Oeste - Conjunção superior.

- Máxima elongação de Mercúrio, máxima distância entre Vénus e o Sol, oposições de Marte, Júpiter e Saturno (dados até 2050, exportação SkyMap Pro 11, .PDF, 1.39MB)


O movimento "normal" dos planetas, o chamado movimento directo, acontece sobre o fundo de estrelas do Zodíaco de Oeste para Leste. Quando um planeta parece parar e começa a movimentar-se para Oeste (sempre em relação às estrelas) diz-se que chegou à sua primeira estação (parou) e encetou movimento retrógrado (retrogradação). Após algum tempo abranda e "estaciona" novamente, antes de retomar o movimento directo, para Leste. Esta "dança" é somente aparente, efeito de perspectiva que depende da órbita da Terra em torno do Sol.


Diâmetro aparente dos planetas (no seu máximo; nota: Saturno inclui valores para o globo e para o sistema de anéis) e dos luminares no semicírculo exterior (Shaffer, R., Your Guide to the Sky (3rd Ed.), Lowell House, 1999)


Mercúrio Difícil, geralmente pouco elevado e com escassa elongação (i.e. distância relativamente ao Sol). Comporta-se como um "pêndulo", observando-se mais facilmente (vespertino ou matutino) durante os meses de Março, Abril, Agosto e Setembro. Nunca se afasta mais de 26º do Sol. Mercúrio está observável por cerca de 6 semanas na sua elongação Oeste (matutino) e 5 semanas na elongação Leste (vespertino), o seu diâmetro oscila entre 4.5–13″ (segundos de arco), a fase entre quase cheia e um fino crescente. Nas latitudes Norte temperadas, o planeta é mais acessível como objecto vespertino na Primavera e matutino no Outono. O seu disco mostra um diâmetro variável, o maior nas fases crescente e minguante do planeta. Pode ser observado com pequenas aberturas mas exige magnificação mínima de 120x para cabal observação das fases. Devido ao modo como o Equador e a Eclíptica se posicionam, as elongações vespertinas fazem o maior ângulo com o horizonte na Primavera e o menor no Outono. Na observação, o ideal é procurar previamente com binóculo. Encontrado, deverá ser facimente observado também à vista desarmada. Telescopicamente é um objecto difícil, dada a dimensão, escassa elevação habitual e "dispersão" da cor.
Vénus Importantíssimo nos calendários dos povos da Mesoamérica pré-colombiana, o Kukulkán dos Maias, o Quetzalcoatl dos Aztecas, alguns séculos mais tarde. Vénus percorre precisamente 5 revoluções sinódicas (tempo que um astro leva a reaparecer no mesmo local em sucessiva conjunções com o Sol, período orbital aparente desse astro) em 8 anos, daí a importância histórica deste período para algumas culturas do passado, por exemplo na Mesoamérica. Surge como "Estrela da Manhã" ("l'étoile du berger", a "estrela do pastor") ou como "Estrela da Tarde" ("papa-ceia", no Brasil). O planeta está observável por 7 meses em cada uma das suas elongações. A circunstância mais favorável para o observar, no Hemisfério Norte, é quando alcança o periélio em meados de Março. Embora menos brilhante do que estando no periélio em Dezembro, a sua elevação relativamente ao horizonte é muito maior. Planeta possui notável albedo (luz reflectida), a sua atmosfera não permite revelar detalhes da superfície sólida. Observa-se melhor e devolve maior contraste quando o contraste com o céu é menor, ao início da manhã ou ao crepúsculo. Com diâmetro variável (10"-64"), fase "cheia" corresponde ao menor diâmeto aparente. Magnificação de 40x-50x permite observar as fases. Nas imediações da sua conjunção inferior apresenta-nos uma 'falcada' que pode ser observada com binóculos. N.B.: há quem considere vantajoso observar os planetas interiores num céu mais claro, com menor contraste com o fundo, i.e. ainda durante o dia. Filtros amarelos (e.g. Wratten 8 e 12) incrementam a visibilidade diurna de Mercúrio e Vénus.
Marte Pode exibir detalhes da superfície (vale a pena estudar a "saga" dos supostos "canali" de Schiaparelli e as interpretações sequentes, com destaque para a demanda de Percival Lowell, fundador do observatório que tem o seu nome). É, de facto, o único planeta que permite observar uma superfície sólida, não distorcida. Na sua "dança", as órbitas da Terra e do planeta determinam que Marte exiba enorme amplitude no seu diâmetro aparente (3,5"-25"). É pois um objecto que raramente facilita a observação. Utilizar magnificação em torno de 80x (60x nas ocasiões mais favoráveis). Nas condições menos favoráveis não constitui alvo com interesse. Quando bem posicionado e com aberturas entre 80 e 150mm é possível observar calotas polares (ampliação igual ou superior a 120x) e perceber algumas manchas mais escuras (e.g., a região designada Syrtis Major, uma das marcas na sua superfície mais facilmente observáveis com um telescópio com abertura igual ou superior a 150mm). As suas oposições são a melhor oportunidade e acontecem em intervalos de 26 meses. Nem todas são igualmente favoráveis (devido às diversas distâncias Terra-Marte em diferentes circunstâncias). As melhores acontecem somente, em média, de 16 em 16 anos, quando o planeta está próximo ou no periélio (a sua maior aproximação ao Sol). As mais favoráveis ocorrem em Agosto (periélio com longitude 339º), recorrendo em intervalos de 15 e de 17 anos. A posição do planeta relativamente ao Equador Celeste também determina a qualidade com que o podemos observar. Marte movimenta-se para Leste à razão de 20º por mês, mas quando se aproxima da sua oposição recua cerca de 15º em dois meses. É a retrogradação (um efeito deperspectiva causado pela translacção da Terra).
Júpiter Sempre acessível pela sua generosa dimensão. Diâmetro notável (entre 30,5" e 50"). As suas oposições ocorrem sensivelmente um mês mais tarde, cada ano que passa. Globo revela-se com magnficações 30x-40x. Júpiter não apresenta um limbo tão definido e "aguçado" como outros planetas, e este é o "contorno" onde habitualmente se faria a focagem óptica (pode utilizar-se o ponto luminoso de qualquer um dos quatro principais satélites ou uma estrela próxima, para este efeito). As luas descobertas por Galileu são facilmente observadas c/ qualquer binóculo. Uma abertura telescópica mediana e magnificação superior a 100x permite, nas condições de visibilidade adequadas, perceber fenómenos da sua atmosfera (e.g., rotação, "grande mancha vermelha") e o espectacular trânsito das sombras dos seus maiores satélites (observa-se a sombra bem aguçada e contrastada, não o globo do próprio satélite em trânsito sobre o disco, excepto se passarem em zonas com contraste). Há ainda outros fenómenos associados ao sistema joviano (e.g., eclipses e ocultações dos referidos satélites). A atmosfera do planeta é muito dinâmica. As suas características evoluem à razão de 1 grau de longitude (de Júpiter) em cerca de 100 segundos. Há sistemas de referência de longitude relacionados com a rotação do planeta, adequados a diferentes zonas de latitude: o System I diz respeito à região equatorial, até 10º Norte, o System II às latitudes mais elevadas (Norte e Sul), excepto polares. Este segundo sistema é utilizado para a GRS ("Great Red Spot", a Grande Mancha Vermelha). Na observação repetida de determinado detalhe da atmosfera, pode utilizar-se o prognóstico garantido por um período de rotação de cerca de 9 horas e 55 minutos. Apercebemo-nos do movimento, com bom "seeing", em somente cerca de 5 minutos de observação. A GRS recebeu o seu nome em 1879 e é muito instável, na dimensão, cor e visibilidade. Teve fases intensas e intervalos em que dificilmente se observa. Raramente vermelha, deambula entre um laranja pálido, salmão, creme, até branco. Não está, actualmente, muito evidente. Por vezes somente detectada pelo "buraco" ou "dentada" que cria na chamada SEB (South Equatorial Belt). Há outras características interessantes mas de menor dimensão (e.g., os festões ou "grinaldas" e outras perturbações das nuvens). Satélites Galileanos:  I, II e III nunca experienciam o mesmo fenómeno (e.g., trânsito, ocultação) simultaneamente, sendo que quaisquer dois deles o possam (devido aos respectivos movimentos orbitais diários). Júpiter, tal como Saturno, pode ser observado no céu vespertino ao longo de 5 meses do ano e outros tantos no matutino. Nos restantes 2 meses está escondido no brilho do Sol. Percorre aproximadamente uma constelação por ano e a sua rotação é apenas de cerca de 10 horas.
Saturno Maior distância (quase o dobro) e menor magnitude do que Júpiter. Diâmetro aparente: 14,7"-25". As oposições ocorrem sensivelmente duas semanas mais tarde, por cada ano que passa. Magnificação de 50x permite ver a sua mais celebrada característica (os anéis). Todavia, somente acima das 100x-120x se percebe a divisão de Cassini, a sombra no globo do planeta, etc. Conseguir ver a referida divisão é um bom teste às condições de observação e à qualidade óptica. Os dois maiores satélites observam-se com facilidade, sendo Titã claramente mais evidente, Reia é o seguinte, Iapetus tem uma grane amplitude na sua magnitude. Saturno também apresenta um limbo pouco nítido. Todavia, o amplo sistema de anéis compensa e torna-o um alvo com fácil focagem. (As extremidades Este e Oeste dos anéis são designadas ansae, plural de ansa). O planeta percorre apenas 12 graus do Zodíaco por ano. De 15 em 15 anos (em rigor, após intervalos de 13 e 16 anos) os anéis ficam de perfil relativamente a nós, tornando-se então praticamente "invisíveis". Acontecerá novamente, em breve, em Março de 2025 e em Outubro de 2038. Saturno demora cerca de 2 anos e meio a atravessar uma constelação. Pode ser observado no céu vespertino ao longo de 5 meses do ano e outros tantos no matutino. Nos restantes 2 meses está escondido no brilho do Sol.
Úrano Observável como uma estrela à vista desarmada, exige 100x, nas circunstâncias mais favoráveis (diâm. nunca supera 4,2") para entrever um pequeníssimo disco (como uma estrela ligeiramente "insuflada", pálida, esverdeada ou azulada, dependendo de quem observa). As oposições ocorrem sensivelmente quatro dias mais tarde cada ano sucessivo. Para conseguir observar Úrano (e também Neptuno ou qualquer asteróide) é necessário um mapa que abranja estrelas mais ténues do que o próprio planeta ou asteróide.
Neptuno Um simples ponto (aberturas pequenas e medianas), perfeitamente acessível com binóculo conhecendo a sua posição e as estrelas circundantes. O planeta é a "estrela" que não está desenhada no atlas. As oposições ocorrem sensivelmente dois dias mais tarde, por cada ano que passa. Telescopicamente, Neptuno vê-se de cor cinza, azulado utilizando aberturas superiores a 6 polegadas (~15cm).
   

Outro fenómeno a referir, o apulso, corresponde à aproximação estreita a uma estrela ou, em geral, à aproximação (aparente) entre dois astros, e.g., dois planetas aparentam mínima separação angular (conjunção),  Um planeta pode também ocultar uma estrela, o que raramente acontece (com estrelas conspícuas) devido aos modestos diâmetros em presença.
 

