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A
questão da Vida Extraterrestre
(Alexander Pope, An Essay on Man, 1734)
"Conversas sobre a Pluralidade dos Mundos" (Entretiens sur la pluralité des mondes)
é um livro de divulgação científica do autor francês Bernard le Bouyer
de Fontenelle, publicado em 1686. ["Pluralidade dos mundos" era como a vida extraterrestre era antigamente designada]. Fontenelle apresenta uma exposição inicial do pluralismo
cósmico, o conceito de que os planetas são habitados e as estrelas são
"sóis" distantes que podem ter
seus próprios sistemas planetários, incluindo a possibilidade de vida
extraterrestre, particularmente vida inteligente. Esta possibilidade
foi comummente aceite nos séculos seguintes por filósofos, astrónomos e
literatos.
A ideia é surpreendentemente antiga e acompanha a demanda filosófica. Para Aristóteles (no tratado cosmológico Περὶ οὐρανοῦ, Lat. De Caelo), o mundo circular, circunscrito e central era necessariamente singular, único (Guthrie, W. K. C. (trans.), On the Heavens, Loeb Classical Library, 1953), lib. I, 8, 277a); todavia para Epicuro, sendo os "átomos" infinitos em número, não há obstáculos para a existência de muitos "mundos" (kosmoi) semelhantes e ou diferentes do nosso, incluindo mundos dentro de mundos e no espaço entre mundos ("Epistula ad Pythoclea", i.e. "Carta a Pítocles", preservada por Diog. Laertius, lib. X), in: Bailey, C., Epicurus: the Extant Remains, Oxford, Clarendon Press, 1926, pp. 56 et seq.). São dois filósofos do século IV a.C. Muitos
dos mais notáveis arautos da nova astronomia
nos últimos dois ou três
séculos não deixaram de acarinhar o tema. A questão central na época
Iluminista era: ter-se-á a divina Criação estendido ao todo do
Universo, sendo a Humanidade apenas parte de uma mais vasto plano? Ou
terá Deus criado o Cosmos somente para nos colocar aqui? Os
cientistas geralmente acreditavam na pluralidade, de modo generoso e
que hoje consideraríamos pueril. As opiniões de William
Herschel (que acreditou que, tal como a
Lua seria decerto habitável, também o Sol o deveria ser em regiões mais
temperadas abaixo da camada "ardente" que observamos), Gruithuisen (que
julgou observar uma cidade na Lua), Camille
Flammarion (defensor eloquente da habitabilidade dos planetas), William
Henry Pickering (persistindo, na década de 20 do século
passado, na existência de vegetação e até de enxames de insectos ou
"pequenos animais migratórios", explicando manchas variáveis observadas
principalmente na cratera Eratóstenes) ou Percival Lowell (com a sua
reconstrução das vicissitudes de uma civilização marciana em
dificuldades) são disso testemunho. Selenitas, Venusianos e, acima de
tudo, Marcianos, terão preponderância nas elucubrações científicas,
algumas todavia gradualmente descartadas com o transcorrer do século
XX. Surgiram paralelamente obras de ficção emblemáticas, algumas notáveis
clássicos do género como The War of the Worlds
("A Guerra dos Mundos") de H. G. Wells, em finais do séc. XIX, com a
igualmente célebre e impactante emissão rádio de Orson Welles em 1938. Mais tarde,
em meados do século XX, em plena "Guerra Fria" e com o advento da Era
Espacial e dos primeiros satélites artificiais, há uma enorme receptividade às ideias de alienígenas, naves
espaciais e, no fundo, à substituição de antigas crenças e mitos por
esta camada de temas com impacto cultural, com as suas expectativas,
ansiedades e medos.
Vida Extraterrestre? A
hipótese afirmativa baseia-se na vasta dimensão e nas leis físicas
consistentes do universo observável. De acordo com este argumento
(defendido por cientistas como Carl Sagan ou Stephen Hawking), seria
extremamente improvável que a vida não existisse em algum lugar fora do
nosso planeta. Este argumento é incorporado num princípio que afirma
que a Terra não ocupa uma posição única no universo, e no "princípio da
mediocridade", que sugere que não há nada de especial ou irrepetível
sobre a vida na Terra. A vida pode ter surgido de forma independente em
muitos lugares em todo o Universo. Alternativamente, a vida também se
pode desenvolver com menos frequência, mas disseminar-se entre planetas
habitáveis através da panspermia,
a hipótese de que formas de vida básicas e resilientes estão presentes
no Universo, viajam em meteoros ou planetóides, eventualmente chegando
ao nosso planeta em meteoritos que abrigavam essas formas primárias: a exogénese. As condições propícias para o aparecimento da vida exigem, como
sabemos, imensos requisitos, começando pelos estruturais: Quimicamente,
somente um dos tipos de átomo parece capaz de produzir os diversos
'grupos-de-átomos' complexos necessários à matéria viva: o átomo de
Carbono (C, membro do grupo 14 da Tabela Periódica). Todo o material
orgânico é, consequentemente, baseado nesse elemento: muitos outros
estão envolvidos, mas esse é a base! A vida depende do carbono.