Dimensões angulares planetas
O tamanho aparente dos principais planetas observáveis (ampliados cerca de 200x), quando mais longínquos e quando mais próximos (Muirden, J., Astronomy Handbook, Arco Publishing, Inc./ Kingfisher Books, Limited, 1982; imagem aqui rodada 90 graus, sentido anti-horário)

 


Os planetas inferiores (Mercúrio e Vénus) apresentam fases, tal como a Lua. Este esquema representa o seu aspecto e tamanho aparente relativo em sucessivos momentos da órbita (Porcellino, M., A Young Astronomer's Guide to the Night Sky, TAB Books, 1991)


Mercúrio e Vénus observam-se sempre próximos do Sol devido às suas órbitas interiores em relação à da Terra (Jones, B., The Beginner's Guide to Astronomy, Gallery Books, 1987)


O distanciamento (elongação) relativamente ao intenso brilho solar determina a visibilidade de Mercúrio (clicar para ampliar esquema das posições do planeta em relação ao Sol ('Sun') e à Terra ('E'); Nourse, A. E., The Backyard Astronomer, Franklin Watts, Inc., 1973)

Elongações Mercúrio e Vénus (Primavera e Outono)
Elongações dos planetas interiores na Primavera e no Outono (
Muirden, J., Binocular Astronomy, Thomas Y. Crowell, 1979, fig. 10)


Marte: é importante saber quando observar o planeta Marte uma vez que o seu diâmetro sofre enorme variação. No esquema, a dimensão aparente mais próxima, mediana e a mais afastada (Moore, P., New Guide to the Planets, Sidgwick & Jackson, 1993)


- Ver mapa das principais formações marcianas observáveis durante as oposições favoráveis, com orientação adequada para observação telescópica (Vallières, J., Devenez Astronome Amateur (3e édition), Coll. Faire, Québec Science Editeur, Presses d l'Université du Québec, 1987).
Outro mapa (gizado por Sir Patrick Moore, The Amateur Astronomer (12th Edition), Springer, 2006)


Fenómenos dos satélites jovianos, como observados a partir do nosso planeta (Dunlop, S., Astronomy: A Step-by-Step Guide to the Night Sky, MacMillan Field Guides, 1985)

Divisões Atmosfera Júpiter
Divisões convencionais das faixas e zonas da atmosfera de Júpiter (Mourão, R. R. de Freitas, Da Terra às Galáxias: Uma Introdução à Astrofísica (3ª ed.), Vozes, 1982)


A partir do valor da longitude do meridiano central (CM) de Júpiter, lido nas efemérides (habitualmente para as 0H00 UT), é possível conhecer a longitude em graus para o momento do trânsito de determinada característica notável observada na atmosfera do planeta, com a ajuda desta tabela (Barnes-Svarney, P. L., & Porcellino, M. R., Through the Telescope: A Guide for the Amateur Astronomer (Revised and Updated), McGraw-Hill, 2000). Primeiro lê-se nas efemérides (e.g., Nautical Almanac) a longitude para essa data. Para encontrar a longitude do trânsito de determinado "acidente" da atmosfera do planeta procede-se do seguinte modo: multiplica-se o número de horas UT por 36,58 (System I) ou por 36,26 (System II), escolha que depende da latitude do fenómeno. Depois determina-se o número de minutos a partir da tabela. O resultado dá uma aproximação de cerca de 1º. Por exemplo, as efemérides referem 73,3º (0H00) e pretendemos saber a longitude para as 5h30m (hora da observação que fizemos). 5 x 36,58 (System I, neste caso) = 182,9; 30 minutos equivalem ao valor tabelado para 10 minutos x 3, ou seja: 6,1 x 3 = 18,3. Soma-se tudo (75,3 + 182,9 + 18,3) e o resultado serão 276,5º.


Um fio de mira real ou imaginário permite "projectar" o Meridiano, acompanhar e rigorosamente anotar o timing do trânsito das principais características das superfícies ou atmosferas planetárias, nos casos em que a observação de pormenores é exequível (Dunlop, S., Astronomy: A Step-by-Step Guide to the Night Sky, Op. cit., 1985)


A Lua

A Lua Nova nasce e põe-se em simultâneo com o Sol; o Quarto-Crescente nasce ao Meio-Dia e põe-se à Meia-Noite; a Lua Cheia nasce ao pôr-do-sol e põe-se ao nascer do sol; o Quarto-Minguante nasce à Meia-Noite e põe-se ao Meio-Dia. A Lua Cheia nasce em oposição ao ocaso do Sol, portanto o seu comportamento é o inverso do do Sol: mais elevada no Inverso e mais baixa no Verão. A posição em que nasce (que raramente coincide com o ponto Leste geográfico) é importante. Quando a Lua se move para Sul (relativamente ao Equador Celeste), o seu nascimento atrasa cerca de 75 minutos por dia; quando avança para Norte, o atraso é reduzido para cerca de 30 minutos cada dia (verifica-se o inverso no Hemisfério Sul).

Lua - ocasos
O ocaso da Lua acontece mais tarde, noite após noite (Wyatt, Stanley P., Principles of Astronomy, Boston, Allyn and Bacon, 1964, fig. 6.7:1). A Lua desloca-se de dia para dia no sentido contrário do movimento diurno.


- A observação da Lua, suas impressionantes características geológicas e orografia é, há muito, uma actividade acarinhada por muitos astrónomos amadores. Dependendo do ângulo de incidência da luz solar, os acidentes lunares podem ver-se de modo dramaticamente diferente. A melhor observação faz-se entre o Quarto Minguante e o Quarto Crescente (excepto se o objectivo for observar os raios que emanam de algumas crateras, e.g., Copernicus, Tycho, Kepler ou Aristarchus, mais fácil na proximidade ou mesmo na Lua Cheia). É bastante interessante observar nos dois ou três dias após o Quarto-Crescente: visibilidade vespertina, muitas das principais formações geológicas disponíveis e o brilho ainda não é demasiado ofuscante.

É interessante que as sombras das montanhas e orlas das crateras seja acentuada. O ideal é seguir a evolução desde o fino crescente até ao plenilúnio. Num fino crescente, pode observar-se por vezes uma branda luminosidade em toda a região não iluminada do satélite. Essa luz belíssima que conseguimos perceber é, na realidade, o reflexo de um reflexo: a luz do Sol reflecte-se no nosso planeta que a reflecte sobre a Lua, que em parte a devolve. É chamada earthshine em Inglês, lumière cendrée em Francès; em Português encontramos a expressão "luz cinzenta".

A utilização de um filtro lunar é "obrigatória" quando a observação acontece próxima do plenilúnio. Demais, há os eclipses e as ocultações de estrelas ou (muito raramente) planetas.

Foram gizadas escalas para aferir o brilho relativo das diversas zonas e formações geológicas. Uma destas, criada por Beer e Madlow, inclui 10 classificações com gradações do negro (1) ao branco (10). Algumas das formações mais interessantes para observar: Rupes Recta, Rupes Altai, Rimae - Hyginus, Ariadaeus, Boscovich, Triesnecker, Vallis Alpes, Vallis Rheita, Vallis Schröteri e Sinus Iridum.


Longitude selenográfica mediana (aproximada) do Terminador lunar, segundo a chamada idade da Lua (contada em dias a partir do novilúnio), vide coluna à mão esquerda (Sidgwick, J. B., & Muirden, J. (Ed.), Observational Astronomy for Amateurs (4th ed.), Pelham Books, 1982)


A órbita da Lua é ligeiramente (5.15º em média) inclinada em relação à Eclíptica, razão pela qual não temos eclipses (do Sol e da Lua) todos os meses. Nos Eclipses Lunares (como no amanhecer e ocaso do Sol), a propriedade refractiva da atmosfera espalha a cor azul e permite a passagem da vermelha. Resulta daqui o avermelhado que caracteriza os fenómenos mencionados. O eclipse lunar ocorre quando a fase da Lua Cheia coincide com a passagem do satélite pelo plano da órbita da Terra. Este ponto onde a órbita da Lua se encontra com o plano da órbita da Terra chama-se nodo orbital. O disco da Lua pode geralmente ser observado, mesmo quando completamente mergulhado na sombra da Terra. Alguma da luz solar é refractada pela nossa atmosfera conseguindo chegar à superfície do satélite e dando-lhe o tom acobreado característico do fenómeno. Os eclipses penumbrais ocorrem quando a Lua entra na região de penumbra, o que na prática resulta numa pífia variação luminosa. Quando a Lua entra na região da umbra, pode ocorrer um eclipse parcial ou total. A Escala de Danjon (Wikipedia, em Inglês), com 5 níveis "L", permite classificar metodicamente a observação dos eclipses totais. 

Eclipses lunares
Diferentes circunstâncias da passagem da Lua através da sombra ("umbra") e da penumbra da Terra. Trajectória 1: eclipse total na sombra; trajectória 2: eclipse total penumbral; trajectória 3: eclipse parcial na sombra; trajectória 4: eclipse parcial penumbral; De T1 a T7 representam-se os vários 'contactos' do limbo lunar com a sombra (umbra) e a penumbra da Terra, ressalvando que T4, no centro, representa somente o lugar de máximo eclipse. (Guillermier, P., & KoUThmy, S,. (Mizon, B., trans.), Total Eclipses: Science, Observations, Myths and Legends, Springer / Praxis Publishing, 1999 (orig. Eclipses Totales: Histoire, Découvertes, Observations, Masson editeur, Paris, 1998))


Geometria dos diversos tipos de eclipse lunar (Lancaster-Brown, P., Skywatch: eyes-on activities for getting to know the stars, planets & galaxies, Sterling Publishing Company, 1994)


A Lua é um astro especial: o seu generoso tamanho aparente, paralaxe mensurável e rápido movimento sobre o "pano de fundo" do céu propiciam as Ocultações. Nos extremos, a Lua pode afastar-se até 6.5º para cada lado da eclíptica, abrangendo deste modo cerca de 11% da área total do céu (Westfall, J. & Sheehan, W., Celestial Shadows: Eclipses, Transits, and Occultations, Astrophysics and Space Science Library, 410; Springer, 2015). A cada duas horas, a Lua percorre cerca de 1º do Zodíaco (13º por dia). Pode, neste seu percurso para Leste, ocultar qualquer objecto que (aparentemente) se encontre no seu caminho. Durante a primeira metade da lunação, o objecto ocultado desaparece no limbro escuro (circunstância ideal para observar) e reaparece no limbo iluminado; na segunda ocorre o inverso. Crê-se que a primeira observação cronometrada de uma ocultação foi a de Bullialdus (Ismaël Boulliau, astrónomo Francês) em 1623, quando a Lua ocultou Spica. Os "timings" das ocultações permitiram, historicamente, conhecer com detalhe as posições da Lua na sua órbita, bem como o seu contorno com maior detalhe. Estas medições são hoje praticamente obsoletas. Todavia, as ocultações ainda são pertinentes no estudo das estrelas, por exemplo dos sistemas binários.
A descoberta dos ténues anéis de Úrano, em 1977, será recordada como uma das mais espectaculares utilizações de dados recolhidos na ocultação de uma estrela.

As ocultações são muito facilitadas quando o brilho lunar não é demasiado intenso, longe do plenilúnio. Particularmente interessantes quando acontecem no limbo não iluminado, ao entardecer (com o belíssimo reflexo da luz do nosso planeta) e mostrando a Lua um fino crescente (falcada). A estrela ocultada "apaga-se" repentinamente (porque a Lua não possui atmosfera tangível) e, mais tarde, reaparece ou emerge (ingresso e egresso, respectivamente). O espectáculo reveste-se de uma "beleza austera" (R. Boninsegna e J. Schwaenen) sendo particularmente apelativo quando envolve as Plêiades ou outro enxame conspícuo situado próximo da Eclíptica.

   Ocultação
Os observadores em diferentes locais geográficos não vêem a ocultação em simultâneo. Na ilustração da esquerda, enquanto o observador A observa a Lua a uma determinada distância da estrela, o observador B já observa o momento da ocultação no limbo lunar não iluminado (Ronan, C., The Practical Astronomer, Pan Books Ltd., 1981). Ilustração da direita explica como a ocultação é observada em diferentes pontos geográficos ao longo da faixa abrangida. No ponto 4 é "rasante" e acontece no limbo escuro (ver inset), permitindo visualizar o revelo lunar (ilustr. Helmut Wimmer in Chartrand, M. R., Amateur Astronomy Pocket Skyguide, Newnes Books, 1984; editada)


Como referido, no momento da ocultação a estrela "apaga-se" repentinamente. Mas se se tratar de uma estrela dupla este processo pode prolongar-se e ser medido, sendo contudo um intervalo brevíssimo (fracção de segundo). No caso (raro e imperdível) de um planeta, processo pode demorar algumas dezenas de segundos, dependendo do diâmetro angular do planeta ocultado.

Observação é mais fácil quando o limbo está na sombra (o ocidental entre a Lua Nova e a Lua Cheia; o oriental entre a Lua Cheia e a Lua Nova). A maior parte das observações é de "desaparecimentos", observados na primeira fase da lunação, i.e. no limbo não iluminado ao entardecer, pois é mais fácil em termos de timing e a observação do "eclipse" de um astro visível é sempre mais acessível do que o "reaparecimento" de algo ocultado. Para verificar o momento exacto utiliza-se, tradicionalmente, um cronómetro. Activado no momento fundamental, é depois parado em simultâneo com um qualquer sinal de referência (e.g., rádio, serviço horário telefónico). A contagem do cronómeto é então subtraída à hora em que foi desligado. As ocultações "rasantes" são um caso particular. Acontecem quando o limbo polar da Lua passa tangente a uma estrela. São usadas para estudar o perfil do limbo lunar. A observação competente exige o registo do ângulo de posição, ângulo da cúspide (entre o final, ponto mais aguçado, mais próximo do Terminador e o ponto do limbo lunar onde o fenómeno se vai verificar) e timings rigorosíssimos.


Dois esquemas exemplificando, respectivamente, a determinação do ângulo da cúspide e a do ângulo de posição nas ocultações (Martinez, P. (ed.), and Dunlop, S. (trans,), The Observer's Guide to Astronomy, vol.1, Cambridge University Press, 1994)

 
- Ainda no Sistema Solar, refira-se a possibilidade da observação de Asteróides, Cometas e das chamadas "Chuvas de Meteoros"

Os Cometas são corpos planetários híbridos, acreditando-se que possuem um núcleo interno rochoso, coberto por uma camada de gelo ou por um aglomerado de gelo e fragmentos de rocha. A origem da maioria situa-se na distante Nuvem de Oort, a teorética e enorme concha de materiais residuais da formação do Sistema Solar. São "sobras" da formação do Sol e dos planetas. Em termos cinemáticos, as suas órbitas revelam enorme amplitude nas excentricidades e nas inclinações relativamente ao plano da Eclíptica..

  
As órbitas possíveis dos cometas são três curvas que se podem obter por meio de secções convenientemente feitas num cone de revolução. O diagrama mostra graficamente a semelhança das três curvas (elipse, hipérbole e parábola) quando próximas do foco ocupado pelo Sol (Olcott, W. T., Olcott's Field Book of the Skies (revised by R. Newton Mayall and Margaret W. Mayall), 4th Edition, Putnam's Sons, 1954 (1929)). À direita, a cauda de um cometa, ionização provocada pelo vento solar, aponta sempre na direcção oposta (Moore, P., The Amateur Astronomer (9th Edition), Lutterworth Press, 1978)


Descritos como "bolas de gelo sujas", ganham as suas características distintivas quando estimulados pela acção do vento e calor solares. A distante "Nuvem de Oort", nos confins do nosso sistema, aloja cometas gravitacionalmente pouco ligados ao Sol que qualquer perturbação lança na direcção do Sistema Solar interior. A aparência dos cometas altera-se em função do seu percurso de aproximação e afastamento em relação ao Sol. A cauda de um cometa aumenta de tamanho na aproximação ao Sol e encurta à medida que se afasta. O equipamento a utilizar na sua observação depende das características e magnitude de cada objecto. O período de visibilidade (quando se verifica) é habitualmente curto e confinado ao amanhecer e ao crepúsculo. Habitualmente exigem céu escuro pois parecem quase sempre ténues "bolas de algodão".

A utilização dos chamados "binóculos gigantes", de grande abertura, fixados numa estrutura ou tripé, é muito comum entre os "caçadores" de cometas. Para encontrar esses alvos tão imprevisíveis é necessário, para além do equipamento óptico, um bom atlas (analógico ou digital). Os cometas são objectos difusos e a classificação do seu brilho é sempre relativamente vaga. A varredura do local onde é suposto estar um objecto é mais fácil num equipamento com montagem altazimutal. A observação deve acautelar a altura, a distância do Sol e o contraste (se o céu está ou não suficientemente escuro). Uma vez encontrado, devemos registar uma estimativa da sua magnitude e o aspecto (aparência e dimensões da coma e do núcleo, se possui ou não cauda, e na afirmativa qual a sua extensão aparente) Numa sequência de observações confirma-se o percurso do "viajante".


Na tradicional (e obsoleta) detecção de novos cometas, os campos visuais deviam sobrepor-se minimamente. (Barnes-Svarney, P. L., & Porcellino, M. R., Op. cit., 2000). Hoje em dia, as buscas são sistemáticas e incomparavelmente mais sofisticadas, automatizadas e tecnológicamente assistidas (mesmo os amadores utilizam instrumentação de recolha digital de imagens) e já em meados do século passado a maioria dos cometas eram descobertos "acidentalmente" nas placas fotográficas dos observatórios Palomar, Lick e Lowell. A maior parte das descobertas amadoras de cometas acontece, por norma, numa região interior à órbita de Marte, onde os objectos revelam maior brilho. Nessa circunstância geralmente não possuem cauda, pois estão ainda a grandes distâncias e a cauda aponta na direcção oposta ao Sol. De resto, esta somente se desenvolve na proximidade da estrela. A procura acontecia antes do nascer do Sol e após o seu ocaso. A ilustração acima exemplifica o padrão de busca óptica tradicional. De manhã: começo cerca de 3 horas antes do Sol nascer, na sequência acima esquematizada; de tarde: começo 1 hora depois do ocaso, a partir do horizonte e subindo até à altura de 45 graus.

 
Saliente-se que o cometa "típico" não é comparável ao das fotografias mediáticas. Muito provavelmente vê-se apenas um "blob" ténue com alguma condensação central, talvez um pouco alongado numa direcção. Quando concentrado e pequeno, exige uma ampliação de cerca de 75x. Exige-se céu escuro mas, como sabemos, são habitualmente observáveis somente no céu crepúscular (escassa elongação) e consequentemente apresentam elevações modestas relativamente ao horizonte.

Actualmente, instalações ultra-sofisticadas, observatórios e equipagens profissionais (ZTF, Pan-STARRS, NEOWISE, etc.) ganham obviamente vantagem na detecção incidental e muito precoce de novos objectos, incluíndo cometas. A época áurea dos amadores ópticos (desde Messier ou Pons a Honda, Seki, Ikeya, Peltier, Mrkos, Bradfield, Alcock) já pertence ao passado. Há, todavia, amadores que colaboram na detecção a partir de imagens recolhidas por satélites ou outras equipagens profissionais e alguns já foram descobertos, por exemplo, ao escrutinar fotografias do arquivo (acessível em linha) do SOHO ("Solar and Heliospheric Observatory"), um observatório espacial dedicado ao estudo do Sol.

A "poeiras" e resíduos dos cometas estão na origem da maior parte das minúsculas partículas que despois observamos como meteoros ou como a esquiva luz zodiacal.


- Os Asteróides são o material disperso de um "planeta" que nunca se consolidou devido às forças gravitacionais de Júpiter e Marte. Por isso são encontrados em grande número na chamada "Cintura de Asteróides", no intervalo entre as órbitas desses dois planetas. Nos equipamentos modestos, a sua observação nunca devolve imagens espectaculares devido ao escasso diâmetro. Na sua oposição, um asteróide desloca-se cerca de 1/4º por dia relativamente ao fundo de estrelas. Para o amador, o interesse reside na identificação relativamente ao fundo de estrelas e não na sua aparência telescópica. Exige um atlas com magnitude detalhada para conseguir distinguir o planeta menor entre as estrelas. Ceres, Pallas, Juno e Vesta são os maiores.


A ocultação de estrelas por asteróides permite, coligindo a informação das durações do fenómeno medidas por observadores em diversas latitudes, determinar aproximadamente a forma dos asteróides envolvidos. Foi um método privilegiado. O esquema desenha as linhas que indicam as diversas durações registadas na ocultação da estrela I Vulpeculae por Pallas, ocorrida em 29 de Maio de 1983 (Newton, J., & Teece, P., Op. cit., 1995)


- Meteoros
- Aristóteles refere a queda de um meteorito em Aegospotami (Meteor., 344b32-4), pequeno rio no Helesponto (actual  Dardanelos). Trata-se de uma ocorrência que se supunha na época ter sido - imagine-se - prevista por Anaxágoras (e.g., Diog. Laert., ii, 10), talvez devido à sua descrição dos corpos celestes como pedras ígneas. Giovanni Schiaparelli (1835-1910) demonstrou que os meteoros são membros do Sistema Solar e orbitam em torno do Sol. Ademais, apontou que em alguns casos as suas órbitas coincidiam com as de cometas conhecidos, estabelecendo uma relação importante. Esta esteve intimamente relacionada com a observação de uma espectacular "chuva de estrelas" (v. infra), as Leónidas de 1866.

Quando um meteoróide entra na nossa atmosfera é chamado "meteoro". Estes são, na maioria dos casos, pequeníssimos, como grão de arroz, e tornam-se incandescentes e visíveis por volta dos 100 quilómetros de altitude. Meteoros anormalmente lentos e brilhantes (por definição, mais brilhantes do que os planetas, magnitude -4 ou superior) são chamados "bolas de fogo". Se forem ainda mais brilhantes e "detonarem" são, usualmente, chamados "bólides". Fragmentos de meteoros que resistiram e chegaram ao solo são chamados "meteoritos". A velocidade dos meteoros depende do seu movimento relativamente ao nosso planeta. São mais comuns após a meia-noite e antes da aurora, pois é este o lado da Terra que se dirige para os enxames (v. imagem seguinte, in Mourão, Ronaldo R. de Freitas, Op. cit., 1982).

Meteoros - observabilidade

Os Meteoros são corpos rochosos ou metálicos que atingem a atmosfera terrestre. O atrito faz com que deixem um rastro luminoso. São classificados em três tipos principais: sideritos (metálicos), siderólitos (mistos) e aerólitos (rochosos). Os fragmentos que caem no solo terrestre são chamados 'meteoritos'.

Bola de Fogo
Ilustração de "bólido" a desintegrar-se na atmosfera provocando assinalável clarão e estrondo (R. N. Mayall et al., Op. cit., 1985)


Chuvas de Meteoros - o nosso planeta atravessa anualmente, de modo previsível, diversas de cinturas de poeiras e detritos. Estas pequenas partículas, quando em contacto com a nossa atmosfera, ocasionam pequenas ignições designadas informalmente como "estrelas cadentes". As referidas "cinturas" foram originadas pelo desgaste ou esboroamento de cometas ou asteróides nas suas anteriores passagens orbitais.