Moléculas complexas estão estruturadas por átomos de carbono em ligação
com outros elementos químicos, especificamente o oxigénio, o hidrogénio
e o nitrogénio, sendo que o carbono é capaz de formar ligações com
estes elementos (visto possuir quatro electrões de valência),
geralmente chamadas moléculas orgânicas. Ou seja, apresenta uma grande
afinidade para se combinar quimicamente com outros átomos pequenos, que
podem formar largas cadeias. O carbono é abundante, leve e
relativamente pequeno em tamanho, fazendo com que seja fácil para as
enzimas manipularem as suas moléculas. É comummente assumido em
Astrobiologia que se existir vida noutro lugar, será também baseada em
carbono. Inteligência? Uma cogitação interessante envolve o chamado "Princípio Antrópico". Este, também conhecido como "efeito de seleção de observação", é a hipótese, proposta pela primeira vez em 1957 por Robert Dicke, de que a gama de possíveis observações que poderíamos fazer sobre o universo é limitada pelo fato de que as observações só poderiam acontecer em um universo capaz de desenvolver vida inteligente em primeiro lugar. Os proponentes do princípio antrópico argumentam que ele explica por que este universo tem a idade e as constantes físicas fundamentais necessárias para acomodar a vida consciente, pois se qualquer um deles fosse diferente, não estaríamos presentes para fazer observações. O raciocínio antrópico é frequentemente usado para lidar com a noção de que o universo parece estar bem ajustado para a existência da vida... (ler mais; Wikipédia) Outro tipo de argumento é o de que a natureza física do Universo é tal que deve ter dentro de si, em algum momento, seres vivos e até 'humanidade' em particular. Brandon Carter deu o nome de "princípio antrópico forte" ao princípio de que o Universo deve ser cognoscível e deve em algum momento, admitir a criação de observadores dentro dele. Os que favoreceram este princípio procuram descrever, em termos amplos, todos os "mundos" possíveis, alguns inevitavelmente adversos, outros capazes de suportar vida. A ideia é, pois, sinalizar as qualidades estruturais propícias à geração de potenciais "observadores". Habitamos, necessariamente, um dos "mundos" do estreito grupo assim descrito.
Eis a mencionada equação:
Entretanto, as sondas Pioneer 10 e 11 (lançadas em 1972 e 1973) e Voyager
1 e 2 (1977) transportaram mensagens para a eventualidade de uma
comunicação com uma civilização alienígena capaz de as descodificar.As sondas Pioneer
foram as primeiras a alcançarem a velocidade de escape do nosso Sistema
Solar. Transportaram uma uma placa com mensagens para uma eventual
comunicação (ver desenho; Ames Research Center, NASA-ARC).
Foi concebida por Carl Sagan e Frank Drake, desenhada por Linda S.
Sagan. O conteúdo foi criticado pela escolha de elementos e em diversos
detalhes da representação, e.g.,
as figuras humanas não conseguem transmitir uma ideia "pan-racial", a
figura masculina surge destacada, sendo a única que acena.