É necessário conhecer a data e a localização do radiante, ponto de onde parecem emanar os meteoros (este desloca-se com maior ou menor amplitude ao longo dos dias em que a respectiva "chuva" se observa). Atenção: o radiante é apenas um ponto de referência, não se passa nada aí; é em redor que se deve observar. Os meteoros observam-se em redor do radiante a uma certa distância (~40º). A expressão "chuva" é enganadora, raramente o ritmo ultrapassa uma unidade por minuto. Foi G. Schiaparelli quem, no séc. XIX, primeiro chamou a atenção para a relação destes fenómenos com a trajectória dos cometas. A observação do fenómeno pode revestir-se de espectacularidade se as condições o permitirem. Comparados com os meteoros esporádicos, os meteoros integrados numa "chuva" tendem a surgir com velocidade e cor similares entre si.

Ver ilustração (no mínimo algo fantasiosa) de uma "chuva de estrelas cadentes" observada na noite de 12 para 13 de Novembro de 1833 (in Celoria, Giovanni, Atlante Astronomico (Tavola XXVI); Milano: Ulrico Hoepli, 1890).

A contagem dos objectos é uma das actividades úteis (rácio por Hora Zenital - a quantidade de meteoros que seriam observados se emanassem do zénite; utiliza-se um factor de correcção). A observação destas "chuvas" deve resultar no traçado das trajectórias num mapa, determinando assim o ponto central. Olhar directamente para o radiante não é a melhor técnica para observar meteoros. É mais fácil detectá-los observando as regiões em redor. Os meteoros emanados de um radiante já conhecido devem ser observados escolhendo áreas a cerca de 10-15 graus do radiante. O observador deve fazer intervalos de meia em meia hora, para conseguir manter concentração. Alguns objectos incomuns possuem dimensões apreciáveis, podendo iluminar uma boa parte da abóbada celeste: são os chamados "bólides" ou "bolas de fogo".

Meteoros - registo num mapa
Registo dos percursos. Neste tipo de carta, deviam aparecer como arcos. Todavia, marcando correctamente o início e o final da observação, os trajectos reais podem ser facilmente extrapolados. Os que dimanam do círculo pertencem. em princípio, à mesma "chuva", posição teorética do chamado radiante (Ronan, C. (CE), & Dunlop, S., The Golden Book of Astronomy, Western Publishing Company, Inc., 1984 (1979))

meteoro - percurso aparente e real
Trajecto real (AB) e trajecto aparente (AC) de um meteoro (
Muirden, J., The Amateur Astronomer's Handbook, (3rd ed.), Harper & Row, 1983, fig.51)


- Principais "Chuvas de Meteoros" (designação relacionada com a localização do respectivo radiante):

Quadrântidas (radiante em Bootes)- Jan. 3-4 - intensa, com meteoros velozes;
Eta Aquáridas - Mai. 5 - Meteoros velozes;
Delta Aquáridas - Jul. 27 - mais intensa do que a "chuva" que ocorre em Maio;
Perseidas - pico 9-13 Agosto - observável por diversas noites em torno deste intervalo. Eram popularmente conhecidas como "Lágrimas de São Lourenço", do diácono martirizado pelos romanos e celebrado a 10 de Agosto. Tẽm origem nos resíduos deixados pelas passagens do cometa Swift-Tuttle; o seu radiante descreve um arco de 3º-4º, entre Perseus e Cassiopeia, de finais de Julho a meados de Agosto;
Oriónidas - Out. 20- "chuva" composta por meteoros lentos, de cor amarelada;
Gemínidas- Dez. 14 - "chuva" rápida e brilhante.

N.B.: habitualmente é também referida a estimativa do nº de meteoros que um observador poderá ver durante 1 hora em condições ideais: ZHR (zenithal hourly rate)

Metoros - rácio ao longo do ano
Relação de meteoros observados ao longo do ano (Muirden, J., Binocular Astronomy, Thomas Y. Crowell, 1979, fig. 19)


- Observação do Sol

Deixamos para o final das referências ao Sistema Solar uma observação óbvia mas especializada: a do Sol, estrela intimamente relacionada com os fenómenos da nossa atmosfera e a única que podemos estudar de perto. Uma gigantesca "fornalha"! No seu interior, átomos de hidrogénio são comprimidos, sob a enorme pressão da gravidade, resultando hélio e libertação de energia. A energia é produzida porque a massa de quatro núcleos de hidrogénio é maior do que a massa do núcleo de hélio resultante (i.e., resta massa no processo de fusão nuclear, que obedece à proporção referida).

tubo improvisado para observação solar   Binóculo c/ filtros AstroSolar
Um simples tubo improvisado para observação solar, por projecção. Utiliza um pequeno orifício na abertura frontal e um pedaço de papel (papel vegetal, lenço de paper) como pequena "tela" (Harrington, P., Eclipse!, John Wiley & Sons, 1997). À direita, binóculo com protecções feitas c/ filtro
AstroSolar (da Baader Planetarium) para observação solar directa (foto do A.)


O Sol é dinâmico e há sempre fenómenos a acontecer. Disponível facilmente, deixa de existir o problema da poluição luminosa, pois é de dia! Todavia, a observação Solar deve acontecer SEMPRE com utilização de equipamentos (e.g., telescópios ou filtros) especificamente concebidos ou adaptados para esse efeito (ATENÇÃO: nunca utilizar os antigos filtros de ocular, absorvem a luz magnificada e tornam-se perigosos. A intensidade da luz solar deve ser atenuada ANTES da entrada no sistema óptico). É comum diafragmar a objectiva quando a abertura supera 50mm.
Os filtros actuais são de dois tipos: os de luz branca e os sofisticados Hydrogen-alpha, que permitem observar as proeminências solares (estes últimos mostram o Sol num comprimento de onda específico (656 nanómetros). Este comprimento revela as turbulências invisíveis através da observação "normal" com filtros de "luz branca").

Como veremos, através da observação das manchas podemos avaliar o período de rotação da estrela, que é mais rápido na região equatorial. Nos raros eclipses totais do Sol, pode observa-se a sua espectacular coroa (corona, um envoltório luminoso, a camada mais larga e externa da atmosfera do Sol) e as fáculas (manchas brilhantes).


Equipamento óptico exclusivamente Solar: Coronado P.S.T. (www.meade.com). Estes telescópios proporcionaram uma autêntica "revolução", incorporando os adequados filtros H-Alpha

A simples observação do pôr-do-sol é deslumbrante e interessante enquanto fenómeno atmosférico. Os raios luminosos desviados pela refracção da atmosfera determinam que os objectos apareçam mais elevados do que estão na realidade O Sol e a Lua parecem achatados quando próximos do Horizonte. Assim, a refracção faz com que vejamos um pouco abaixo do horizonte, a imagem do Sol é "espremida" verticalmente (mas não horizontalmente), de baixo para cima, gerando o efeito achatado do globo. A luz avermelhada no ocaso e no orto deve-se à espessura da atmosfera, sendo aqui espalhada luz vermelha e não somente a azul que associamos à habitual cor do céu.


A refracção atmosférica faz com que o Sol continue visível alguns minutos depois de, na realidade, já estar na posição B, abaixo do Horizonte (Ronan, C., Op. cit., 1981)

 
As Manchas Solares são resultado do magnetismo solar, fenómenos temporários na fotosfera do Sol, aparecem como manchas mais escuras do que as áreas circundantes, indicadoras das erupções solares que causam, no nosso planeta, o fenómeno das Auroras Boreais (e Austrais). Constituem regiões de temperatura superficial reduzida e submetem-se a um ciclo de aproximadamente 11 anos, relacionado com o equilíbrio do campo magnético da estrela. Esta periodicidade relaciona-se alterações na actividade solar (observando-se mais manchas, fáculas e protuberâncias). Aos períodos de máxima actividade chama-se "Sol Activo". "Sol Calmo" designa os de menor actividade. O número de manchas observadas na fotosfera é um indicador pertinente. Estas surgem quase exclusivamente nas imediações do equador solar (numa faixa entre +35 e -35 graus). Devem ser observadas, se possível, numa periodicidade diária, para obter uma estatística mensal com posições registadas numa grelha do circulo solar. A sua contagem obedece a metodologia específica (ver artigo de Carlos Alberto Colesanti (REA/SP), .PDF, 963KB).

- Manchas solares actualmente visíveis (SpaceWeatherLive.com)

Observação do Sol - orientação cardeal consoante método usado
Orientação cardeal do Sol recorrendo a diferentes métodos, a saber (seguindo sequência dos esquemas): olho nu, inversão telescópica, projecção, observação por detrás de ecrã transparente, usando prisma diagonal lateral e, por fim, usando diagonal a partir do topo (Norton's Star Atlas and Reference Handbook (Seventeenth Ed.), Longman Scientific & Technical, 1986, fig. 10)


Acompanhando qualquer pormenor na superfície do Sol, percebe-se que o astro possui um movimento de rotação que no seu equador ascende a cerca de 27 dias. Esse valor aumenta com a latitude.

              manchas solares - componentes
A observação sistemática das manchas solares permite visualizar a rotação do Sol, de Leste para Oeste; à direita, as componentes principais: sombra, penumbra e ponte ("bridge"); (Newton, J., & Teece, P., Op. cit., 1995)

manchas solares - movimento
Movimento aparente das manchas solares em diferentes épocas do ano. Diagrama adequado à observação telescópica invertida, a partir do Hemisfério Norte. Linha vertical a traço interrompido representa círculo horário. (Ridpath, I. (ed.), Norton's Star Atlas and Reference Handbook (19th Edition), Addison Wesley Longman, 1998, p.82)


Por uma questão de segurança, com equipamentos comuns, a observação deve ser feita pelo método de projecção. Apontar o instrumento deve ser feito, indirectamente, segundo o método da sombra mínima (ou seja, observando a sombra solar mais pequena que o telescópio projecta no chão). O equipamento comum não deve estar apontado ao Sol mais de 10 minutos de cada vez, sob pena de ficar danificado devido à elevada temperatura. A observação directa apenas pode acontecer com a utilização de filtros ou filmes solares que apenas permitam a passagem de 0.001% da luz.

Método de projecção SolGrelha registo manchas solares
Observação das manchas solares: ilustração do método de projecção com reflector e com refractor, respectivamente. Repare-se na utilização de anteparo de sombra e, obviamente, da placa de projecção (Mayall, R. N., et al., The Sky Observer's Guide, Op. cit., p.68); à direita, uma grelha simples de registo (Muirden, J., Astronomy Handbook, Arco Publishing, Inc., 1987). Num patamar mais rigoroso, utilizam-se os chamados "discos de Stonyhurst" (um conjunto c/ grelhas adequadas à latitude do disco solar, Bo, variável ao longo do ano) para uma determinação precisa das longitudes e latitudes heliográficas das manchas; ver exemplo indicando os períodos adequados à sua utilização (fonte: British Astronomical Association)


Foram gizados sistemas de classificações para as manchas solares, inicialmente por Max Waldmeier (em 1938 e 1955, a chamada "Classificação de Zurique"), de acordo com tamanho, complexidade, evolução, morfologia, bem como presença/ausência de penumbra. McIntosh (1990) optimizou esta classificação para descrever a relação com as erupções solares e melhor acomodar as principais caracterís
ticas das manchas observadas (classe, tamanho, complexidade, etc.). Ver exemplos representativos no contexto da classificação avançada por Waldmeier (Carrasco, V., et al. (Solar Phys. 290, 1445, 2015)


Eclipses do Sol...

Tipos de eclipse solar
No Eclipse Total, a sombra (umbra) toca a superfície do globo terrestre. No Eclipse Anular, o cone de sombra é demasiado curto e não toca o globo terrestre; no Eclipse Parcial, somente a penumbra alcança a superfície terrestre (
ilustr. Helmut Wimmer in Chartrand, M. R., A Field Guide to the Heavens, Golden Press, Western Publishing Company, Inc., 1982)

O Eclipse Total - guia para um evento raro e dramático

"O dark, dark, dark, amid the blaze of Noon,
Irrecoverably dark, total eclipse,
Without all hope of day!"
(Milton, Samson Agonistes, 80-2)


O tamanho aparente do Sol e da Lua coincidem. É, de facto, uma das grandes coincidências da natureza que a Lua seja 400 vezes mais pequena do que o Sol
, estando cerca de 400 vezes mais próxima de nós.

Contactos
Contactos durante um eclipse. Observar a direcção do movimento  (Skilling, W, T, & Richardson, Op. cit., 1951)

Os eclipses solares podem ser totais, anulares ou parciais, dependendo de como o Sol, a Lua e a terra estão alinhados. Quando a Lua e a Terra estão mais próximas (no perigeu), dá-se um eclipse total. Se a Lua estiver mais distante (no seu apogeu), será anular. Se os três astros não estiverem exactamente alinhados, o eclipse será parcial. Para muitos, o Eclipse Total do Sol é o espectáculo mais poderoso que a Natureza nos oferece. Acontecem devido à quase coincidência dos diâmetros aparentes dos luminares. Um resumo das suas fases (adaptado de Maunder, M., & Moore, P., The Sun in Eclipse, Springer-Verlag London Limited, 1998, pp. 53-7):

- Um pequeno entalhe surge no limbo solar (não havendo, todavia, diminuição verificável brilho até metade do Sol estar eclipsado. Nesta fase gradual (pré-totalidade), quando o brilho e o calor decrescem, podemos observar planetas como Vénus ou Júpiter (se estiverem favoravelmente localizados). ATENÇÃO: até ao início da 'Totalidade', a observação solar deve ser protegida por filtros adequados.

- Quando o disco solar estiver reduzido a um fino crescente, se estivermos junto de uma árvore podemos observar no solo pequenas sombras em "crescente" (intervalos entre as folhas actuam como câmaras estenopeicas ou "pinhole").

- As chamadas "gotas de Baily" são observadas com maior facilidade imediatamente antes da totalidade. Como a superfície da Lua é rugosa e acidentada, a luz passa pelos vales no seu limbo, sendo bloqueada nas zonas elevadas. São sempre observadas.


As etapas mais emocionantes de um eclipse total do Sol. Por ordem, as chamadas "gotas de Baily" (luz solar através das rugosidades do limbo lunar), o efeito do "anel de diamante" e, por fim, a espectacular "corona", a coroa solar e eventuais proeminências. Num eclipse anular não se observa a "corona", somente um fino anel (fonte: R. N. Mayall et al., Op. cit.)


- Por vezes, veêm-se algumas faixas de sombra no solo ou em paredes de edifícios, fenómeno atmosférico nem sempre observável. Com a aproximação da totalidade, a sombra da Lua avança rapidamente pelo terreno até nos "engolir". O efeito de "anel de diamante" acontece mesmo antes do segundo contacto (quando a Lua se sobrepõe plenamente), último brilho visível, combinado com o finíssimo aro da cromosfera interior. Dura somente alguns segundos. Desaparecendo, a chamada corona (coroa) começa a estar visível rodeando o interposto disco lunar. Um "esplendor"! 

- TOTALIDADE! Acontece de modo muito súbito. O céu escurece, a temperatura baixa, a Natureza reage, ludibriada pelas inesperadas trevas. O contraste do céu depende das condições atmosféricas, podendo, muitas vezes, ser observadas estrelas e planetas nesta fase. No Sol, observa-se a Cromosfera e eventuais proeminências. Neste intervalo espantoso, a corona irradia luminosidade equivalente à da Lua Cheia, o que significa que a observação desprotegida é segura. Podem observar-se ainda as estrelas mais brilhantes, planetas, satélites artificiais (fora do caminho central da sombra da Lua), para além dos fenómenos atmosféricos e das alterações na natureza envolvente. Todavia, cuidado! A totalidade termina rapidamente.

- Terceiro contacto. A totalidade termina, há um breve surgimento do "anel" já referido. A Natureza "acorda" rapidamente, em poucos segundos, parece que nada aconteceu!

- Quarto contacto: o Sol fica de novo completamente desobstruído.


Um eclipse total do Sol é observado parcialmente numa vasta área mas totalmente apenas ao longo de uma estreita faixa que em largura (quase) nunca ultrapassa 270 quilómetros (Mosley, J., Stargazing witth Binoculars and Telescopes..., Lowell House, 1998)


Para além do Sistema Solar...

- Cor das estrelas: durante a observação, desfocar a imagem ligeiramente permite uma melhor percepção das subtilezas cromáticas.

- Sistemas Estelares Binários (e Múltiplos). Muitas estrelas estão gravitacionalmente ligadas, partilhando um centro de massa. Estes pares são as estrelas binárias. A primeira descoberta documentada de uma dupla aconteceu em 1650 por Giovanni Battista Riccioli (Motz, L. & Nathanson, C., The Constellations, Doubleday, 1988, p.34). Trata-se da companheira de Mizar (Zeta Ursae Majoris), a somente 15" (não confundir com Alcor, que não pertence ao sistema). Hoje sabemos que a maior parte das estrelas habita em sistemas duplos e múltiplos, por vezes complexos e intrincados. Nas binárias de eclipse, o plano orbital da estrela mais ténue fica na nossa linha de visada, determinando uma redução periódica do brilho do sistema. Por outro lado, determinados pares próximos constituem somente uma coincidência relativamente ao observador terráqueo. São chamadas binárias ópticas.

A precisão da óptica e o poder separador (ou resolvente) do equipamento é decisivo na observação destes sistemas duplos (i.e. múltiplos). Os bons refractores são privilegiados (tal como na observação planetária). A observação visa, acima de tudo, registar o ângulo de posição e a separação dos componentes (também as cores, reveladoras da situaçao física e idade das estrelas). Os componentes designam-se, geralmente A, B, (eventualmente continuando em C, D, etc.), começando na estrela principal, habitualmente a mais brilhante. Na prática, a observação deve começar com ampliação mediana, aumentando sucessivamente até "resolver" ou "separar" o sistema. Uma técnica para conseguir observar a componente mais ténue  é utilizar uma máscara (hexagonal ou em cruz) adiante da objectiva ou abertura, provocando assim "raios" de difracção. Num dos intervalos entre estes "raios", a segunda estrela pode ser visualizada. A partir de um número elevado de observações de um mesmo sistema, pode coligir-se um conjunto de distâncias aparentes em diferentes ângulos de posição e assim revelar detalhes orbitais do sistema.

Máscaras difracção
Estratégias clássicas para separar duplas difíceis (
colocando máscara na objectiva e provocando efeitos de difracção teoricamente facilitadores da observação): 1 e 2 quando a componente A impede a observação da ténue componente B; no exemplo 3, quando ambas as estrelas são equivalentes em brilho (Muirden, J., How to Use an Astronomical Telescope, Linden Press/Simon & Schuster, 1985)


As duplas (ou múltiplas) mais interessantes são aquelas em que ambas as magnitudes se aproximam, para além do eventual contraste cromático. O experiente Alan Adler afirmou em Julho de 2006 (Sky&Telescope) ter chegado à conclusão de que a melhor ampliação para observar duplas corresponde à divisão de 750 pela separação do sistema (em segundos de arco). Por exemplo, para Eta Cassiopeiae (separação de 12.5") será:  750/12.5 = 60x.

A ferramenta analógica de eleição do observador de duplas é, tradicionalmente, o micrómetro filar, uma ocular especializada utilizada para realizar medidas astrométricas. Possui dois filamentos: um deles fixo, outro ajustável (através de uma espécie de parafuso) para medir com precisão (numa escala graduada) a separação de duas estrelas (ver imagens seguinte; fontes: Newton, J., & Teece, P., Op. cit., 1995; Scagell, R., City Astronomy, Sky Publishing Corp., 1994). Quando um micrómetro é calibrado, a relação entre a escala e as distâncias angulares reais somente se aplica nesse instrumento e ocular específicos.

   Filar - eixos

- Variáveis: as estrelas são variáveis quando revelam flutuações periódicas no seu brilho, por razões intrínsecas (alterações físicas na estrela e sua atmosfera) ou extrínsecas, porque são eclipsadas num sistema. A sua observação consiste principalmente na estimativa das magnitudes, tradicionalmente utilizando uma sequência (estrelas com magnitudes bem estabelecidas) e cartas de comparação normalizadas (e.g., as da AAVSO). Desenha-se um gráfico com a curva das magnitudes observadas. O rigor (possível) é conseguido a partir das referências estelares para comparação, intervalando o brilho observado. É uma operação muito vulnerável à absorção atmosférica, brilho intrusivo, defeitos da óptica ou equívocos do próprio observador. O método "fraccional" de determinação da magnitude de uma variável consiste em comparar a estrela com duas outras (e.g., A e B), sendo uma mais e outra menos brilhante. Obtido este intervalo, estabelece-se a razão da luminosidade relativamente a cada uma. A notação é a seguinte: "A 1 V 1 B" (começa-se sempre pela estrela mais brilhante, que seria a "A", neste caso). Neste caso, a variável "V" apresenta uma magnitude intermédia entre as de A e B. Se, todavia, se perceber que a variável é 2/3 mais ténue do que A e 1/3 mais brilhante do que B, anota-se "A 2 V 1 B". E assim sucessivamente, adequando a cada caso. Hoje em dia é possível ao amador dedicado abandonar os métodos tradicionais e fazer medições espantosamente rigorosas utilizando tecnologia CCD.

As chamadas cefeidas (gigantes amarelas ou supergigantes pulsáteis, cujo protótipo é a estrela δ Cephei) são as variáveis mais "valiosas", pela sua regularidade, "padrões de medidas" das distâncias na Galáxia e no Universo em geral, graças à firme relação período-luminosidade (identificada por Henrietta Leavitt em 1912). Devem o seu nome à primeira que foi estudada nesta perspectiva (Delta Cephei). A partir do momento que se conhece o período de uma cefeida, facilmente mensurável, a relação período-luminosidade permite determinar a luminosidade intrínseca dessa estrela. Por uma simples comparação com sua luminosidade aparente, deduz-se a sua distância, e com isso a distância da galáxia onde ela se localiza. Em galáxias remotas não se conseguem diferenciar as estrelas individuais, mesmo as cefeidas mais brilhantes. Aí recorre-se, quando possível, a um determinado tipo de supernova (Ia) no qual se verifica a interacção de uma estrela anã branca com uma gigante vermelha. A primeira utiliza o seu enorme poder gravitacional para sugar massa da segunda. Quando o Limite de Chandrasekhar (1.4 vezes a massa do Sol, limite da estabilidade de uma anã branca) é alcançado, explode! Ou seja, todas as explosões acabam por ter a mesma luminosidade, o que nos permite medir distâncias até cerca de 1 bilião de anos-luz. De resto, para  a estimativa de distâncias verdadeiramente avassaladoras recorre-se à medição do redshift: a deslocação espectral para o vermelho.

Algol - curva de luminosidade
Ilustração do sistema e curva luminosa de Algol (BETA Persei), típica binária de eclipse com variação 2.1-3.4, período 2.867315 dias (Zim, H. S. & Baker, R. H., Op. cit., 1951)


A observação exige cartas detalhadas, exportadas informaticamente por um bom programa ou publicadas por uma organização especializada (ver exemplo para a estrela EG Cep; fonte AAVSO). O principiante deve começar com uma lista de alvos facilmente localizáveis, eventualmente estrelas de longo período próximas do seu máximo e obviamente dentro dos limites do seu equipamento. Após localizar uma estrela, procurar alinhar horizontamente a variável com a estrela de comparação, para tornar mais fácil a aferição subsequente (estimativa da magnitude). Convém observar atentamente mas com brevidade. Evitar observações longas, esforçadas ou próximas do limite do equipamento. Propiciam erros. O mesmo acontece quando se observa na periferia do campo visual (efeitos ópticos). As estrelas vermelhas têm a fama de gerar estimativas de magnitude exageradas quando observadas demoradamente. Identificar e registar escrupulosamente o contexto e a estimativas obtidas. As observações (de diversos observadores) serão posteriormente processadas estatisticamente pelas organizações que as coligem.