Os
discos incluem informações e fotografia do Sistema Solar,
ilustrações da estrutura do ADN, anatomia humana, processos de
concepção e desenvolvimento da vida, etc. Há informações sobre
tamanhos e idades médias dos humanos, imagens dos continentes
terrestres, da formação dos elementos mais comuns no nosso planeta e
fotografias de plantas e animais. Outras fotografias mostram
seres humanos praticando acções quotidianas, aspectos da cultura,
artefactos e construções. Ademais há a parte audio, com uma selecção
eclética de música e sons do nosso planeta. Também uma mensagem de saudação em 55
línguas diferentes. Numa face há instruções gráficas acerca do funcionamento do
disco bem como informações sobre a localização no Sistema Solar,
posição do Sol na galáxia, mapa de um pulsar e diagrama da molécula de
hidrogénio (informação já encontrada nas placas das Pioneer). Estes esforços podem parecer demasiado optimistas ou pueris mas traduziram uma intenção notoriamente "ecuménica" de comunicar o que de melhor fazemos a hipotéticos (nós diríamos improváveis) interlocutores. Entretanto,
há outras hipóteses. Como exemplo, Susan Schneider, uma cientista cognitiva, sugere que as mais evoluídas
civilizações no Universo serão super-computadores, formas de Inteligência Artificial criadas por formas de vida biológicas que entretanto pereceram ou se fundiram com a sua própria tecnologia (v. Alien Minds,
in Steven J. Dick (ed.), "The Impact of Discovering Life Beyond Earth",
Cambridge University Press, 2015, pp.189-206). Aqui se integram
conceitos das disciplinas filosóficas, antropológicas e
astrobiológicas. Para Schneider, as mais sofisticadas civilizações
serão pós-biológicas, formas
de inteligência que excedem os melhores patamares humanos em todos os
campos, das competências sociais à sapiência em geral, passando pela
criatividade científica, etc. (Op. cit., pp.189-90)
Algumas referências relacionadas:
O
historiador da ciência Allan Chapman, no último capítulo do seu Comets, Cosmology and the Big Bang - A
History of Astronomy from Edmond Halley to Edwin Hubble, Lion
Hudson (2018), manifesta uma opinião céptica
quanto à possibilidade 'física' de "viagens às estrelas":
"The distances, quite simply,
are too vast, and the laws of physics, space, and time are stacked
against such adventures. Nor can we conceive of the psychological
pressures that might act upon human beings trapped for years, decades,
or a lifetime in a spaceship from which there can be no escape or
relief. It would be nothing like what Renaissance sailors had to put up
with during the months of a long-haul sea voyage, for there would be no
sunshine, blue skies, sweet breezes, scenic variety, or normal food and
drink, and no joyous homecoming to look forward to for people heading
for a galactic exoplanet. A life sentence in Dartmoor Prison would be
like a holiday camp by comparison. In Dartmoor, at least you could
enjoy the passing seasons and the sunshine, have visitors, meet new
faces, and cherish the hope of escaping. How would people cope with the
eternal boredom of a long-haul space voyage? Would they go mad, kill,
and perhaps even eat each other? When we try to turn Hollywood science
fiction into science fact, we must add in all the down-to-earth human
components as well as the
visionary." E adiante questiona: Outra opinião a ter em conta é a do astrónomo que descobriu o primeiro exoplaneta (planeta fora do Sistema Solar):
"If we are talking about exoplanets, things should be clear: we will not migrate there", disse
Michel Mayor, co-descobridor do primeiro exoplaneta e
laureado em 2019 com o Nobel da Física, numa entrevista à France Press
em 2019 (à margem de uma conferência em Madrid). E acrescentou: "These
planets are much, much too far away. Even in the very optimistic case
of a livable planet that is not too far, say a few dozen light-years,
which is not a lot, it's in the neighbourhood, the time to go there is
considerable.". Mayor também afirmou sentir a necessidade de rebater o equívoco de algumas opiniões: “[to] kill all the statements that say, "OK, we will go to a livable planet if one day life is not possible on Earth."" (v. trad. PT-BR em uol.com.br; aced. 03FEV.24). Vidas extremas... No que diz respeito à amplitude dos ecossistemas possíveis, surgiu, baseada da constatação feita pelos biólogos (a partir das
décadas de 1980 e 1990) de que a
a vida microbiana tem grande flexibilidade para sobreviver em ambientes inóspitos (do ponto de vista humano), a descoberta dos Extremófilos.
Falamos de organismos capazes de prosperar em condições físico-geo-químicamente extremas para a maioria dos outros seres vivos do nosso planeta, sejam ambientes naturais (e.g., vulcões, oceanos, alta atmosfera, desertos) ou antrópicos, i.e. modificados pela actividade humana (minas, áreas contaminadas, radiação, etc.), expandindo os limites da vida como a conhecemos. A descoberta de bactérias, Archaeas (domínio que agrupa microrganismos unicelulares procariontes, i.e. sem núcleo celular) e inclusivamente animais que vivem ou toleram esses ambientes levanta discussões sobre início da vida na Terra e, num contexto mais abrangente, os limites em que a vida consegue prosperar e, consequentemente, a possibilidade de vida para além das modalidades que conhecemos.
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