Observação do Céu Profundo

Os objectos seguintes estão no âmago da observação da observação astronómica contemporânea. Aqui, em termos de equipamento, não há substituto para a abertura: maior é melhor. Aconselha-se, ainda, "velocidade óptica" entre f/4 e f/7. Mas observar não é apenas olhar: perante um objecto, devemos questionar o que conseguimos, de facto, detectar. A partir daqui procurar responder a questões acerca da dimensão, forma e distribuição do brilho. Promovemos, deste modo, uma maior atenção ao detalhe, incrementando a nossa capacidade perceptiva. A observação dos objectos mais ténues reveste-se de uma beleza subtil e até de uma dimensão existencial, quando ponderamos as abismais distâncias em presença.

(NB: Alguns objectos do céu profundo (nebulosidades, associações ou enxames abertos amplos, como Mel 20 ou as Plêiades) ocupam uma área vasta. Nestes casos, utilizar baixa amplificação telescópica, equipamento RFT ("Rich Field Telescope", i.e, com campo amplo) ou binóculo, pode ser a estratégia mais adequada, proporcionando um campo de visão abrangente). 

As dimensões habitualmente publicadas devem ser interpretadas tendo em consideração que o tamanho aparente de um objecto depende sempre de muitos factores: abertura do telescópio, condições do local de observação (e.g., quão escuro é o céu), nível de adaptação ocular à obscuridade, etc.

M10  M35   m106
Expectativas realistas de observação (c/ informação do equipamento e magnificação). Da esquerda para a direita: típico enxame globular (M10; refractor 155mm, magnif. 137x), enxame aberto (M35; refractor 155mm, magnif. 50x) e galáxia espiral (M106; refractor 110mm, magnif. 77x), desenhos de Richard Orr


- Os Enxames Abertos (também conhecidos como "cúmulos abertos") são sempre muito interessantes e diversificados na morfologia e dimensão. Poucas fotografias conseguem traduzir a qualidade visual do brilho e "poeira" luminosa. Há os que se observam a olho nu (e.g., as Plêiades) e revelam uma "explosão" de estrelas bem definidas e diversificadas. mas há os que somente surgem como manchas nebulosas, pela acumulação de imensas estrelas de pequeno brilho aparente. São, pela sua natureza, grupos dinâmicos que evoluem com relativa celeridade (devido às contingências gravitacionais), muito mais jovens do que os globulares. Estes enxames são resultado do contínuo processo de formação de novas estrelas nas nuvens moleculares de matéria interestelar constituídas por gases e poeiras (as chamadas regiões "Hidrogen-II" ou H II, hidrogénio atómico interestelar ionizado) e nas nebulosas escuras que se encontram nos braços espirais da nossa Galáxia. Dá-se, posteriormente, a acrescência de matéria. Como referido, são relativamente "jovens", revelando facilmente presença de elementos pesados. São amplos e espalhados. A sua concentração central é, de facto, tudo o que conseguimos observar. Encontram-se, sem surpresa, predominantemente no plano galáctico. Alvos ideais para binóculos e pequenos telescópios.

- Os Enxames Globulares são radicalmente diferentes dos "abertos". Enquanto os últimos podem incluir centenas de estrelas, os globulares integram milhares e, em alguns casos, milhões. São muito mais antigos e habitam o halo galáctico. Alguns parecem ténues bolas de algodão. Outros, pela dimensão ou porque suportam ampliação, devolvem detalhe, e.g., magnificação aumentada permite observar o "granulado" que antecede a separação das estrelas mais periféricas. Eventualmente vê-se uma concentração de brilho na direcção do centro. Estas concentrações possuem estrelas antigas e avermelhadas da chamada Population II (ao contrário das jovens brancas e azuis, Population I, dos enxames abertos). Este objectos parecem semelhantes entre si, redondos e mais ou menos concentrados. Todavia, com maior abertura (> 25cm) e magnificação, percebem-se detalhes diferenciadores: eventual achatamento equatorial (análogo ao dos planetas gigantes), alinhamentos de estrelas, zonas escuras ou contornos irregulares. Os melhores globulares enquadram-se a meio da escala de Shapley (ver tabelas no final desta página), combinando a concentração com a resolução estelar que permitem. Convém compreender o enorme interesse cosmológico deste objectos antigos, "primitivos", "relíquias do passado", estudados em função da "metalicidade" em presença (os astrónomos designam todos os elementos mais pesados do que o Hidrogénio e o Hélio como "metais". Estes são produzidos nas estrelas por fusão nuclear, no caso dos mais pesados do que o ferro através de violentas explosões de estrelas enormes, enquanto supernovas). Ainda há muitos estudos em desenvolvimento relacionados com estes objectos impressionantes.


Distribuição dos enxames globulares no halo galáctico . A Galáxia é representada de perfil (Moore, P., Astronomy with Patrick Moore, Hodder Headline, 1995)


- As Nebulosas são muito ténues, como um "véu". As luminosas encontram-se próximo de estrelas brilhantes. A observação exige céus escuros e transparentes, pois o objectivo é detectar luz. Recomenda-se a utilização de movimentos suaves para as "destacar" as diáfanas nebulosidades, recurso à visão periférica e utilização de filtro adequado. A ampliação deve ser baixa pois estamos perante objectos geralmente extensos e com escasso brilho superficial. A qualidade do céu prevalece, exige-se ausência de poluição luminosa (o que é cada vez mais difícil). As chamadas "nebulosas escuras" também requerem, obviamente, céus cristalinos (aparecendo como manchas que obscurecem as estrelas numa região confinada e contribuem para irregularidades na aparência de algumas partes da Galáxia; nas condições adequadas, é possível observar à vista desarmada o material escuro que divide a Via Láctea nas regiões boreais de Cygnus e Aquila, o chamado "Cygnus Rift").

N.B.: A maior parte dos enxames abertos encontra-se aproximadamente no disco da Galáxia. O mesmo acontece com a maioria das nebulosas. Não acontece com os enxames globulares, que se encontram num amplo halo esférico.


Tipos de nebulosa (sequência das ilustrações): Emissão (gases na sua composição são excitados por uma estrela adequada (A), emitindo luz (B)), Escura (intercepta a luz das estrelas (A) mais distantes) e de Reflexão (com alto teor de gases e poeiras, reflecte luz de estrela(s) adequadas; e.g., estrela "A" na ilustração). Algumas nebulosas emitem e reflectem simultaneamente (Moore, P., e Black, M. (trad.), Estrelas e Planetas: Uma Introdução Fascinante à Astronomia, Círculo do Livro, 1987)


- Galáxias - "As maiores unidades da Criação", como escreveu Robert Burnham Jr. A matéria do Universo não está uniformemente distribuída, formando estes "nódulos". As galáxias surgem nos equipamentos amadores como ténues manchas de luz, revelando pouco das suas formas e ainda menos dos detalhes. No entanto, verifica-se aquilo a que Neale E. Howard chamou "...the enchantment of distance and time" (The Telescope Handbook and Star Atlas, Thomas Y. Crowell, 1975, p.118), o conhecimento de quão longe e quão antiga é a luz que chegou até à nossa retina. (As distâncias são medidas em parsec e megaparsec: 1 pc é a distância a que uma Unidade Astronómica, i.e., distância média Sol-Terra, equivale angularmente a 1 segundo de arco de paralaxe. Corresponde a 3.26 anos-luz) As considerações respeitantes à observação das nebulosas também se aplicam às galáxias, Apesar de existir concentração no núcleo, são menos brilhantes do que as nebulosas mais conspícuas. Surgem, geralmente, como manchas planas e muito ténues. As espirais são mais brilhantes do que as elípticas e as espirais mais "perfiladas" são mais brilhantes do que as que estão "de frente", pois concentram a sua luminosidade numa "faixa". Estes "monstros" revelam tamanhos aproximados, sendo a sua magnitude determinada, principalmente, pela distância. Os detalhes estruturais são sempre muito difíceis de observar. Afinal, trata-se de objectos longínquos e fora da Via Láctea!

A Via Láctea - Na prática, todas as nebulosas, enxames e estrelas que observamos a olho nu pertencem à Via Láctea. Esta foi "baptizada" obviamente enquanto observada "de dentro" pelos nossos antepassados, comparada a um rio, a uma "mancha leitosa", etc., dependendo da mitologia. Para os egípcios representava a deusa Nut. Era a Estrada de Santiago que na época medieval conduzia os peregrinos europeus em direcção ao sudoeste (Santiago de Compostela, "sudoeste" na perspectiva dos europeus que habitavam para além dos Pirinéus). Também se acreditou que assinalava o "caminho das almas" para o "Além". Segundo Jean-Pierre Verdet, "Un peu partout dans le monde, la Voie lactée est le chemin des âmes qui partent pour l’au-delà : à son extrémité se trouve le pays où séjournent les morts. Autant de traditions où la Voie lactée apparaît comme l’un des passages du terrestre au divin, assurant de nuit une fonction qui de jour incombe à l’arc-en-ciel." (Le Ciel: Ordre et Désordre, Gallimard, 1988, p.49)

- Nebulosas Planetárias - Apresentam uma "concha" gasosa, constituída por materiais ejectados pela estrela central. São "anéis de fumo estelar", como lhes chamou Peter Grego em Stargazing (HarperCollins Publishers, 2005). No seu crepúsculo, as estrelas de massa semelhante à do Sol esgotam as reservas de Hidrogénio do seu núcleo e as reacções começam doravante a converter Hélio em Carbono. Nesta fase, a estrela começa a insuflar até se tornar uma gigante vermelha, libertando material para o exterior e, no seguimento, expelindo as camadas exteriores. Estas vão formar a nebulosa. O envelope ou concha rodeia o núcleo quente que agora constitui uma estrela anã, no centro. O tempo de vida das nebulosas planetárias é relativamente curto, razão pela qual não são muito comuns. A observação destas nebulosas exige magnificação e cartas de busca muito pormenorizadas. No geral, são alvos muito pequenos. Uma técnica habitualmente utilizada procede à ligeira desfocagem para destacar das estrelas adjacentes a nebulosa procurada. Com ampliações baixas e medianas observam-se punctiformes (como estrelas). Os exemplares do catálogo Messier (M27, M57, M76 e M97) são um pouco mais "generosos" mas continuam a ser objectos pequenos que exigem ampliação superior a 100x. M27, a chamada Dumbbell (dimens. 8'x5') é a única razoavelmente observada com binóculos comuns. Na observação, a atmosfera deve apresentar-se estável, pouco turbulenta. Filtro O-III (que, adequadamente, apenas permite passagem da luz do oxigénio duplamente ionizado) é por vezes essencial para observação dos objectos mais difíceis. A primeira nebulosa deste tipo (a anular da Lira, número 57 do catálogo de Messier) foi descoberta por Antoine Darquier em 1779. Foram chamadas "planetárias" porque, segundo Herschel, o aspecto e tonalidade destes objectos se assemelhava ao de discos planetários, como o do planeta Úrano. A maior parte das nebulosas planetárias dura menos de 50000 anos antes que a "concha" se dissipe, um breve "instante" em termos cósmicos.

- Remanescentes de Supernova - As estrelas anãs brancas com uma massa acima do Limite de Chandrasekhar (que representa a máxima massa possível para uma estrela desse tipo, 1.4 vezes a massa do Sol) estão destinadas a terminar a sua vida numa explosão, enquanto supernovas. Emitirão brevemente uma enorme quantidade de luz, equivalendo à de milhões de estrelas. A libertação de matéria pode destruir a estrela, deixando um invólucro de gás, o remanescente. Na realidade, são muito escassas para o amador as possibilidades de observação destas nebulosidades. No nosso hemisfério somente estão dobserváveis as nebulosas M1 ("Nebulosa do Caranguejo", em Taurus, registada nos anais Chineses numa data equivalendo ao nosso ano de 1054, remanescente descoberto por John Bevis em 1731) e a chamada "Nebulosa do Véu" em Cygnus, esta última visualmente muito difícil. Filtros O-III ou UHC ("Ultra High Contrast") podem ajudar.

- As Supernovas são raras. A última observada na nossa galáxia foi em 1604, na direcção da contelação Ophiuchus. Foi estudada por Johannes Kepler (1571-1630) e ficou conhecida como "A Estrela de Kepler".

 

Astrofotografia
[Brevíssima notícia e generalidades. Não possuímos competências nesta área deveras interessante. Remetemos para o excelente Fotografar o Céu, de Pedro Ré, Plátano Edições Técnicas, 2002)]
 

Sabemos que acumulação de luz permite captar detalhes inimagináveis. Tradicionalmente, existem três métodos para fotografar com telescópio:

- Foco Primário, colocando o corpo da máquina sem objectiva no suporte da ocular e utilizar o telescópio como objectiva. A câmara deverá ser tipo Reflex e a focagem feita através de espelho retráctil. A dimensão do campo fotografado dependerá, basicamente, da distância focal do telescópio.

- Projecção da Ocular: coloca-se o corpo da máquina (sem objectiva) no extremo de um tubo (Extensor), o que permite fazer a projecção da imagem da ocular em uso num novo ponto de focagem (captando a imagem produzida e ampliada pelo telescópio). Reduz o campo e utiliza-se para fotografar objectos com pequena dimensão angular, e.g., planetas.

- Piggyback: utilização da lente objectiva da própria máquina, usando o telescópio (c/ montagem equatorial) somente como suporte e guia (seguindo o movimento do céu). Utiliza-se para campo amplo e objectos dispersos.

Podemos acrescentar a simples modalidade "afocal", quando a objectiva da máquina capta a imagem produzida pela ocular do equipamento de observação (telescópio ou binóculo).

A astrofotografia exige, quase exclusivamente (para exposições que ultrapassem poucos segundos), a utilização guiada de montagem equatorial (que "segue" os arcos diurnos dos astros). Em termos de equipamento, a qualidade das montagens e motorizações é absolutamente fundamental.


M63 fotografada em 1896 pelo pioneiro Isaac Roberts (500 mm, f/4,9, 175 min.)

 O advento do digital (CCD, câmaras DSLR, stacking software para reduzir ruído e aumentar detalhe, etc.) abriu imensas possibilidades, existindo em linha uma imensidão de recursos nesta área muito "técnica".

         astrofoto - diversidade de opções

Na astrofotografia pode utilizar-se um simples telemóvel+adaptador (com resultados muito limitados), uma máquina fotográfica, uma webcam ou um equipamento CCD concebido para astronomia. Acima, técnicas fotográficas mais utilizadas com máquina Reflex: 1) sem telescópio 2) em paralelo (piggyback) 3) com adaptador T2 4) setup anterior com ocular interposta. Seguidamente: 5) captação digital com dispositivo de carga acoplada (CCD) e 6) moderna cámara CCD (fontes - imagens 1 - 5: Jean Victor, V., Op. cit., 2009; imagem 6: qsimaging.com.

- Curiosidade: podemos ver mais com os nossos olhos! A fotografia (analógica ou digital) acumula luz mas não possui o mesmo escopo ou amplitude (range) do olho humano. Como exemplo, as fotos da Nebulosa do Orionte mostram uma mancha branca luminosa no centro enquanto os nossos olhos "sabem" que aí não há uma mancha mas sim o famoso sistema estelar múltiplo conhecido como "Trapezium" (vide Thompson, Robert B. & Barbara F., Astronomy Hacks, O'Reilly, 2005, pp. 68-9)

 
Disfunções ópticas

Introdução

A observação astronómica é o teste mais severo a que pode ser submetido um equipamento óptico e qualquer modesta imperfeição se torna evidente quando se tenta focar uma estrela num ponto nítido de luz. As imperfeições ópticas são chamadas "aberrações". A luz branca recolhida por um sistema óptico é separada pelos seus diversos comprimentos de onda constituintes quando chega ao ponto de focagem. Num sistema de lente única, a luz vermelha forma uma imagem enquanto a azul forma uma outra num ponto diferente. É a chamada "aberração cromática" que amiudadamente atormenta os refractores. Quando em presença, tudo parece rodeado por auréolas ou halos coloridos.

Chester Moor Hall (1729), inspirado pela ideia errada de que o olho humano, com o seu cristalino e humor vítreo, produz imagens sem aberração cromática, combinou dois diferentes tipos de lente de vidro, conseguindo o primeiro "doublet" acromático, (English, Neil, Chronicling the Golden Age of Astronomy: A History of Visual Observing from Harriot to Moore, Springer, 2018, p.83). Passadas algumas décadas, o especialista em óptica John Dollond optimizou e rentabilizou a descoberta, combinando lentes de tipos diferentes de vidro de modo a conseguir mitigar o efeito da aberração cromática, criando refractores "acromáticos".

Os equipamentos refractores de maior qualidade (e preço), consegue debelar grande parte dos efeitos indesejáveis. Os reflectores, por seu lado, estão isentos desta aberração pois os espelhos reflectem toda a luz, independentemente dos diversos comprimentos de onda, do mesmo modo. Todavia, são menos "luminosos".

Todos os sistemas ópticos estão sujeitos a qualquer tipo de aberração. A "esférica" é causada quando a luz proveniente da lente ou espelho não culmina no mesmo foco (no mesmo ponto exacto), criando imagens sobrepostas. Em caso de "coma", as imagens dos pontos estelares assemelham-se a pequenas gotas. No "astigmatismo", a imagem não é formada no ponto de focagem, mas antes ou adiante, criando imagens desfocadas e indistintas (alongadas segundo um dos eixos, i.e. elípticas). Algumas aberrações estão interligadas, surgindo em simultâneo e tornando-se difícil isolá-las.

Não existem equipamentos ópticos que produzam imagens completamente livres de aberrações. Vamos conhecer as principais e conceitos relacionados


Coma, astigmatismo e imagem punctiforme sem aberração (crédito: Hyperion Telescopes)

 
Aberração cromática
A refracção é fundamental para a formação de uma imagem. Todavia, uma lente actua como um prisma separando a luz incidente num pequeno espectro. As cores que formam a luz branca são decompostas pela lente, interceptando o eixo óptico em diversos pontos afastados entre si.


Os raios coloridos nos quais a luz branca é separada por uma lente única não corrigida são focados a diferentes distâncias. A lente acromática (sistema de lentes especialmente concebidas para superar o problema, à direita) consegue corrigir e focar o vermelho e o violeta (cores mais extremadas) à mesma distância, coincidentemente (
ilustr. Helmut Wimmer in Chartrand, M. R., Amateur Astronomy Pocket Skyguide, Op. cit., 1984)


O problema manifesta-se através de "faixas" coloridas ao longo dos limites que separam as zonas luminosas das zonas escuras da imagem. Até ao séc. XVIII procurou-se gerir o problema aumentando muito a distância focal dos refractores, para "disfarçar" esta disfunção através dos chamados telescópios aéreos (gravura, da Selenographia de J. Hevelius, Danzig 1647). Hoje pode ser corrigida através da utilização de um “doublet” acromático (lente positiva biconvexa combinada com uma lente negativa com maior dispersão colocada atrás da anterior). Permanece o residual “espectro secundário” que exige outra lente adicional.

Se apontarmos um telescópio para uma estrela (preferencialmente branca, pois uma que tenha tonalidade avermelhada compromete a experiência), o efeito da aberração cromática pode ser simulado. Se a ocular for inserida um pouco abaixo do ponto ideal de focagem, a imagem da estrela torna-se azulada, pois o olho fica doravante focado onde os raios azuis se focam, Se a ocular for puxada para fora relativamente ao ponto ideal de focagem, a imagem torna-se avermelhada, pois os raios de luz vermelhos têm uma focagem mais "comprida" do que os azuis. Na posição de melhor focagem, prevalece uma cor amarelada, rodeada por uma nebulosidade púrpura. Isto acontece porque a cor amarela se situa no meio do espectro visível. A "nebulosidade" circundante resulta de um pouco de vermelhos e azuis desfocados. (Muirden, J., The Amateur Astronomer's HandbookOp. cit., p.18).


Efeito de aberração cromática (crédito: Istituto e Museo di Storia della Scienza)

Aberração esférica
Esta aberração geométrica pode ocorrer tanto nos espelhos como nas lentes. Aqui, os raios de luz incidentes próximos da periferia das lentes são muito mais refratados do que os raios que incidem próximos centro (i.e., do eixo óptico). Significa que teremos diferentes planos focais para diferentes raios luminosos. No caso de lentes/espelhos esféricos, a aberração acontece porque o ângulo de incidência aumenta consideravelmente quando se afasta do eixo óptico. No telescópio, esta situação equivale a uma desfocagem da imagem. O ponto onde a melhor imagem é obtida é o chamado "ponto de menor confusão". O problema é habitualmente reduzido utilizando uma superfície asférica (parábola, hipérbole, etc.).


Aberração esférica. Verificam-se diferentes distâncias de focagem (centro vs. periferia), deformando a imagem na orla do campo (Nourse, A. E., Op. cit., 1973)


Astigmatismo
O astigmatismo e a curvatura de campo estão ligados. Na curvatura de campo, a imagem repousa numa superfície curva e não num plano. O astigmatismo resulta do facto de o raio incidente não encontrar a objectiva perpendicularmente, quando a curvatura do espelho ou lente não é uniforme. Os diâmetros são assimétricos e a imagem revela forma alterada quando se foca dentro e fora do ponto ideal. Resulta pois de uma desigual magnificação ao longo de diferentes diâmetros. Pode ser causado pela obliquidade da incidência relativamente ao eixo focal (astigmatismo “oblíquo”) e também por distorções no espelho primário do equipamento. Mas é habitualmente causado pela presença de duas curvaturas diferentes nos espelhos/lentes determinando diferentes distâncias focais. Pode ser detectado como uma distorção na qual a imagem de um
disco de Airy é excessivamente alongada num dos eixos, relativamente ao perpendicular (a focagem falha quando se trata de linhas em diferentes direcções). Os objectos na periferia apresentam distorção. É comum nos equipamentos binoculares. O sistema óptico ideal seria 'anastigmático', no sentido em que a imagem de um ponto seria um ponto. Todavia, o melhor que se consegue obter são imagens limitadas pela difracção que transformam pontos nos referidos discos de Airy.

Curvatura do campo
Como referido, a imagem é plasmada numa superfície curva e não num plano, determinando a impossibilidade da focagem simultânea no centro e na periferia (convém acautelar se o problema não reside na ocular, rodando-a para verificar se o problema acompanha, ou não, essa rotação).

Coma
Este é outro problema comum causado principalmente pela obliquidade (relativamente ao eixo óptico) da incidência dos raios luminosos. Geralmente resulta de uma combinação de aberração esférica e astigmatismo. Este último é em parte resultado da assimetria dos raios de luz. O resultado são distorções evidentes na periferia do campo visual, com aparência de "gota" ou de “cometa”, na direcção oposta ao ponto central do campo visual. As imagens de objectos que estão afastadas do centro do campo vão-se degradando. Piora quanto maior a distância ao eixo focal. O fenómeno é mais comum em equipamentos com maior rácio de focagem (menores distâncias focais, “ópticas rápidas”, f3-f6). Uma referência em termos de equipamento é o Paracorr, corrector de coma produzido pela Tele Vue
(preço supera os 600 Euros).

Distorção
Incapacidade de um sistema óptico de reproduzir um campo retilíneo; não altera as cores ou o foco, mas distorce a imagem.

Difracção
É um fenómeno que acontece quando uma onda encontra e contorna um obstáculo. A maioria das estrelas deveriam ser pontos, quando vistas pelos telescópios de que dispomos. No entanto, por melhor que sejam as condições atmosféricas (seeing) nunca as vemos mais pequenas do que um disco  que junta anéis (de difracção). Este efeito é devido à utilização de uma abertura finita e redonda e do tubo. O limite da resolução angular de um telescópio é também determinado pela difracção.

 

Magnitudes (referência)

Em 1856, Norman Robert Pogson optimizou o tradicional sistema clássico de magnitudes. Verificando que, na escala de grandezas, uma estrela de primeira magnitude era aproximadamente 100 vezes mais brilhante do que uma estrela de sexta magnitude, estabeleceu a escala logarítmica ainda hoje utilizada. Esta implica que uma estrela de magnitude m seja 2,512 vezes mais brilhante que uma estrela de magnitude m+1 (factor de raíz quinta de 100). Este "salto" de 2,512 foi, portanto, escolhido para que uma diferença de cinco magnitudes corresponda a uma diferença de rácio no brilho de exactamente 100 (e.g., uma estrela de 6ª magnitude é 100 vezes mais ténue do que uma de 1ª magnitude). A estrela Vega (Alpha Lyrae) foi utilizada como referência na moderna escala, tendo-lhe sido atribuída a magnitude 0.0. Existem no céu cerca de 9100 estrelas com magnitude inferior a 6,5. Estas são as estrelas visíveis a olho nu.

Assim, uma capacidade de captação de luz (equipada) que multiplique por 100x aquela que é possível a olho nu permite detectar 4 ou 5 magnitudes mais ténues (100x equivale a cinco magnitudes).

- Tabela com rácios de brilho em função das diferenças de magnitude listadas (Burnham's Celestial Handbook, vol.1; .PDF, 541KB).


Na escala de magnitudes, quanto maior o valor, menos luminoso (aparentemente) é o objecto (fonte: forum.outerspace.com.br)

As magnitudes são habitualmente arredondadas:
De -1.5 a -0.6: magnitude -1
De -0.5 a +0.4: magnitude 0
De 0.5 a +1.4: magnitude 1, etc.

Algumas referências e limites aproximados:

VÉNUS (máx.): -4
JÚPITER (máx.): -3
SIRIUS: -1.5
ARCTURUS: 0
'GUARDAS'- Merak (β Ursae Majoris) e Dubhe (α Ursae Majoris): 2
OLHO NU (limite): 6
BINÓCULO: 9
TELESCÓPIO (amador, mediano): variável, ~12
 

 
Tabelas úteis (parcialmente baseadas em materiais disponíveis no sítio Pátio da Astronomia - L. Carreira)

- CLASSIFICAÇÃO QUALIDADE VISÃO/ESTABILIDADE ATMOSFÉRICA (Escala Antoniadi)

I Visibilidade excelente, pode recorrer-se a amplificações elevadas sem muita degradação, imagem estável por grandes períodos de tempo
II Visibilidade boa, muitos momentos de grande estabilidade
III Visibilidade mediana, tem alguns momentos de estabilidade, amplificações geralmente têm de ser abaixo do limite prático, focagem difícil
IV Visibilidade má, imagem tem muitos momentos de "ebulição"
V Visibilidade muito má, a imagem está permanentemente em "ebulição", muito degradada, impossível focar (ou sequer desenhar esboço rudimentar)


- ESTRELAS - CLASSES ESPECTRAIS

As estrelas são classificadas segundo as temperaturas das suas superfícies irradiantes:

Tipo Cor Aparente Índice de Cor (B.V) Temperatura à Superfície - (K)elvin
O azulada < -0.2 25000° - 45000°
B azulada -0.2 - 0.0 11000° - 25000°
A branca 0.0 - 0.3 7500° - 11000°
F branca amarelada 0.3 - 0.6 6000° - 7500°
G amarela 0.6 - 1,1 5000° - 6000°
K laranja 1.1 - 1.5 3500° - 5000°
M vermelha > 1.5 3000° - 3500°
C (N e R) muito vermelha - 2500º


Acima: esquema de um espectrógrafo, instrumento que divide a luz de um objeto nos seus comprimentos de onda componentes para análise e registo fotográfico; (Alter, D., Cleminshaw, C., & Phillips, J., Pictorial Astronomy (4th Ed.), Thomas Y. Crowell, 1974)


- LUMINOSIDADES ESTELARES (MK)

Ia-0 Supergigantes muito brilhantes O a G5
Ia Supergigantes brilhantes O a M3
Iab Supergigantes pouco brilhantes B0 a M3
Ib Supergigantes muito pouco brilhantes O a M3
II Gigantes brilhantes BO a M4
III Gigantes normais BO a M5
IV Sub-gigantes BO a K0
IV Anãs e Sequência Principal (no Diagrama de Hertzprung-Russell, v. infra) O a M
VI Sub-anãs F a K5
VII Anãs brancas B5 a F


- DIAGRAMA DE HERTZSPRUNG-RUSSELL

O diagrama de Hertzsprung-Russell (abrev. H-R) mostra-nos as mais importantes classes ou categorias em que as estrelas foram agrupadas, estendendo-se das mais quentes e brilhantes (em cima à esquerda) até às mais ténues e com menor temperatura (em baixo à direita). Algumas estrelas são inseridas como exemplo. Na diagonal central encontra-se a chamada "Sequência Principal", onde se enquadram a maioria das estrelas conhecidas. O diagrama demonstra graficamente a relação entre o raio teorético de uma estrela, a sua luminosidade e a sua classe espectral (segundo a repectiva temperatura à superfície).

- Diagrama H-R  (Muirden, J., Astronomy Handbook, Arco Publishing, Inc./ Kingfisher Books, Limited, 1982)


- CLASSIFICAÇÃO DE NEBULOSAS PLANETÁRIAS

I Aparência estelar (punctiforme)
IIa Forma oval, com centro brilhante e concentrado
IIb Forma oval, com centro brilhante não concentrado
IIc Forma oval, com traços do anel
IIIa Forma oval, brilho irregular
IIIb Forma oval, brilho irregular com traços do anel
IV Forma anular, com centro menos brilhante
V Forma irregular


- ENXAMES ABERTOS - Classificação de Trumpler
(3 componentes)

Comp.1 Concentração dos membros do enxame
I Destacado (das estrelas de fundo), concentração central bastante acentuada
II Destacado, com fraca concentração central
III Destacado, sem concentração central
IV Pouco destacado
Comp.2 Intervalo de Magnitudes
1 Pequeno intervalo entre o membros mais brilhantes e menos brilhantes
2 Intervalo de magnitudes moderado
3 Intervalo alargado
Comp.3 Riqueza
p Pobre, menos de 50* (estrelas)
m Médio, de 50 a 100*
r Rico, mais de 100*

N.B.: utiliza-se um "n" no final para assinalar presença de nebulosidade. Exemplo - Messier 29: "III 3 p n" (destacado, com estrelas de diferentes magnitudes, número reduzido de estrelas e nebulosidade associada)


- ENXAMES GLOBULARES- Classificação de Shapley-Sawyer

1 a 12 (Concentração decrescente)


- ABREVIATURAS UTILIZADAS NAS DESCRIÇÕES DOS OBJECTOS NGC/IC

Vide listagem em formato PDF, 208KB)


- A HISTÓRICA CLASSIFICAÇÃO DE HERSCHEL

Em geral, as nebulae (que para os observadores do século XVII englobavam todas as ulteriores categorias, e.g., nebulosas, enxames) foram catalogadas por William Herschel, no seu trabalho pioneiro, segundo diferentes classes (com uma trad. nossa entre parêntesis):

I. Bright nebulae (nebulosas brilhantes)
II. Faint nebulae (nebulosas ténues)
III. Very faint nebulae (nebulosas muito ténues)
IV. Planetary nebulae (nebulosas planetárias)
V. Very large nebulae (nebulosas muito amplas)
VI. Very compressed clusters (enxames muito concentrados)
VII. Compressed clusters of bright and faint stars (enxames concentrados constituídos por estrelas brilhantes e estrelas ténues)
VIII. Coarse clusters (enxames esparsos ou dispersos)

(Um "H" antecedia o número. O sistema, muito cómodo, oferecia ao observador uma descrição preliminar do aspecto do objecto)


- ALFABETO GREGO

As minúsculas são utilizadas na Designação Estelar de Bayer (utilizada pela primeira vez no Uranometria Omnium Asterismorum, Augsburg, 1603); fonte: Johnson, G. & Adler, I., Discover the Stars (Revised and Enlarged Edition), Sentinel Books Publishers, Inc., 1957)

Alfabeto Grego


Nota final: a Astronomia Amadora

A astronomia amadora constitui um passatempo gratificante. Como recusar o convite dessa janela que permite lobrigar objectos tão distantes e imensos? É baluarte da pura curiosidade científica, exercício de rigor mas também de contemplação e fascínio, vínculo cultural ao passado histórico e mitológico e, incidentalmente, predispõe a uma atitude confiante no futuro. Todos sabemos que a investigação decisiva, especializada, não está doravante nas mãos de amadores. Mas mesmo nesta vertente "útil", parafraseando James Muirden, o objectivo da astronomia amadora não é descobrir coisas, trata-se em grande parte de documentar coisas. E há decerto muitas coisas para serem documentadas noite após noite.

Todavia, o interesse parece sofrer um detrimento. Às gerações deslumbradas pelos satélites artificiais e pela ida à Lua, pelo desafio da exploração do Espaço, pela possibilidade de vida extraterrestre e viagens a distantes planetas desconhecidos (e pelas influentes e inúmeras interpretações criativas destes assuntos no âmbito da cultura de massas, e.g., livros, música, filmes, séries, BD, jogos arcade), seguiu-se a rotina, as "imbatíveis" fotografias Hubble (promovendo expectativas inalcançáveis), os efeitos especiais e a ubíqua mediação digital. Resultou em desinteresse. Perdeu-se esse vasto "horizonte de expectativa" e o hobby, consequentemente, envelheceu. As temáticas do Espaço e do Universo deixaram de ser mainstream. Entretanto, os dislates da poluição luminosa "esvaziaram" o céu estrelado, tornando-o opaco, cinza-alaranjado (como nos ambientes pós-apocalípticos do cinema). A adrenalina do gaming e as redes sociais marginalizaram os passatempos tradicionais. Como James Chen referiu:  As amateur astronomy entered the new millennium, a downward trend became evident. The hobby was becoming progressively older. Those in the hobby tended to stay in the hobby. But younger people were not attracted to sitting in the night air peering through a telescope. The fascination of the Internet, computer gaming, and social media was far more powerful to the young than any telescope. (Astronomy for Older Eyes: A Guide for Aging Backyard Astronomers, Springer, 2007, pp.5-6). São poucos os que olham para cima, na mais ampla contemplação da natureza, procurando contextualizar o paradeiro da nossa pequena e insubstituível "casa comum". È pena pois esta "ascese do olhar" promove a consciência ecológica e uma sensação de pertença à escala do planeta, bem como uma sensação de "proximidade" com todos os que nele habitam.

Carpe Noctem


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